Há 13 anos cerca de 10 famílias pataxós perambulam pela Costa Verde fluminense a procura de terra, moradia e um Poder Público que os reconheça como cidadãos.
Por Thereza Dantas para Combate Racismo Ambiental
Numa tarde de julho, em pleno veranico paratiense, integrantes da “aldeia” pataxó estão paramentados para conceder uma entrevista. Mulheres e homens, com rostos pintados de vermelho e preto, cantam e balançam seus maracás para avisar que o território localizado na zona rural da cidade de Paraty, agora é pataxó. Aos pés do Parque Nacional da Serra da Bocaina, o toré, uma importante prática ritualística, é cantado e dançado pedindo paz e luz para a conversa.
Os pataxós já são conhecidos pelas autoridades, há treze anos eles vivem na Costa Verde. Desde março de 2016, ocupam a zona rural de Paraty, conhecida como Iriri, mas é em Angra dos Reis que utilizam os serviços de educação e saúde. A Fundação Nacional do Índio (FUNAI), órgão governamental que trata do tema, reconhece que o grupo vive na região, mas segundo informações da Coordenação Geral de Identificação e Delimitação (CGID) da instituição, ainda não há “demanda referente à criação de Reserva Indígena para o povo Pataxó, em Paraty, registrada em seu sistema.”
Enquanto isso, os indígenas pataxós seguem sobrevivendo, ocupando e tentando esclarecer os motivos que os trouxeram ao sul fluminense. O jovem cacique Hãgui responde ás perguntas com certa tensão na voz. Para ele o grupo, formado por cerca de 100 pessoas, é vítima de preconceito, racismo e total abandono por parte da Funai. “Por conta da violência chegamos até aqui. Queremos terra para morar e cuidar de nossas famílias”, fala Hãgui. O Art. 231 da Constituição determina que: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. A assessoria de Imprensa da Funai que respondeu ás perguntas enviadas por e-mail, sublinha “direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, mas completam na mesma mensagem: “nos casos de impossibilidade de reconhecimento de terra de ocupação tradicional, a Funai promove o reconhecimento do direito territorial das comunidades indígenas na modalidade de Reserva Indígena, conforme o disposto no Art. 26 da Lei 6001/73.”
Por conta dessas “determinações”, várias etnias são acusadas de corpos estranhos. É o caso dos pataxós na Costa Verde, nascidos na Bahia, eles são acusados de ser “estrangeiros” em solo pindorama, nação conhecida hoje como Brasil. O jornalista e sociólogo José Ribamar Bessa Freire, defende o conceito de “índios caminhantes”. “Os indígenas brasileiros têm o direito á terra quando consideram o local sagrado para a celebração de suas vidas e tradições”, explica o professor da Pós-Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNI-Rio) e da Faculdade de Educação da UERJ. São conceitos que diferem da ideologia da propriedade que norteiam a sociedade colonizadora européia, mas que devem ser levadas em conta em função da reconhecida antiguidade dos povos indígenas.
Perguntado como são as relações com os outros parentes guaranis, o cacique Hãgui responde que são cordiais e pacíficas. “Freqüentamos juntos as reuniões nos órgãos públicos, como os encontros com a SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena) ou os Conselhos Municipais. Os guaranis nos respeitam e nós os respeitamos”, explica Hãgui.
Mas essa cordialidade não é compartilhada com todos os outros moradores na região. O pataxó Apohinã denuncia que a aldeia é vitima de ataques verbais vindos de pessoas dentro de carros que passam pela BR 101. “Queremos preservar essa terra, aqui tem cachoeiras e podemos cuidar da água”. O turismo utilizava as trilhas para chegar à cachoeira do Iriri, mas hoje o caminho está ocupado pelos pataxós. “Sabemos que o pessoal usava essa cachoeira para turistas, mas precisamos cuidar da natureza. Não queremos que esse território seja maltratado por turismo predatório ou fechado num condomínio”, explica Apohinã.
Sem perspectivas e vulneráveis, os pataxós seguem tentando ser reconhecidos pelas autoridades para conseguir viver em condições mínimas de segurança. Segurança que passa pelo reconhecimento de sua presença, o direito ao território e ao acesso á educação e saúde. “Somos os antigos moradores dessas terras. Queremos viver aqui, construir nossa Kyjemy (casa coletiva pataxó), poder plantar e vender o nosso artesanato. Mostrar nossa sabedoria nas escolas da região. Somos diferentes dos guaranis, mas somos todos parentes!”, explica Apohinã. Terminamos a conversa com os pataxós cantando e dançando, se despedindo do sol daquele dia, Dawê hayõ e pedindo pataxó muka, mukau.
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Fotos e audiovisual: Thereza Dantas.
Estou desenvolvendo uma pesquisa de pré-iniciação científica,inserida nesse contexto do Toré e dessa aldeia em específico,queria manter um contato com pessoas que tiveram relação com eles,por favor,me dê uma resposta no e-mail.
sou professora no município de Angra dos Reis fazendo uma formação em relações etnico raciais conhecendo a história do nosso povo, me surpreendendo e também me apaixonando. Quero ajudar nesta causa. Esse povo tem direito a demarcação.