Consea recomenda à Anvisa complementação dos dados omitidos no relatório de análise dos resíduos de agrotóxicos em alimentos

Tania Pacheco

O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) enviou à Anvisa Recomendação para que revise o relatório do Programa de Resíduos de Agrotóxicos, re-incluindo nele os dados referentes a exposição crônica. A chamada Agência Nacional de Vigilância Sanitária mudou as regras do jogo, este ano, limitando-a a analisar no Programa os dados referentes a exposição aguda a agrotóxicos.

Como afirma o Consea, ao modificar a metodologia de análise, a Anvisa, além de impedir a comparação com os resultados dos anos anteriores, ignora “os efeitos da exposição crônica que afeta toda a população, pois decorrem da exposição múltipla aos agrotóxicos, isto é, da presença de resíduos de agrotóxicos em alimentos e no ambiente, geralmente em doses baixas. Os efeitos adversos decorrentes da exposição crônica aos agrotóxicos podem aparecer muito tempo após a exposição, dificultando a correlação com o agente”.

O documento cita, entre os efeitos associados à exposição crônica, infertilidade, impotência, abortos, malformações neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.

Abaixo, a íntegra da Recomendação:

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RECOMENDAÇÃO DO CONSEA Nº 028 / 2016

RECOMENDA à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa que revise o relatório do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos – PARA de 2013 a 2015, para que seja incluída a análise dos dados referentes a exposição crônica (presença de agrotóxicos acima do limite permitido e/ou proibidos para a cultura), de modo a permitir a comparação com os relatórios dos anos anteriores, bem como sejam apontadas ações efetivas para a redução da exposição aos agrotóxicos, e assim seja retratada a real situação da exposição aos agrotóxicos para a população brasileira.

O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea, no uso de suas atribuições legais definidas no Artigo 11 da Lei 11.346, de 15 de setembro de 2006, e no Artigo 2º do Decreto 6.272, de 23 de novembro de 2007, apresenta os seguintes arrazoados:

CONSIDERANDO que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, atingindo 914 mil toneladas em 2014, e que além da contaminação dos alimentos, da terra, das águas – que em algumas situações torna-se imprópria para o consumo humano – temos a intoxicação de seres vivos, como os mamíferos (incluindo o homem), peixes, aves e insetos;

CONSIDERANDO que os relatórios anuais que apresentam os resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) tem constituído um dos principais indicadores da qualidade de alimentos adquiridos no mercado varejista e consumidos pela população, cumprindo o objetivo do programa de avaliar continuamente os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos de origem vegetal que chegam à mesa do consumidor. Os dados de resíduos encontrados permitem avaliar o risco a saúde devido a exposição aos agrotóxicos nos alimentos e subsidia a reavaliação de agrotóxicos para tomada de decisão sobre a restrição e o banimento de agrotóxicos perigosos para a saúde da população;

CONSIDERANDO que o relatório do PARA de 2013 a 2015 divulgado pela Anvisa no último dia 25 de novembro apresenta análise restrita aos riscos agudos da exposição a agrotóxicos, modificando a metodologia anteriormente utilizada (não permitindo a comparação com os resultados anteriores) e ignorando os efeitos da exposição crônica que afeta toda a população, pois decorrem da exposição múltipla aos agrotóxicos, isto é, da presença de resíduos de agrotóxicos em alimentos e no ambiente, geralmente em doses baixas. Os efeitos adversos decorrentes da exposição crônica aos agrotóxicos podem aparecer muito tempo após a exposição, dificultando a correlação com o agente. Dentre os efeitos associados à exposição crônica a ingredientes ativos de agrotóxicos podem ser citados infertilidade, impotência, abortos, malformações neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer;

CONSIDERANDO que não existem evidências que comprovem a eficácia na remoção ou eliminação de resíduos de agrotóxicos nos alimentos, dos procedimentos recomendados no relatório do PARA 2013 – 2015, como a higienização dos alimentos com água corrente, escovinha, ou bucha, sem mencionar que vários agrotóxicos possuem ação sistêmica, ou seja, penetram no interior dos alimentos, e sem recomendar o consumo de alimentos orgânicos como foi realizado nos relatórios anteriores;

CONSIDERANDO que essas lacunas no relatório do PARA podem levar a conclusões inverídicas sobre a atual situação do risco aos agrotóxicos no Brasil ao afirmar que a situação está em um nível de “segurança alimentar aceitável”, tendo em vista que não existe nenhuma evidência de redução do uso de agrotóxicos no país, e que não houve a implementação de nenhuma das práticas recomendadas para a redução da exposição a esse risco incluídas no PRONARA;

RECOMENDA à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa que revise o relatório do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos – PARA de 2013 a 2015, para que seja incluída a análise dos dados referentes a exposição crônica (presença de agrotóxicos acima do limite permitido e/ou proibidos para a cultura), de modo a permitir a comparação com os relatórios dos anos anteriores, bem como sejam apontadas ações efetivas para a redução da exposição aos agrotóxicos, e assim seja retratada a real situação da exposição aos agrotóxicos para a população brasileira.

Brasília, 30 de novembro de 2016.

Maria Emília Lisboa Pacheco
Presidenta do CONSEA

Nota de Combate: Maria Emilia Lisboa Pacheco deixou a presidência do Consea nesse mesmo 3o de novembro de 2016.

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