A Saúde Indígena no fio da navalha

Breve comentário sobre a Nota Pública sobre contratação da força de trabalho na Saúde Indígena divulgada pelo Grupo de Trabalho em Saúde Indígena da 6ª Câmara do Ministério Público Federal (MPF). [leia AQUI]

Por Paulo Daniel Moraes

O Grupo de Trabalho sobre Saúde Indígena da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF) divulgou recentemente uma nota em que afirma que “a contratação de força de trabalho para prestação de serviço público, incluindo a saúde indígena, obrigatoriamente deve se dar por concurso público (art. 37, II da Constituição da República de 1988), embora seja absolutamente necessário adaptá-lo a essa realidade”.

Um Termo de Conciliação Judicial assinado pela União em 2008, e sucedido por dois termos aditivos, obrigava a realização de concursos para suprir a força de trabalho para atuar na saúde indígena, em substituição às contratações por meio de convênios com organizações terceirizadas. Segundo o MPF, “o absoluto descumprimento do acordo pela União impediu qualquer avanço até o momento”, o que envolve os últimos três governos federais.

O maior problema neste modelo não é o concurso público em si, mas a contratação pelo Regime Jurídico Único do servidor público federal, que impossibilita a substituição dos profissionais da área nas frequentes e previsíveis desistências e vacâncias. Muitos Conselhos Distritais de Saúde Indígena (CONDISI) têm questionado a forma de seleção dos profissionais, que precisa ser específica, diferenciada, e assegurar a continuidade das experiências acumuladas nas três décadas de construção do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena no país, mas principalmente o tipo de vínculo trabalhista adequado às suas necessidades.

A melhor forma de contratação da força de trabalho para as especificidades da saúde indígena é por meio do regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que permite a flexibilidade necessária à continuidade do serviço e a especificidade da assistência prestada. O vínculo de trabalho dos profissionais que atuam na saúde indígena tem características muito excepcionais, entre elas o seu caráter temporário, já que muitos não se adaptam às dificuldades da saúde indígena, ou escolhem seguir novos caminhos após um período de aprendizado profícuo e de contribuição às comunidades onde serviram.

A lei que permite a contratação de Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias por meio do regime da CLT e de processo seletivo público foi aprovada em 2006 após a inclusão de uma Emenda Constitucional que permitiu esta excepcionalidade no artigo 198 da Constituição Federal. Esta lei pode por analogia abrigar as categorias dos Agentes Indígenas de Saúde e de Saneamento, embora o movimento indígena reivindique há muito tempo uma regulamentação própria para estas categorias.

No concurso feito para o Distrito Sanitário Yanomami (DSY) em 1998, assim como em um concurso anterior realizado neste mesmo distrito para atender os estados do Amazonas e Roraima, em poucos anos não havia mais nenhum profissional concursado trabalhando em área. Todos conseguiram ser transferidos, através dos mais diversos artifícios, ou saíram para fazer assumir outras atividades de seu interesse. Esta situação gerou uma grave descontinuidade na assistência, e uma crise que colocou em risco a saúde indígena no DSY e em outras regiões onde estavam lotados estes profissionais.

As duas alternativas viáveis hoje para a contratação dos recursos humanos da Saúde Indígena, que respeitam os princípios da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), parecem ser estas: ou se muda a lei para permitir a contratação dos profissionais de saúde por meio da CLT, e isto precisa ser feito por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), ou se faz a contratação por meio de organizações parceiras, dentro do novo marco regulatório definido na Lei 13.204 aprovada em dezembro de 2015 pelo Congresso Nacional.

Boa Vista-RR, 08 de abril de 2017.

Leia mais:

MPF defende concurso público na contratação de força de trabalho para saúde indígena

Imagem capturada do vídeo “Belo Monte: Um drama para saúde indígena”

Comments (1)

  1. Aguardo ansiosamente um concurso público para a área indígena, amo servir a população indígena através do meu trabalho como enfermeira, não conheço limites para levar à assistência, vou aonde for necessário, mesmo fazendo além da minha obrigação ainda não consigo fazer tudo, mas o que é gratificante é que as lideranças reconhecem o meu esforço e sou bem avaliada nas ações que executo a este povo tão extraordinário em sua forma de viver. Gostaria de trabalhar o resto da minha vida em comunidades indígenas especialmente nas aldeias.Isso só será possível se eu passar emm um concurso público pra área indígena

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