Imóveis de luxo e a guerra por um lugar na cidade

No blog da Raquel Rolnik

Com base em informações divulgadas pelo Secovi, jornais de grande circulação publicaram um balanço sobre a venda de imóveis em São Paulo nos últimos meses. Enquanto o número de imóveis vendidos na cidade em fevereiro deste ano caiu 4,5 % em relação a fevereiro do ano passado, a receita obtida com essas vendas aumentou 13%.

A explicação para essa equação aparentemente contraditória é simples: os imóveis que estão sendo vendidos hoje na cidade são mais caros. O crescimento no volume de vendas e valor de imóveis deste tipo (também conhecidos como superprime) tem pouco a ver, evidentemente, com necessidades habitacionais ou de expansão de negócios. Em plena crise econômica, a demanda por espaços comerciais não deve crescer, assim como é muito improvável uma explosão demográfica repentina em famílias de alta renda.

O que se passa neste mercado, assim como em outras cidades do mundo, é que estes imóveis caros e luxuosos não estão sendo comprados por quem necessita utilizá-los, mas, sim, como forma de investimento ou “entesouramento” por parte de capitais financeiros, muitas vezes globalizados.

Em Londres, por exemplo, uma matéria recente do jornal The Guardian aponta que este mercado mantém um estoque de milhares de casas e apartamentos vazios, mesmo com a cidade vivendo uma crise habitacional como não se via desde a última grande Guerra Mundial.

Muitos dos imóveis que permanecem vazios são de propriedade de milionários, que os utilizam como “safe deposit Box” de suas fortunas, nas palavras de Manuel B. Aalbers, professor de Geografia da Universidade de Leuven. Fortunas, aliás, nem sempre de origem lícita.

Estudos realizados pela Transparência Internacional apontam que muitos dos imóveis implicados nessa lógica em São Paulo são adquiridos por offshores, empresas sediadas em paraísos fiscais onde não se pagam impostos e as informações sobre seus beneficiários são mantidas em segredo.

Para além das questões ligadas à origem deste dinheiro – ou do fato de que se trata de fortunas que não contribuem, sob a forma deimpostos, para nenhuma economia, de nenhum país –, quero aqui ressaltar os impactos urbanísticos de sua presença no território.

Em primeiro lugar, a existência de um mercado deste tipo na cidade faz com que os moradores (que precisam de casas e de espaços comerciais, de serviços etc.) tenham que concorrer pela localização com o oligarca russo ou com o sheik do petróleo, que procuram imóveis não para morar, mas para deixar parte de suas fortunas seguras.

A segunda implicação é o fato de que boa parte destes imóveis permanece vazia por meses ou anos e isso tem também um enorme efeito: estamos ocupando lugares preciosos em nossas cidades para produzir espaços sem uso nem função…

Foto:@blacknwhite_011/Instagram.

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