Capas de duelo e liminar de juíza “Fora PT” mostram que processo de Lula é teatro

No Justificando

Às vésperas do encontro entre o ex-presidente Lula (PT) e o juiz Sérgio Moro, episódios emblemáticos têm ocorrido para revelar o que a Lava Jato não é: um processo penal sob o Estado Democrático de Direito. Se de um lado, a grande mídia traz capas de “confronto” entre parte e juiz, sem que acusação seja mencionada, de outro uma magistrada identificada como “fã” de Moro e com pessoal ojeriza ao político defere uma liminar impedindo qualquer manifestação de apoio na frente do prédio da Justiça Federal.

A audiência, que começa hoje (8) e se estende até quarta-feira (10), teoricamente visa oportunizar a Lula a chance de se defender das acusações de que teria recebido propina (R$ 12.422.000) da Odebrecht via aquisição do imóvel onde funciona o Instituto Lula, e mais de R$ 3 milhões com contratos da OAS com a Petrobras. Ocorre que a tônica da realidade dita uma tendência diferente dos manuais de processo penal e do que se espera de um julgamento justo e em conformidade com a Constituição da República.

Isso fica evidente nas capas das revistas semanais amplamente veiculadas no país, Veja e Isto É, que trouxeram idêntica abordagem para se referir à audiência que ocorrerá nessa semana: Lula e Moro num ringue, ou em um duelo, como se a função de juiz fosse combater e “vencer” o acusado. Como comentou o Professor e Doutor em Direito Yuri Carajelescov. “o juiz oponente do Réu dá a dimensão do nosso atraso civilizatório”.

“Faz tempo que eu falo isso que a revista traduziu em imagem, sem entender o que está errado. Se o juiz assume o ‘combate ao crime’, quem vai julgar? O juiz seria o árbitro dessa luta aí, né?”, questionou nas redes sociais o juiz de direito e colunista do Justificando, Marcelo Semer, sobre as capas que naturalizam um juiz que não é juiz, mas sim acusador. Fora as revistas, a grande mídia televisiva tem adotado semelhante abordagem para se referir à audiência.

Se a mídia cumpre seu papel de naturalizar a postura acusatória do juiz, a própria Justiça cumpre o papel de silenciar qualquer movimentação em protesto a esse processo. Após o MST prometer levar 20 mil pessoas para Curitiba, a Juíza Diele Denardin Zydek, da 5ª Vara da Fazenda Pública do Paraná, proibiu entre as 23 horas desta segunda-feira (8) e as 23 horas de quarta-feira (10) “a montagem de estruturas e acampamentos nas ruas e praças da cidade, sob pena de multa diária de 50 mil reais”, entre outras medidas. Segundo ela, a prefeitura e o MST devem negociar formas para garantir o protesto e o direito de ir e vir dos moradores do bairro onde fica a Justiça Federal. As informações são da Carta Capital.

A estranha liminar de impedir completamente o direito à manifestação ficou mais compreensiva quando se acessa a página pessoal nas redes sociais da magistrada, que tem um perfil aberto no Facebook, no qual compartilha conteúdos pessoais e políticos. Dentre eles: elogios ao ídolo Moro, aplausos às suas medidas – incluindo a condução coercitiva amplamente criticada do último ano e críticas de cunho pessoal ao ex-presidente.

Em 4 de março do ano passado, a magistrada celebrou a condução coercitiva de Lula, ordenada pelo juiz Sergio Moro, que interrogará Lula. “E hoje a casa caiu para o Lula…”, escreveu ela, ao lado de ícones de aplausos. Minutos depois, a magistrada compartilhou nota de um site que elogiava Moro pela decisão e chamou o colega de “inspiração” e “ídolo”.

As revistas e a magistrada abriram caminho para mais um capítulo de violação de direitos no “esquenta” para a audiência. Na manhã da segunda, o próprio Sérgio Moro negou o pedido da defesa para gravar a audiência. O Presidente da Câmara de Direitos e Prerrogativas da OAB/PR, Dr. Alexandre Hellender de Quadros, explicou que o pedido tem plena razão jurídica por se tratar de prerrogativa do advogado:

“As audiências judiciais, atualmente, são todas gravadas em audiovisual, e não há necessidade de pedir autorização  para quem está depondo, para fazer essa gravação. O advogado, no exercício de sua prerrogativa profissional, tem deveres,prerrogativas. Dentre elas, naturalmente, se insere a de poder documentar também por meios próprios os atos processuais dos quais participa e para isso não precisa pedir autorização previa”.

Entretanto, apesar de ser um direito, Moro negou o pedido e ainda afirmou que os advogados do ex-presidente “pretendem transformar um ato normal do processo, o interrogatório, oportunidade que o acusado tem para se defender, em um evento político-partidário“. A câmera, então será mantida apenas em Lula e Moro não será filmado. A defesa já afirmou que irá recorrer da decisão, bem como da decisão da magistrada estadual. Pelo andar da carruagem, já é possível imaginar o desfecho desses recursos no cenário de “normalidade” atual das instituições.

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Destaque: Reprodução da capa das revistas Veja e Isto É.

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