O estrondoso fracasso da Operação Hashtag (Um fiasco olímpico)

Investigação sobre supostos terroristas que “ameaçavam as Olimpíadas” arrasta-se em meio a ilegalidades policiais, uma morte estúpida e atos de jornalismo irresponsável

Por Rogério Pacheco Jordão, na Agência Pública

“Dez suspeitos de terrorismo na cadeia.” A frase de abertura do Jornal Nacional, da TV Globo, o de maior audiência no país, no dia 21 de julho de 2016, duas semanas antes da abertura da Olimpíada do Rio, apresentou aos telespectadores a fase ostensiva da Operação Hashtag, da Polícia Federal (PF). Naquela quinta-feira, dez suspeitos de “planejar ataques durante a Olimpíada” haviam sido presos em dez estados brasileiros, segundo o telejornal. A notícia ocupou 14 minutos do noticiário, com imagens de suspeitos algemados sendo transferidos para o presídio de segurança máxima de Campo Grande (MS), entremeadas por diversas intervenções do então ministro da Justiça Alexandre de Moraes, cuja fala dominou a edição do dia.

Moraes convocara, horas antes, uma entrevista coletiva em Brasília para detalhar uma operação que, naquele momento, seguia sob segredo de Justiça. O caráter de urgência que impregnava a fala do ministro, e o próprio tom do noticiário naquela noite, parecia, porém, não condizer totalmente com os fatos narrados.

“Aparentemente era uma célula amadora, sem nenhum preparo”, tergiversou o ministro na coletiva. A operação precipitara-se, disse ele, pois os suspeitos teriam começado os preparativos para uma ação. Uma das evidências, afirmou, seria a tentativa de comprar uma arma AK-47, via internet, por um deles, Alisson Luan de Oliveira, de 19 anos, morador de Saquarema (RJ). A evidência, viu-se depois, referia-se a um e-mail de fato enviado por Alisson a uma loja do Paraguai, mas em 2015, e não na véspera da Olimpíada, como deixou entender Moraes (a referência ao e-mail está na página 75 da denúncia do MPF). A compra não se concretizou. O ministro se precipitaria mais uma vez na entrevista coletiva ao atribuir, de forma equivocada, a liderança da suposta célula a um suspeito detido no Paraná, Levi Ribeiro Fernandes de Jesus, de 21 anos – fato não comprovado nas investigações da PF.

Ainda na noite daquela quinta-feira, ao lado de uma agente fardada da Polícia Rodoviária Federal, e tendo como pano de fundo carros da polícia com sinais de alerta ligados, Moraes voltou a falar com jornalistas, em uma espécie de segunda coletiva improvisada. Dessa vez para dizer que as prisões significavam o afastamento da “possibilidade, ainda que remota, de terrorismo na Olimpíada”. A frase encerrou o bloco de 14 minutos do noticiário do JN sobre o assunto. A cobertura internacional seguiu o mesmo tom; o New York Times estampou: “Com proximidade da Olimpíada, Brasil prende 10 em plano terrorista”; a BBC: “Olimpíada do Brasil: dez presos por planejar terror”; e a CNN: “Polícia brasileira prende 12 suspeitos de planejar atos terroristas durante Olimpíada”.

No dia seguinte, os principais jornais do país estamparam as prisões em suas manchetes, já trazendo novos detalhes, nomes completos e fotografias dos suspeitos, muitos dos quais, como se verá, não seriam denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF). Eram os primeiros lances do que ficou na memória da opinião pública como o “caso dos terroristas da Olimpíada”. Após dez meses de investigações e oito pessoas denunciadas, o processo entrou, em março de 2017, em sua fase final, sendo aguardada para breve a sentença do juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba. Será a primeira baseada na Lei Antiterrorismo (13.260) sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff em março de 2016.

O longo dia 21 de julho

Eram por volta de 5 da manhã de 21 de julho quando os moradores do andar superior do sobrado na rua Araucária, 572, no município de Colombo, na Grande Curitiba (PR), ouviram o barulho do lado de fora. Policiais federais deflagravam ali, e em outros nove estados, a Operação Hashtag. Buscavam Levi Ribeiro Fernandes de Jesus, um dos 12 suspeitos contra os quais havia mandados de prisão temporária. Sob supervisão da Divisão Antiterrorismo da Polícia Federal, a DAT, os policiais, porém, haviam chegado tarde: o suspeito – que horas mais tarde seria referido pelo ministro Moraes como o “líder” do grupo – já não habitava o imóvel havia 20 dias.

Levi, de 21 anos, funcionário de um supermercado local, foi encontrado naquela mesma manhã em outro sobrado, alugado, e onde morava com a esposa e uma enteada. Com os outros suspeitos, Levi foi transferido ainda na quinta-feira, 21, para o presídio de segurança máxima de Campo Grande (MS).

A Hashtag teve ainda mais três fases ostensivas, em agosto – já com a Olimpíada em andamento e longe dos holofotes da imprensa –, setembro e outubro de 2016. No total, 15 pessoas tiveram a prisão temporária decretada pelo juiz Josegrei (por coincidência, o mesmo que autorizou a recente Operação Carne Fraca, contra um grupo de frigoríficos).

Dessa quinzena de suspeitos, oito foram denunciados pelo MPF do Paraná e viraram réus – Alisson Luan de Oliveira, Leonid El Kadre de Melo, Oziris Moris Lundi dos Santos Azevedo, Israel Pedro Mesquita, Levi Ribeiro Fernandes de Jesus, Hortêncio Yoshitake, Luís Gustavo de Oliveira e Fernando Pinheiro Cabral. Destes, quatro permanecem presos, agora “preventivamente”, desde setembro de 2016: Alisson Luan de Oliveira, Leonid El Kadre de Melo, Luís Gustavo de Oliveira e Fernando Pinheiro Cabral.

Levi, acusado de ser líder terrorista pela boca do próprio ministro da Justiça, teve sua prisão preventiva suspensa em dezembro de 2016. Em sua decisão, o juiz considerou que os interrogatórios indicaram, em princípio, uma participação menor deste (bem como de Oziris, Hortêncio e, posteriormente, Israel) nos eventos. O juiz determinou a utilização de tornozeleiras eletrônicas e que esses quatro réus se mantivessem afastados de redes sociais associadas a grupos terroristas. Esperam o julgamento em liberdade. Os demais quatro réus continuaram presos preventivamente, por representarem, na visão do juiz, risco à “ordem pública” e à “aplicação da lei penal”.

Deflagrada 15 dias antes do início dos Jogos, e uma semana depois dos atentados de Nice, na França – quando um motorista jogou um caminhão contra uma multidão, matando 86 e ferindo centenas de pessoas –, com ampla cobertura noticiosa, a Operação Hashtag encontrou uma opinião pública já sensibilizada para o tema do terrorismo.

No momento em que a PF deflagrou a fase ostensiva, os nomes e as fotos de ao menos três suspeitos já haviam sido publicados pela imprensa. A revista Veja publicou fotos e nomes de Alisson Luan de Oliveira e Antônio Andrade dos Santos Júnior, numa edição que chegou às bancas seis dias antes de a operação ser deflagrada. Um site português chamado Nossa Portugal, em outubro de 2015, já havia citado em matéria e divulgado a imagem do gaúcho Israel Pedra Mesquita, que veio a ser preso nove meses depois. Nenhum atentado terrorista aconteceu antes ou depois das prisões.

Havia um atentado planejado contra a Olimpíada?

“O que existe é uma troca de mensagens”, disse à Pública o procurador Rafael Brum Miron, do MPF de Curitiba, que apresentou a denúncia contra os suspeitos de terrorismo em setembro de 2016. “Dá para perceber uma intenção muito forte de fazer isso. Mas o que não se tem é ‘ah, comprou arma, comprou explosivo’. Um ato concreto disso não existe”, afirmou. E de fato, ao sumarizar sua denúncia de 328 páginas, o promotor circunscreveu a disposição dos suspeitos em praticar um atentando terrorista no Rio ao campo da “intenção”.

A denúncia traz uma centena de imagens e um total de 62 trechos de diálogos e frases extraídas de grupos do Facebook e do Telegram. Nesses trechos, apenas sete contêm alguma menção à Olimpíada. Duas advindas de um perfil não identificado pela polícia. Das cinco restantes, quatro são atribuídas a Alisson Luan de Oliveira, de Saquarema (RJ); a mais contundente indica uma intenção de envenenar as águas do Rio de Janeiro, como veremos adiante.

Alisson revela também “torcer” a favor de um atentado, quando responde a um perfil no Facebook a respeito dessa possibilidade. Referindo-se aos preparativos de segurança para os Jogos, o perfil Abdul-Bari Joinville (não identificado pela denúncia) diz: “vi uma reportagem ontem do exército se preparando para um ataque terrorista”. Ao que Alisson reponde: “espero que haja”. No mesmo contexto, Alisson comenta que, apesar de o Brasil estar fora da coalizão de países que combatiam o Estado Islâmico na Síria, isso não impediria que fosse alvo de “ataques nas olimpíadas, até pq haverá pessoas de inúmeras nacionalidades”.

Em realidade, as conversas giram, na maior parte do tempo, em torno de discussões sobre o Estado Islâmico, comemorações de atentados na Europa e métodos eficazes de comunicação. Os acusados trocam também informações sobre como fazer uma bomba, mas sem coordenar um uso concreto, e conversam repetidamente sobre a intenção de se reunirem pessoalmente para organizar uma migração para terras dominadas pelo EI, notadamente na Síria, conforme aponta o procurador em sua denúncia.

No grupo “Defensores da Sharia” do Telegram, obtido pela PF a partir da apreensão de um telefone celular na fase 1 da Hashtag, do menor M. B. F, não indiciado pela polícia, o tema da migração toma meses de discussão.

“Vamos treinar de todas as formas. E arrecadar dinheiro para a jihad. E vamos migrando… Dessa forma sempre estaremos enviando mujahidim [guerreiros] para a khillafafh [o califado, ou territórios dominados pelo EI no Iraque e Síria]”, escreveu no dia 17 de julho de 2016 o perfil atribuído a Leonid El Kadre de Melo, tido como o líder do grupo.

Antes de irem para a Síria, os participantes concluem que é necessário, em primeiro lugar, se conhecer pessoalmente. Escreveu o perfil atribuído a Leonid: “primeiramente, se reunir, arrecadar dinheiro, treinar, estudar, mas nada disso vai se concretizar pela internet…”. Em fevereiro de 2016, o perfil de Israel Mesquita afirma: “Estou disposto a sacrificar todos os bens pela causa, embora não sejam muitos”.

Como estavam espalhados por dez estados brasileiros e carecendo de recursos financeiros, esse primeiro encontro, que lhes permitiria “sair do virtual para o real”, no dizer de um deles, jamais aconteceu.

Em uma das trocas, a Olimpíada foi até mesmo considerada um entrave ao plano de migração, conforme trecho atribuído a Hortêncio Yoshitake, de 30 anos, morador de São Paulo. Sobre a intenção de se encontrarem pessoalmente, escreveu no Telegram: “Espera acabar as olimpíadas, pq a inteligência vai esta a todo vapor e temos q ser mais discreto”. Denunciado pelo MPF, Hortêncio virou réu no processo e aguarda a sentença em liberdade.

Uma denúncia anônima traz o “filé” do atentado olímpico

A história oficial do caso dos “terroristas da Olimpíada” começou no dia 6 de maio de 2016, quando a Divisão Antiterrorismo (DAT) da PF recebeu um memorando enviado pelo adido legal no Brasil do Federal Bureau of Investigation (FBI): “O FBI gostaria de fornecer ao seu Serviço as informações relativas a pessoas baseadas no Brasil e que utilizam suas contas em mídias sociais para expressarem apoio ao Estado Islâmico do Iraque e o Levante. O FBI estima que estas pessoas possam representar uma ameaça à segurança nacional e aos Jogos Olímpicos 2016 no Rio de Janeiro”.

O FBI basicamente informava a PF sobre os perfis virtuais de nove pessoas que faziam, segundo a agência americana, propaganda do EI em mídias como o Facebook, Twitter e Google Plus. A partir da provocação do FBI, o delegado Guilherme Torres, da DAT, determinou a seus agentes uma pesquisa inicial em fontes abertas, para identificar esses perfis. Nos três dias subsequentes, policiais aprofundariam informações sobre quatro dos suspeitos apontados pelo FBI, além de ampliar a lista de investigados. Não houve, entretanto, pedido de autorização judicial para infiltrações por parte dos agentes.

Quarenta dias depois do recebimento do memorando do FBI, e já com o inquérito policial da Hashtag aberto, a Coordenação-Geral de Inteligência da PF recebeu, via e-mail, uma denúncia anônima. Eram dois arquivos em PDF. Um trazia imagens de perfis no Facebook de dez pessoas e o outro, reproduções fotográficas da tela de um celular contendo dezenas de diálogos de um grupo fechado do Telegram, chamado Jundallah, ou “soldados de Alá”.

Cinco nomes citados pelo denunciante anônimo já eram alvo das investigações da PF; quatro destes tinham aparecido no memorando do FBI de maio. Procurada, a PF não quis fazer comentários sobre essa coincidência.

Um dos trechos mais significativos dos diálogos obtidos pela denúncia anônima veio do perfil de Alisson Mussab, atribuído pela PF a Alisson Luan de Oliveira.

Na página 72 do PDF anônimo, aparece o seguinte trecho de Alisson Mussab:

“De fato as olimpíadas seria uma ótima chance… Alguém aqui manja em manusear materiais químicos? Eu mais ou menos… Já imaginaram um ataque bio químico, contaminar as águas em uma estação de abastecimento de água por exemplo? Fazer tipo um pogrom [massacre] contra os kaffirs [infiéis], entraria pra história, e garanto que seria muito eficaz, o problema é que não daria para fazer isso com poucas pessoas, no mínimo 5 no grupo […] Ou caso for exagero demais faríamos um ataque mais simples, eu estaria disposto […].”

A isso, o perfil Sley Jihad, identificado pela polícia como Danilo Francini dos Santos, posteriormente indiciado, mas não denunciado, comenta: “Masha allah” [“pela vontade de Alá”]. Na sequência, o perfil atribuído a Hortêncio Yoshitake emenda: “Ou fazer igual aos chechenos naquela maratona em Boston. Mas pra isso tem q planejar pessoalmente e sem suspeita”. Alisson então responde: “acho que o pogrom seria muito mais fácil e sem suspeita […] As Olimpíadas já estão nas portas”. Hortêncio então pergunta: “que dia começa a Olimpíada?”. Alisson responde: “Dia 5 de agosto se não estou enganado”.

Nesse instante aparece, no Telegram, um perfil não identificado pela polícia, Mara Salvatrucha-13, que pergunta: “vocês sabem fazer bombas caseiras, certo?”. Ninguém responde diretamente à pergunta, e a conversa toma outro rumo.

Mara Salvatrucha-13 não foi o único perfil provocativo que não foi identificado pela polícia.

Analisando o mesmo diálogo, percebe-se que a frase de Alisson Mussab, postada às 12h35, veio muito depois do momento em que o tema da Olimpíada foi introduzido. Quase cinco horas antes, às 7h44, o usuário Mujahid Joelson Abdu-Salvador (não identificado na denúncia nem no relatório final da PF) provocou:

“Não haverá nenhum presente pros kuffar [infiéis] nestas olimpíadas?”

Dois minutos depois, o perfil de Sley Jihad escreve: “No Brasil”.

Abdu-Salvador responde: “Sim. Oportunidade. Esta é uma oportunidade para vocês. A vossa oportunidade de conseguir entrar no paraíso de Allah, está naquela olimpíada”.

Em seu depoimento perante o juiz, Alisson negou ser Alisson Mussab. Disse nunca ter participado deste grupo do Telegram.

A ideia de um atentado que envenenasse as águas do Rio é no mínimo irreal. A Estação de Tratamento de Águas do Guandu, localizado em Nova Iguaçu (RJ), é responsável pelo abastecimento de 85% das águas da cidade do Rio de Janeiro, atendendo a 9 milhões de cariocas. De lá saem 3,6 bilhões de litros de água por dia. Envenenar uma fonte dessa magnitude requereria, segundo especialistas consultados pela Pública, 90 mil litros de solução química capaz de provocar toxicidade, ou algo como seis caminhões-pipa de médio porte.

Quando preso, Alisson, assim como os demais suspeitos, não portavam materiais químicos, explosivos ou armas.

O procurador Miron, que usou o trabalho da polícia para embasar sua denúncia, minimiza o fato de alguns perfis “provocadores” não terem sido identificados pela DAT, descartando a possibilidade de serem infiltrados, ou “agentes provocadores” em busca de gerar provas contra terceiros. “É preciso olhar o material como um todo. Vários destes perfis aparecem pouco nas conversas, na verdade. Em uma investigação como esta a autoridade policial foca nos perfis mais significativos. Embora agressivos, certos perfis têm aparição apenas pontual em uma massa de centenas de diálogos na internet”, afirmou.

No entanto, tais indícios levaram a defensora pública Rita Cistina de Oliveira, de Curitiba, que defende sete dos oito réus do caso, a pedir ao juiz, em suas alegações finais no processo, em março último, a desconsideração dessa prova, sob a suspeita de que a polícia teria contado com a ajuda não de um colaborador anônimo, mas de uma pessoa infiltrada a serviço da própria polícia, o que seria ilegal. “A informação travestida de denúncia anônima trata-se de provável atuação de agente colaborador infiltrado a pedido da Polícia Federal”, escreveu a defensora.

“É muita coincidência a polícia receber um memorando do FBI em relação a determinados perfis suspeitos, começar a pesquisar estes perfis e receber na sequência documento com perfis correlatos. Falamos de um universo de milhares de pessoas que discutem este tipo de tema na internet”, disse ela à Pública.

A defensora argumenta também que os PDFs não foram periciados, fato admitido pelo delegado Guilherme Torres em sua oitiva perante o juiz. “Geralmente as pessoas tomam o cuidado de apagar as propriedades do arquivo [em casos de denúncia anônima]. E não tem perícia que recupere isto”, justificou o policial.

Diálogos do grupo Jundallah não apenas serviram para embasar os indiciamentos e pedidos de prisão, como compuseram parte significativa da denúncia oferecida pelo MPF.

Já para o analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Guaracy Mingardi, existe entre as polícias brasileiras uma “cultura da denúncia anônima”. “Já vi isto em muitos inquéritos. A polícia tem um informante que não pode, até por motivos de segurança, ser identificado, ou obteve uma prova por meio ilegal, e aí recorre à denúncia anônima. Poder não pode, mas acontece. A infiltração deve seguir preceitos legais. O infiltrado não pode, jamais, agir como provocador ou incitador do crime. Isto não cabe”, diz, com a ressalva de que não conhece os detalhes específicos da Operação Hashtag.Embora ressalve que não conhece o caso, e que fala “em tese”, o professor titular de direito penal da Universidade de São Paulo (USP) Renato Silveira diz que a denúncia anônima deve servir apenas de “indício”, e não como “prova” em um processo penal. “A denúncia anônima é o fio da meada de uma investigação. Há jurisprudência sobre isto. O Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, considerou [em 2011] ilegais as provas obtidas pela Polícia Federal na Operação Castelo de Areia [deflagrada em 2009 para investigar crimes financeiros e desvios de verbas públicas], pois estas tinham origem justamente em uma denúncia anônima. Um material que chega já fotografado e digitalizado pode ter sido manipulado antes, o que em caso de denúncia anônima fica impossível de esclarecer”, afirmou.

Procurados pela reportagem, o delegado responsável pela Hashtag, Guilherme Torres, bem como o chefe da Divisão Antiterrorismo, delegado Dennis Cali, não quiseram dar entrevistas. A Pública enviou uma série de perguntas para a assessoria de comunicação da PF, mas não foram respondidas.

Já o procurador Miron relativiza a discussão sobre o modo como parte das provas foi obtida. Segundo ele, para além do material obtido por denúncia anônima, são “inúmeras” as postagens de apoio e exaltação ao grupo extremista. “Há um contexto no qual diversas pessoas se incentivam reciprocamente, seja com mensagens ou dentro de grupos. Eles estão promovendo entre eles o Estado Islâmico, eles estão trocando mensagens a respeito, isto conjugado com divulgações em site aberto. É esta a materialidade que a gente tem do artigo 3º da Lei Antiterrorismo”, disse Miron à Pública, referindo-se ao artigo que tipifica a “promoção do terrorismo”.

Um jornalista infiltrado é indiciado por promoção ao terrorismo

Três dias depois de efetuadas as primeiras prisões da Hashtag, no dia 21 de julho de 2016, o programa dominical Fantástico, da TV Globo, apresentou uma reportagem de cinco minutos sobre possíveis ameaças terroristas no país. A matéria tinha como foco o depoimento de um jornalista não identificado.

Com o rosto encoberto por um capuz e a voz modificada, o jornalista Felipe de Oliveira não foi identificado ao telespectador, mas foi apresentado como alguém que se infiltrara durante um ano e meio em grupos nas redes sociais “seguindo os passos de brasileiros que se dizem prontos para ajudar o Estado Islâmico”. Ele alertava que, além dos presos da Hashtag, existiam “outros brasileiros em contato permanente para planejar ações”. O locutor completava: o integrante de um grupo virtual chegou a “sugerir um atentado no Rio de Janeiro”.

Após a reportagem, o jornalista continuou atuante nas redes.

Quatro dias depois de a matéria do Fantástico trazer o alerta de que poderia haver um atentado no Rio, o próprio jornalista responsável pela informação, que usava nas redes sociais o codinome Abdu Jani, sugeriu, em grupo de WhatsApp infiltrado por ele, que “gostaria (de) fazer algo no Rio de Janeiro”, conforme as palavras do delegado Guilherme Torres no relatório final da polícia. “[o jornalista] também pergunta se os integrantes do grupo conseguem comprar pólvora e materiais para montar um explosivo”, descreve. Na interpretação do delegado Torres, o jornalista “possivelmente estaria a encorajar aos integrantes para possivelmente ver se apoiariam algum atentado”.

Procurada, a assessoria de imprensa da emissora carioca enviou a seguinte nota à Pública: “A TV Globo esclarece que em julho do ano passado foi procurada por Felipe de Oliveira, que ofereceu uma reportagem como free-lancer sobre o Estado Islâmico no Brasil, com dados já totalmente apurados por ele. Como sempre faz, a TV Globo imediatamente confirmou, com outros veículos de imprensa, a boa reputação do jornalista. Não nos foi dado a saber a utilização de qualquer método condenável de apuração. Ele nos disse que se infiltrou em grupos de apoiadores do Estado Islâmico usando para isso a internet, o que é legítimo nesses casos, uma técnica utilizada pelos veículos mais sérios do mundo”. A Globo afirma ainda que procurou a PF no dia anterior à veiculação da matéria, “com a concordância do jornalista, para que as autoridades fossem informadas do seu teor e tivessem a oportunidade de dizer se alguma informação poderia prejudicar investigações em curso”. “Dois delegados da PF estiveram naquele sábado em nossa redação. No dia seguinte à exibição da reportagem, a TV Globo encaminhou todas as imagens em seu poder à Polícia Federal. Evidentemente, as autoridades sempre conheceram a identidade do jornalista, pois isso não era segredo.”

A nota prossegue: “Como o próprio relatório da Polícia Federal atesta, o jornalista Felipe de Oliveira, intimado pelas autoridades, entregou a elas espontaneamente seus aparelhos de telefone e computadores, com o único objetivo de provar que seu trabalho foi jornalístico. A TV Globo esclarece, por fim, que oferece apoio a todo jornalista que responda em juízo em razão de matéria jornalística veiculada por esta emissora com o objetivo de proteger a liberdade de informação e expressão, especialmente na prática do jornalismo investigativo”.

Embora fosse, segundo sugere a nota da emissora carioca, nome conhecido da PF – que chegou a visitar a redação da Globo –, o jornalista continuou agindo ativamente nos grupos nas semanas seguintes. Nesse período, não parece ter sido incomodado pela polícia que agora o indiciou.

Em um diálogo no Telegram destacado pelo delegado Guilherme Torres, no dia seguinte à reportagem do Fantástico, o perfil de Abdu Kani diz a outro usuário: “Estávamos planejando trazer a justiça ao Brasil, mas estamos preocupados com as autoridades…”. O relatório detalha ainda que o jornalista teria dito no aplicativo que, “apesar de não ter ligação direta com o grupo ISIS [Estado Islâmico], seria simpatizante, acompanhando o grupo pelo Telegram e que estaria disposto a agir em nome do grupo se fosse preciso”. Em outro diálogo, no dia 2 de agosto de 2016, o delegado mostra que Felipe fala a outro usuário que “era capaz de ordenar ataques em todos os estados e que não iria preso”.

Por causa de diálogos como esse, o delegado Torres o indiciou por promoção ao terrorismo no relatório final da Hashtag. “Pode-se identificar que este, no afã de obter matérias jornalísticas exclusivas, acabou por promover a organização terrorista Estado Islâmico, na medida em que não apenas apurava jornalisticamente junto a simpatizantes daquela organização, mas também fomentava a radicalização e criava links ou relações interpessoais entre os extremistas, que até então eram inexistentes.”

Felipe de Oliveira, de 28 anos, mora no Rio de Janeiro. Ele não quis dar entrevista para esta reportagem, mas afirmou que tudo o que fez foi “para fins jornalísticos”.

O relatório policial, um documento público, foi anexado aos autos no início de março de 2017. As oitivas de Felipe e termos de declaração junto à PF seguem, entretanto, em segredo de Justiça, a partir de pedido formulado em nome da Associação Nacional de Jornais (ANJ). “A ANJ solicitou segredo de Justiça com o objetivo de proteger o jornalista, já que seu trabalho de jornalismo investigativo poderia resultar em danos à sua segurança, à sua integridade física”, disse à Pública, por e-mail, o diretor executivo da ANJ, Ricardo Pedreira.

O linchamento de um não terrorista  

Os réus da Hashtag foram denunciados em setembro de 2016 pelo procurador Rafael Brum Miron, do MPF de Curitiba, a partir de dois artigos específicos da Lei Antiterrorismo. O principal deles é o artigo 3o: para o crime de “promover, constituir, integrar, ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista”, a pena é de cinco a oito anos de prisão e multa.

Os oito réus da Hashtag respondem, ainda, por formação de quadrilha e corrupção de menores. O Estatuto da Criança e do Adolescente foi invocado porque, das conversas interceptadas em redes sociais – material que forma o núcleo principal da peça de acusação – participavam dois menores de idade, M. B. S., de Caldas Novas (GO), e M. B. F, de Brasília. O primeiro foi encaminhado em julho de 2016 ao Juizado de Infância e Juventude de Caldas Novas, tendo sido internado por 45 dias; morador de Morrinhos, sul de Goiás, não foi denunciado na Hashtag. O segundo, considerado “vítima” da situação pelo delegado responsável pelo caso, Guilherme Torres, acabou retirado dos autos.

Leonid El Kadre de Melo, apontado pelo MPF como o líder do grupo, é o único que responde por “realizar atos preparatórios de terrorismo”, definido no artigo 5o da Lei.

Dos réus, Leonid, além de ser o mais velho – tem 33 anos –, é o único com antecedentes criminais, tendo cumprido pena por homicídio em Tocantins. Estava em liberdade condicional quando foi preso pela Hashtag com o irmão, Valdir Pereira da Rocha, de 36 anos.

Valdir foi, até o momento, a grande vítima do caso dos “terroristas da Olimpíada”. Ele foi morto por linchamento.

O rapaz, que também cumprira pena por homicídio no passado, teve sua prisão temporária revogada em setembro de 2016, após o MPF considerar sua participação nos episódios secundária e decidir não denunciá-lo.

Porém, foi reencaminhado para um presídio estadual, onde voltaria a cumprir sentença relacionada ao processo por homicídio, ocorrido em Tocantins, e no qual cumprira pena em regime semiaberto a partir de 2008. O juiz Leonardo Tumiati, da Vara de Justiça de Vila Bela da Santíssima Trindade (MT), para onde Valdir se mudara depois de saído de Tocantins, entendeu que ele perdera o direito ao semiaberto por causa de sua detenção temporária na Hashtag; daí sua transferência de um presídio federal para um estadual.

Segundo inquérito da Polícia Civil de Mato Grosso, Valdir foi espancado por cerca de 20 detentos na Cadeia Pública de Várzea Grande, por “ser terrorista”, como disse à Pública o delegado Marcelo Jardim: “Existe um código dentro da unidade prisional de Várzea Grande de que terrorista mata crianças e mulheres, que mata gente inocente. O mundo do crime não aceita”.

Conforme o delegado, Valdir estava em um “raio” do presídio considerado “neutro”, mas este foi invadido por presidiários de outra ala, de maior periculosidade. Os presos, segundo ele, bloquearam os acessos e taparam com colchões as câmeras de segurança.

Valdir foi agredido com barras de ferro e morreu de traumatismo craniano, segundo o inquérito, remetido ao Ministério Público Estadual de Mato Grosso. Quatro presos foram indiciados por homicídio duplamente qualificado (motivo fútil e sem chance de defesa da vítima).

Como muitos presídios brasileiros, o de Várzea Grande também é dominado por facções criminosas, no caso, o Comando Vermelho. A ordem para matar Valdir, segundo a polícia, porém, não partiu da facção, mas foi uma iniciativa dos líderes locais. “A exposição do caso na TV certamente contribuiu para esta morte. Depois que foi divulgado que não havia provas contra Valdir, o próprio CV pediu a cabeça dos líderes da chacina, que estão agora em uma área isolada da cadeia”, explica Jardim.

O linchamento foi o mais trágico capítulo do caso dos “terroristas das Olimpíadas”. Longe dos holofotes e passado megaevento, a denúncia do MPF deu ao suposto plano de um atentado relevância apenas secundária. O que importa mesmo foram as atividades dos réus nas redes sociais – pela nova lei, palavras ditas na rede são, elas próprias, provas. Daí para uma ameaça real de atentado terrorista na Olimpíada, restou uma grande distância.

ATUALIZAÇÃO: 

No mesmo dia da publicação desta reportagem, o juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, condenou os 8 réus com base no artigo 3 de Lei Antiterrorismo, por “promoção ao terrorismo”, e no artigo 288 do Código Penal, “associação criminosa” (leia aqui a sentença).

Leonid El Kadre de Melo foi condenado, também, com base no artigo 5 da Lei Antiterrorismo, referente a “recrutamento com o propósito de praticar atos de terrorismo”. Foi sentenciado a 15 anos, 10 meses e 5 dias de prisão em regime fechado, a maior sentença de todas. O recrutamento, segundo o juiz, se dava por meios virtuais, e na “freqüência com que se dirigia aos demais e sua insistência frequente para que formassem uma célula terrorista no estado do Mato Grosso”. A ele foi imputado o crime de recrutar “aliciar, arregimentar”, “indivíduos e organizar pessoas com o propósito de formar um grupo de atuação do ISIS no Brasil para a prática de atos de terrorismo”. Em sua sentença o juiz ressalva que tal tipo de crime (recrutamento) é de “consumação antecipada”, ou seja, não é necessária a “efetiva ida dos recrutados ao local para o qual foram Chamados”.

Alisson Luan de Oliveira foi considerado pelo juiz o segundo mais importante do grupo e condenado a um total de 6 anos e 11 meses em regime fechado. Os demais réus tiveram penas de reclusão que variam entre 5 anos e 6 meses a 6 anos e 3 meses, em regime fechado.

Foi a primeira sentença do tipo aplicada no Brasil. Com base nas mensagens e imagens disponibilizadas pelos réus na internet, o juiz definiu a “promoção” como sendo o ato de “difundir, fomentar, encorajar, estimular, impelir, impulsionar, incentivar, instigar ou motivar organização terrorista”.

“O conteúdo obtido a partir do afastamento judicial dos sigilos de dados, telemáticos e telefônicos se situa entre a exaltação e celebração de atos terroristas já realizados em todo mundo, passando pela postagem de vídeos e fotos de execuções públicas de pessoas pelo Estado Islâmico, chegando a orientações de como realizar o juramento ao líder do grupo (‘bayat’), e atingindo a discussão sobre possíveis alvos de ataques que eles poderiam realizar no Brasil (estrangeiros durante os Jogos Olímpicos, homossexuais, muçulmanos xiitas, judeus), com a orientação sobre a fabricação de bombas caseiras, a utilização de armas brancas e aquisição de armas de fogo para conseguir esse objetivo”, descreve a sentença.

O juiz deixa claro na decisão que não é necessário haver um planejamento concreto de ato terrorista – como de fato não havia, nem em relação a Olimpíadas nem em relação a outro alvo específico – para a condenação. “Não há necessidade de comprovação de especial fim de agir ou da presença de dolo específico, bastando o simples ato de promover organização terrorista por meio de atos inequívocos que demonstrem externamente a adesão aos seus ideais”.

A defensora pública, Rita Cristina de Oliveira, disse à Pública que vai recorrer da decisão.

A Lei Antiterrorismo veio a jato

Em 21 de julho de 2016, dia da deflagração da Hashtag, o governo norte-americano parabenizou as autoridades brasileiras: “As prisões indicam que eles estão levando isto [a ameaça terrorista] muito a sério. E os Jogos Olímpicos vão acontecer em um ambiente seguro”, afirmou o porta-voz do Departamento de Estado John Kirby durante entrevista coletiva em Washington.

A pressão norte-americana sobre o Brasil para a adoção de políticas antiterrorismo vem de longa data, como confirmou, em 2010, uma série de vazamentos de documentos diplomáticos americanos pelo WikiLeaks. Nestes, fontes diplomáticas afirmavam que movimentos sociais brasileiros seriam um obstáculo à criação de uma lei antiterrorismo no país e demonstram contrariedade com a resistência do Brasil a promulgar uma lei tipificando o terrorismo.

Para Rafael Custódio, coordenador do programa de Justiça da Conectas Direitos Humanos, que acompanhou a tramitação da Lei Antiterrorismo no Congresso Nacional, desde o início a nova lei atendeu, em parte, a pressões internacionais. “Para além da aproximação da Olimpíada, o Brasil quis atender a organismos internacionais de financiamento, que há tempos colocam o cerceamento à circulação de dinheiro do terrorismo como prioridade”, disse. Segundo ele, isso explicaria a pressa com que a lei tramitou – menos de um ano entre sua elaboração pelo gabinete da Casa Civil da então presidente Dilma Rousseff, em 2015, e sua aprovação pelo Congresso Nacional, em março de 2016, aonde chegou em regime de urgência.

Para Custódio, a pressa cobrou seu preço: “Faltou debate. Afinal, estava se criando um novo tipo de crime no país”.

A lei é vista com ressalvas por outros especialistas consultados pela Pública. “Criminalizar uma intenção futura não é um problema em si”, explica o jurista Eduardo Reale, de São Paulo, autor de Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito, entre outros livros. “No crime de associação criminosa, por exemplo, basta ter um plano para ser eventualmente criminalizado. O problema da Lei Antiterrorismo é de outra ordem. Ela é muito aberta. Suas definições são imprecisas. A começar pela definição de terrorismo, que teria a finalidade de provocar ‘terror social’. O que é terror social? A ocupação de uma escola poderia ser enquadrada, em tese, como ato terrorista pelo texto da lei. Um juiz pode interpretar que um fórum online em apoio a uma ocupação caracterizaria promoção ao terrorismo”, pondera.

Custódio, da Conectas, afirma que a primeira sentença baseada na Lei Antiterrorismo poderá balizar o modo como o Judiciário aplicará a lei daqui para a frente. Seu temor é que a lei sirva no futuro para criminalizar movimentos sociais e por direitos humanos. “O crime de terrorismo já pode ser punido com as leis existentes, como a de organizações criminosas, porte de explosivos ou de incitação a crimes como o de racismo, no caso da ‘promoção’. O terrorismo é um problema mundial, é certo, mas acreditamos em outros encaminhamentos, como o investimento em inteligência policial e a maior proteção de nossas fronteiras.”

Já para o professor de ciência política da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) Marco Antonio Carvalho Teixeira, o primeiro processo baseado na Lei Antiterrorismo ganha relevância para além do “terrorismo” propriamente dito. “As redes sociais são um espaço relativamente novo de convivência com o qual estamos aprendendo a lidar. Nas redes as pessoas expressam opiniões, vontades e desejos que não expressariam na vida real, digamos assim. Se fossemos criminalizar a agressividade expressa nas redes, por exemplo, estaríamos diante de um problema grave, de limites à opinião em um ambiente virtual, criminalizando reações e motivações que não saem, na maioria das vezes, do mundo virtual para as ruas. Creio que é preciso ter o cuidado de não transformar problemas pontuais, quer seja de promoção ao terrorismo ou qualquer outra coisa, em problemas gerais, que é o caminho apontado pelo ‘enquadramento’ previsto nas leis. Tudo isto, na verdade, é muito novo, e a sociedade precisa debater mais”, conclui.

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