Pistoleiros tentam expulsar famílias de acampados antes da Justiça, no Pará

Justiça marcou reintegração de posse para esta quarta-feira, 13. Entretanto, faltando menos de 48 horas para o despejo, pistoleiros fortemente armados atacaram as famílias do Acampamento Hugo Chávez, que já deixavam a área. Agora, diante dos últimos acontecimentos, os sem-terra decidiram permanecer no acampamento, e convocam manifestação para amanhã.

CPT Nacional

Era por volta de 20 horas desta segunda-feira, 11, quando começaram a circular áudios no aplicativo de mensagens WhatsApp de acampados do Hugo Chávez denunciando o ataque de pistoleiros contra o acampamento. Alvo de inúmeras investidas nos últimos anos, o Acampamento Hugo Chávez está situado a cerca de 45 quilômetros de Marabá, no Pará.

Em um áudio com duração de 27 segundos, uma mãe e acampada do Hugo Chávez, com voz ofegante, narra os momentos de terror. No início da gravação, inclusive, é possível ouvir as rajadas de tiros. “Nesse momento começou um conflito aqui no Acampamento Hugo Chávez [barulho de disparos de arma de fogo]. Eles [pistoleiros] não estão respeitando nem as crianças. Então aqui, eu tive de correr mais os meus filhos de dentro da minha casa. Meus filhos estão desesperados. Eles estão atirando de frente o acampamento. Pararam a caminhonete na guarita e começaram a atirar, sem respeito às crianças. Tem muita criança aqui [no acampamento]”. São aproximadamente 150 crianças no acampamento, que conta com uma escola municipal.

As 300 famílias do acampamento haviam decido sair da área antes da efetivação da reintegração de posse, marcada para quarta-feira, 13. “As famílias estão se retirando da área. Resolvemos sair antes [da reintegração], para ser menos dolorosa”, contou uma militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Porém, diante dos recentes ataques, os acampados e as acampadas decidiram suspender o desmonte do acampamento e resistir no local (Confira a Nota do MST abaixo).

O Acampamento Hugo Chávez está localizado na Fazenda Santa Tereza, um antigo castanhal, destruído e transformado em pastagem pela família Mutran. O último comprador do aforamento foi o empresário Rafael Saldanha. Mesmo sabendo dos crimes ambientais praticados no interior do imóvel e de uma decisão da Vara Agrária de Marabá que confirmava a propriedade do castanhal como sendo do Estado do Pará, o Instituto de Terras do Pará (ITERPA), numa operação definida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Pará como fraudulenta, titulou definitivamente o imóvel em nome do empresário, conforme informações da CPT em Marabá e MST. De posse do título, Rafael Saldanha requereu o despejo das famílias.

#DespejosDeNatal

Há uma semana, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), e o Fórum Ecumênico Brasil (FeBrasil), iniciaram a Campanha #DespejosDeNatal, com o objetivo de mobilizar a sociedade civil brasileira e a comunidade internacional a sensibilizar e pressionar as autoridades públicas do estado do Pará a suspender o despejo das famílias do Acampamento Hugo Chávez, assim como de várias outras áreas na região Sul e Sudeste do estado do Pará.

Despejos no Pará

Assim como no Acampamento Hugo Chávez, nesta região de Marabá, desde o final do mês de outubro de 2017, cerca de 8 mil pessoas convivem, diariamente, com a possibilidade de serem despejados a qualquer momento.

As liminares de despejo foram expedidas pela Vara Agrária de Marabá e pelo Tribunal de Justiça do Estado. Para despejar essas famílias, o Governo do Estado do Pará ordenou que cerca de 115 policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar permaneçam na região por tempo indeterminado para cumprir liminares em 20 fazendas localizadas nos municípios próximos de Marabá.

***

Confira a Nota da Direção Estadual do MST Pará:

Prezados/as companheiros/as,

Estamos acompanhando todas as movimentações e os acontecimentos no Acampamento Hugo Chávez em Marabá.

Reunimos com todas as famílias e militantes que permanecem no local.

Como já é do conhecimento de todos/as, amanhã, dia 13/12, termina o prazo concedido pela Justiça para permanecemos na área. Estávamos há dias nos preparando para sair de forma pacífica, desmontando barracos.

Ontem, por volta de 16:30h, os acampados foram abordados na estrada que dá acesso ao acampamento por jagunços fortemente armados com espingardas e revólveres que atiraram contra os trabalhadores. Logo após, as caminhonetes avançaram sobre a portaria do acampamento atirando contra as pessoas indiscriminadamente, não respeitando mulheres e crianças, que foram obrigadas a correr para se esconder, muitas das quais desmaiaram e foram socorridas. Os ataques duraram até as 18:30h gerando um clima de pânico e terror nas famílias. As pessoas passaram a noite sem dormir por conta do medo.

Hoje, o clima é mais tranquilo, porém as pessoas estão muito apreensivas, mas com uma enorme disposição de lutar e seguir em frente.

Várias denúncias foram feitas aos órgãos e responsáveis pela segurança pública do Pará, mas até o momento nenhuma autoridade se deslocou para tomar as providências.

Diante da gravidade da situação decidimos:

  1. Suspender o desmonte do acampamento e resistir até a última possibilidade por falta de segurança às famílias Sem Terra.
  2. Responsabilizar o Governo Estadual e o Governo Federal pela tragédia que pode vir a ocorrer com as famílias.
  3. Denunciar a omissão do ITERPA, INCRA, DECA, PM e Polícia Civil e o Poder Judiciário, responsáveis pelo estado de caos e barbárie em solo paraense.
  4. Pedir o apoio e solidariedade de todas as pessoas e entidades que defendem a justiça social, os direitos humanos e a reforma agrária para se manifestar e protestar contra a violação dos direitos humanos no Brasil e na Amazônia.
  5. Manifestação dia 13, às 08 horas da manhã, em frente ao Fórum de Marabá contra a violência no campo e contra os despejos.

Marabá, 12 de dezembro de 2017.

Foto: CPT Nacional

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