Nota de pesar sobre Marielle Franco

Rio 40 graus
Purgatório da beleza
E do caos…[1]

O Rio de Janeiro e o Brasil vivem um contexto de posicionamentos extremos, decorrentes de uma sociedade desigual e excludente. Este quadro terminou por vitimar a Vereadora Marielle Franco, naquela cidade.  Foi mais uma execução de ao menos 24 casos, nos últimos 4 anos, de assassinatos de lideranças políticas, levantados pelo historiador Fernando Horta, doutorando na Universidade Brasília- UnB. Mortos, justamente, por conta dos trabalhos que realizavam junto às suas comunidades[2]. Desta forma, nós, mestrandos (as) e mestres em Direitos Humanos da UniRitter, abaixo-assinados(as), por um compromisso ético com nossas pesquisas, com a função social da academia e com a construção de um país mais inclusivo, não poderíamos nos omitir neste momento, e manifestamos nosso pesar por Marielle.

O Brasil está no topo de diversos rankings de ativistas mortos. Todavia, isto não ganha a atenção devida da sociedade e do Estado. Há denúncias sobre a precarização de programas como os de Proteção de Vítimas e Testemunhas – Provita, de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos- PPDDH e de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte – PPCAAM[3]. Em 2017, o PPDDH atendia 356 pessoas e tinha uma fila de 130 à espera de vagas e o PPCAAM assistia 431 crianças e adolescentes, e 750 famílias, com problemas de falta de recursos, que ainda persistem. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) e a Relatoria sobre os direitos de defensoras e defensores de direitos humanos da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por mais de uma vez, já manifestaram sua preocupação com a proteção dos (as) defensores (as) de direitos humanos, exortando que o Estado brasileiro tenha uma maior atenção[4].

O absurdo da execução de Marielle se prorroga na sociedade brasileira, tanto na luta social que ela representava e, que ainda se faz necessária, como pelos ataques que vem sofrendo nas redes sociais e fora delas, por segmentos da sociedade que tentam legitimar tal ato bárbaro, desmerecendo a sua pessoa. Está exposta, assim, a falta de alteridade que há com a população negra e pobre do país[5], credenciando notícias falsas, os chamados fakenews que, na verdade, só reverberam o preconceito e estigmas não superados. Não contribuem, também, sobre o reto entendimento do que seriam direitos humanos, dando continuidade a campanha surgida durante a Ditadura Militar, para tratá-los de forma pejorativa e negativa. Visam apagar sua origem e razão de ser que é conferir liberdade, oportunidades iguais e dignidade e direitos a todos, na busca de uma sociedade mais fraterna (art. 1º, da Declaração Universal dos Direitos Humanos). Ao poder constituído e à opressão não se é permitido críticas e quem sua voz levanta é o inimigo, a quem é negada distinção de cidadã, uma não-pessoa, a qual pode ser privada de certos direitos, inclusive, à vida[6].

Não se pode mais admitir a naturalização, o descaso, quando não o pior, desdém e apoio a atos como estes. A solidariedade e comoção, a partir do caso Marielle, deve servir de inspiração para mudanças, que retirem a parcela da população brasileira que se encontra numa situação de submissão à violência de difícil reversão[7]. O Estado não pode apenas confirmar a premissa de que para muitos, só existe em sua face repressiva.  O pesar, o luto deve se transfigurar em luta, por isto nos somamos ao brado de “Marielle Presente/ Hoje e sempre!”

Assinam a nota:

1.Adalene Ferreira Figueiredo da Silva – Mestranda 2018/2019;

2. Adriana Dornelles Farias – Mestranda 2017/2018;

3. Alexandre Ziebert Schardong – Mestrando, 2017/2018;

4. Alice Hertzog Resadori – Mestre 2015;

5. Ana Paula Mella Vicari – Mestre 2018;

6. Anna Carolina Meira Ramos – Mestranda 2017/2018;

7. Bruna Vidal da Rocha – Mestranda 2018/2019;

8. Camila Mousquer Buralde – Mestranda 2018/2019;

9. Carla Fernanda de Almeida La Cruz Rodriguez – Mestranda 2018/2019;

10. Caroline Pacheco – Mestre 2018;

11. Cynthia Barcelos – Mestranda 2017/2018;

12. Daiana Cristina Cardoso Pinheiro – Mestre 2017;

13. Dailor Sartori – Mestre 2016;

14. Daniella Bitencourt – Mestranda 2017/2018;

15. Djenifer Bencke da Silva – Ouvinte, 2018/2019;

16. Douglas Sichonany Samuel – Mestrando 2018/2019;

17. Êmily de Amarante Portella – Mestre 2018;

18. Franciele Rieffel – Mestranda 2017/2018;

19. Gimena Sichonany Samuel – Mestre 2018;

20. Ivete Machado Vargas – Mestre 2015;

21. Kadja Menezes – Mestranda 2018/2019;

22. Jacqueline Padão – Mestranda 2017/2018;

23. Karen Cristina Correa de Melo – Mestranda 2017/2018;

24. Líbia Suzana Garcia da Silva – Mestranda 2018/2019;

25. Lúcio Mauro Paz Barros – Mestre 2017;

26. Marcelo Lucca – Mestrando 2018/2019;

27. Márcio da Silva Kubiach – Mestrando 2018/2019;

28. Maria do Carmo Goulart Martins Setenta – Mestranda 2017/2018;

29. Mariane Mauss – Mestranda 2017/2018;

30. Marina Nogueira de Almeida – Mestranda 2017/2018;

31. Mateus Silveira – Mestrando 2017/2018;

32. Orlin Ivanov Goranov – Mestre; 2017;

33. Priscila Vargas Melo – Mestre 2015;

34. Raquel Olinski – Mestranda 2017/2018;

35. Robson Luís Zinn – Mestrando 2018/2019;

36. Rodrigo da Silva Vernes Pinto – Mestre 2013;

37. Rodrigo de Medeiros Silva – Mestrando 2017/2018;

38. Rodrigo Hamilton dos Santos – Mestre 2015;

39. Rúbia Abs da Cruz, Mestre, 2017;

40. Valdir Florisbal Jung – Mestrando 2018/2019;

41. Vanessa Marques Borba – Mestranda 2017/2018;

42. Vinicius Maciel Stedele – Mestrando 2018/2019.

Notas:

[1] Música Rio 40 graus de Fernanda Abreu

[2] Disponível em: http://operamundi.uol.com.br/conteudo/geral/49021/nao+e+so+marielle+conheca+mais+24+casos+de+liderancas+politicas+mortas+nos+ultimos+quatro+anos.shtml. Acesso em: 22 de mar 2018.

[3] Disponível em: https://cptnacional.org.br/quem-somos/12-noticias/conflitos/3869-plano-de-protecao-a-testemunhas-tem-reducao-no-pais. Acesso em: 22 de mar 2018.

[4] Disponível em: http://www.oas.org/pt/cidh/prensa/notas/2018/027.asp . Acesso em 22 de mar 2018.

[5] PIRES, Thula. Criminalização do racismo:  entre política de reconhecimento e meio de legitimação do controle social sobre os negros. Brasília: Brado Negro, 2016, p. 40.

[6] ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. 2 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p.18.

[7] PIRES, Thula. Criminalização do racismo:  entre política de reconhecimento e meio de legitimação do controle social sobre os negros. Brasília: Brado Negro, 2016, p. 18

Enviado para Combate Racismo Ambiental por Rodrigo de Medeiros Silva.

Comments (1)

  1. Parabéns pela iniciativa! Pessoas como voces fazem a diferença neste mundo cruel, onde o interesse social está longe do compromisso do Estado.
    A impotência que sentimos nos desanima, mas com este tipo de atitude, a esperança renasce.
    Um abraço a todos.
    Jussara

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