MPF divulga nota técnica em defesa do Parque Nacional da Serra da Canastra (MG) e suas populações tradicionais

Procuradores defendem área integral da unidade de conservação e conciliação do modo de viver das populações tradicionais com a proteção ambiental do parque

O Ministério Público Federal (MPF) é contra qualquer alteração legislativa nos limites do Parque Nacional da Serra da Canastra, em Minas Gerais, para permitir a exploração de minérios na área, reduzindo ou suprimindo a atual proteção legal da unidade de conservação. O órgão defende ainda a manutenção das populações tradicionais – identificadas por perícia etnográfica – e a conciliação da proteção ambiental aos usos e costumes sustentáveis, através de um novo plano de manejo para o parque. A posição está em nota técnica divulgada nesta quarta-feira (16) pelas Câmaras de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR) e de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR).

No documento, os membros do MPF defendem a manutenção dos limites originais do parque, de 200 mil hectares, conforme previsto no decreto que criou a unidade de conservação, em 1972. A controvérsia acontece porque dois anos depois, em 1974, o governo federal editou novo decreto que declarou apenas 106 mil hectares como área de interesse social para fins de desapropriação. Além disso, a área efetivamente delimitada e desapropriada pelo Poder Público se limitou a 71 mil hectares, perímetro que foi considerado pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal na elaboração do primeiro plano de manejo da unidade, em 1981. Por tudo isso, ação proposta pela Defensoria Pública da União (DPU) em 2014 defende a redução da área real do parque.

Em sentido contrário, o MPF argumenta que, desde 2001, quando teve início a elaboração de novo plano de manejo pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o equívoco na definição dos limites do parque foi reconhecido, razão pela qual o plano de 2005 passou a considerar os 200 mil hectares originais. A afirmação é baseada em diversas análises técnicas realizadas pela equipe pericial do Ministério Público. De acordo com os laudos, a suposta controvérsia em relação à área do Parque da Canastra se deve a informações incompletas e contraditórias equivocadamente consideradas pelo Poder Público em algum momento da história do parque.

O MPF também rebate a tese da caducidade, levantada na ação da DPU. Para os procuradores, não se pode falar em extinção de unidade de conservação (UC) criada por lei ou decreto, ou em redução de seus limites, ainda que o prazo de cinco anos previsto no Decreto 3.365/41 tenha expirado, uma vez que qualquer alteração de UC só pode ocorrer por lei e, nunca, pela omissão administrativa.

Conflitos

A indefinição sobre a área real da unidade de conservação é uma das razões para os conflitos hoje existentes na área não regularizada do parque, aponta a nota técnica do MPF. Como cerca de 130 mil hectares ficaram excluídos do primeiro plano de manejo do parque, as famílias que ali habitavam continuaram suas atividades econômicas e sociais, inconscientes de que viviam no interior de uma unidade de conservação de proteção integral. Vários atos administrativos, como a expedição de licenças ambientais e títulos minerários, também foram concedidos indevidamente pelo Poder Público, agravando a situação.

Os problemas resultantes disso foram apontados em diagnóstico divulgado pelo MPF em 2015. O relatório destacou, entre outros focos de conflito, a presença de agronegócio não tradicional por proprietários não residentes na região; a agropecuária tradicional, sobretudo a pecuária leiteira ligada à produção do queijo canastra; e a mineração de quartzito e de diamantes em área que deveria ser de proteção integral.

A nota técnica do MPF destaca ainda a relevância ambiental da área, divisor de águas de duas das mais importantes bacias hidrográficas brasileiras, a do Rio Paraná e a do Rio São Francisco. Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial Parque Nacional da Serra da Canastra, instituído por decreto presidencial em 2006, ressalta que a área “é um ambiente de elevada importância para a conservação dos recursos hídricos, de formação geológica e de uma paisagem única, guardando elementos importantes de registros pré-históricos e históricos, que merecem ser conservados, para que as presentes e futuras gerações possam conhecê-los e valorizá-los”. Ainda segundo o documento, “a área de aproximadamente 200 mil h apresenta praticamente todas as fitofisionomias que englobam formações florestais, savânicas e campestres, o que é pouco comum em outras áreas protegidas do cerrado”.

Populações tradicionais

A nota técnica do MPF reforça a necessidade de proteção da comunidade tradicional canastrense e a obrigatoriedade de que essa população seja respeitada conforme prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Dessa maneira, os procuradores defendem que o plano de manejo do parque deve ser refeito, com a participação efetiva da comunidade tradicional.

Diante de todos os argumentos, a nota técnica do MPF conclui pela não alteração legislativa dos limites do Parque da Canastra previstos no Decreto 70.355/1972, de 200 mil hectares; pela proibição, em qualquer hipótese, de atividade minerária no interior dessa área; e pelo cancelamento, por parte do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), de todas as autorizações, permissões e concessões de pesquisa e lavra minerária relativas à região.

O MPF defende ainda a total improcedência da ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União; a rejeição da tese da caducidade dos decretos do Parque Nacional da Serra da Canastra; a conciliação da proteção ambiental aos usos e costumes sustentáveis, através de um novo plano de manejo; a manutenção das populações tradicionais na área; e a efetiva implementação do parque pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), com a retirada e o pagamento da indenização devida aos ocupantes não identificados pela perícia etnográfica como população tradicional.

Leia a íntegra da Nota Técnica.

Secretaria de Comunicação Social
Procuradoria-Geral da República

Foto: Fellipe Abreu / Folha

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