Povo não come “indicadores econômicos”. Por isso, Temer é reprovado por 70%, por Leonardo Sakamoto

no blog do Sakamoto

Quando determinados indicadores econômicos apresentaram sinais de melhora há um ano, alguns analistas de mercado vieram a público comemorar que o país tinha finalmente saído da lama e entrado no eixo. Após cair 3,5%, tanto em 2015 quanto em 2016, o PIB subira 1% em 2017.

No ano passado, o Brasil – que segue sua vocação colonial de plataforma de exportação de matéria-prima – beneficiou-se de uma safra agrícola recorde. A prudência, deixada de lado, foi trocada por um discurso otimista de que o pior da crise havia passado. A verdade – negada e posta para baixo do tapete – é de que o pior só passa quando os mais pobres (que mais sofrem com crises severas) concordam com isso.

Não foram poucos os que afirmaram que a retomada do crescimento traria capital político para o governo federal. Ou seja, a população, pragmática, poderia relevar as denúncias de corrupção, malas de dinheiros e gravações frigoríficas diante da percepção de que sua vida estaria melhor. Baseavam-se em precedentes, como o de Lula, reeleito em 2006 mesmo com a crise aberta pelo chamado Mensalão.

O então ministro da Fazenda Henrique Meirelles – cujo carisma é menor do que a de uma fruta-do-conde madura – correu para organizar sua corrida rumo ao Palácio do Planalto. E foi pré-confirmado, nesta terça (22), em cerimônia do MDB como candidato do partido. O próprio Michel Temer disse, hoje, que abre mão da vergonha pública, que dizer, da candidatura em favor de Meirelles. Ele que chegou a nos fazer acreditar que (olha a loucura) poderia disputar um cargo que só conquistou após longa conspiração contra a antecessora.

A reprovação do governo Temer se manteve inacreditavelmente estável na casa dos 70%. E sua aprovação, que chegou a um valor nominal próximo da própria margem de erro, gira em torno dos 6%, segundo os institutos de pesquisa. Os mesmos analistas declaravam que isso se dava porque a população ainda não havia percebido a retomada e que isso aconteceria em breve. Ou seja, de que o povão não sabia o que estava acontecendo.

O problema é que a população não se alimenta de indicadores econômicos de forma bruta, mas de arroz, feijão e bife, frango ou ovo – variação que depende do salário. E a tão divulgada retomada não se fez chegar ao grosso do povão, que viu empregos formais se transformarem em informais, salários de suas categorias serem achatados e a geração de postos de trabalho de qualidade patinar na lama.

O governo, contra todas as recomendações, ainda pôs mais lenha na fogueira prometendo que os impactos positivos da Reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização Ampla se fariam sentir muito em breve caso as legislações fossem aprovadas. Passados seis meses da primeira delas entrar em vigor, talvez alguns grandes empresários já sintam os benefícios das mudanças através da redução de custos. Mas não o povão ainda não viu leite e mel correr pelo meio fio das calçadas como foi lhes dito.

Por mais que postos formais estejam sendo gerados, eles são insuficientes para uma melhora sensível no mercado de trabalho. Pelo contrário, o emprego patina. E o desemprego só não aumentou do ano passado para este porque um contingente considerável de brasileiros entrou em desalento.

Cerca de 4,6 milhões de pessoas desistiram de procurar emprego no primeiro trimestre deste ano. Esses contingente está fora da força de trabalho por não acreditar que exista oportunidade ou espaço para no mercado, não contar com experiência ou qualificação, ser considerado muito jovem ou muito idoso, não encontrar serviço no local de residência ou não ter conseguido trabalho adequado.

No último trimestre do ano passado, o número era de 4,3 milhões, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua.  A taxa de desemprego no primeiro trimestre de 2017 foi de 13,7% e a do mesmo período deste ano, 13,1%. O governo Michel Temer diz que o desemprego caiu – mas só porque aumentou  o número de pessoas que, desanimadas, desistiram de procurar serviço. Elas representam, hoje, 4,1% da força de trabalho.

Os desempregados, somados às pessoas que gostariam de trabalhar mais e os que desistiram de procurar emprego chegam a 24,7% – o que representa uma força de trabalho de 27,7 milhões.

Levantamento da Folha de S.Paulo, publicado em janeiro, mostrou que passou de 253,7 mil (no terceiro trimestre de 2016) para 501,3 mil (no mesmo período de 2017) o número de pessoas ganhando o sustento como vendedores ambulantes de comida . Ou seja, gente desempregada vendendo alimento na rua para pessoas que não têm mais dinheiro para comer em restaurantes.

A situação econômica não é culpa apenas de Michel Temer, também deve ser atribuída à gestão de sua companheira de chapa, Dilma Rousseff. Mas as ações de Temer não têm surtido o efeito na velocidade desejada e planejada. A situação atual pode até ser uma etapa anterior à geração de empregos formais. Mas nada de muito bom pode ser construído alijando uma massa de trabalhadores de um patamar mínimo de dignidade (empregos formais com direitos trabalhistas) sob a promessa de que o sacrifício de hoje e traduzirá em prêmio no futuro.

Nesta terça, o governo divulgou nova estimativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB): caiu de 2,97% para 2,5%.

Analistas do mercado culpam a imprevisibilidade das eleições como fator que inibe o investimento empresarial e o consumo interno e influencia na redução do PIB. Também citam a tendência de aumento nos juros nos Estados Unidos, que pode reduzir os investimentos por aqui, além de outras turbulências internacionais.

E começam a fazer análises mais sombrias, de que a retomada será mais difícil do que o imaginado por conta da conjuntura internacional e do processo eleitoral. Maldita democracia que atrapalha o que estava planejado e pode eleger alguém de quem o mercado não gosta.

Maria e José, que vendem bolo e churrasquinho na rua para levarem comida para os filhos depois de perderem seus empregos, podem acabar sendo aqueles que, desde o começo, tinham razão com sua descrença sobre os discursos triunfantes de ”retomada” que ouviam na TV à noite. Pois sabem mais da vida real – aquela que diz respeito à sobrevivência diária – do que os analistas otimistas, que ganham em uma hora o que eles juntam em um mês.

Dificilmente Maria e José votarão em Meirelles. E, certamente, não gostam de Temer. E devem achar uma piada de mau gosto o seu programa de governo se chamar ”Encontro com o Futuro”, quando sentem que o país ruma para uma ”Colisão com o Passado”.

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