TRF determina que posseiros deixem terras pertencentes ao povo Pankararu

Índios Pankararus e os posseiros travavam uma briga na justiça pelas terras que se arrastava desde 1993. As terras estavam demarcadas pelo Incra como terra indígena há mais de 30 anos

Por Portal FolhaPE

Num embate judicial que durou mais de 30 anos, a 4ª turma do Tribunal Regional Federal, no Recife, ratificou decisão de 2010 e determinou que os posseiros deixem as terras do povo Pankararu, uma área de 8.100 hectares nos municípios de Tacaratu, Petrolândia e Jatobá, no Sertão de Pernambuco. A decisão saiu no início da tarde desta terça-feira (19).

Os índios Pankararus e os posseiros travavam uma briga na justiça que se arrastava desde 1987. Apesar de ter sido considerada terra indígena, a sentença judicial determinava que as mais de 300 famílias de posseiros fossem retiradas do local sem constrangimento. Porém houve resistência por parte dos posseiros e o caso terminou sendo transitado em julgado.

Os posseiros diziam que não havia resistência em sair das terras desde que o Estado oferecesse outro lugar e os indenizassem. Odair Pedro, vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jatobá, disse que pediam uma solução sobre a indenização por parte do Governo Federal.  “A gente aceita que seja indígena, mas não ser retirado de lá sem direito. Estamos reivindicando o direito de 302 famílias”, explicou. Segundo ele, houve a promessa de uma terra de 96 lotes no município.

Segundo a procuradora federal Priscilla Lima, representante da Funai e do Incra, a região foi demarcada por decreto presidencial desde 1987. Ela afirmou que a continuidade da operação policial foi autorizada na decisão judicial. “A liminar obtida pelos posseiros foi revogada e mantida a operação policial que havia se iniciado”, explicou. A justiça deu um prazo 90 dias para os posseiros saírem das terras de forma pacífica.

Os posseiros argumentavam que o valor depositado pela Funai seria baixo e que a terra oferecida pelo Incra não seria agricultável. Segundo a procuradora, esses argumentos não procedem. “Houve o depósito de R$ 5 milhões e 300 mil nos autos de origem e o oferecimento de 95 vagas onde já residem 305 famílias.

Segundo Saparó Pankararu, líder dos indígenas, a ação percorreu por todas as instâncias dando causa ganha aos índios. “Nossa terra é tão pequena; nós somos aproximadamente 8 mil indígenas e nós estamos lutando pelo direito de existirmos enquanto povo”.

Como último recurso, a defesa dos posseiros entrou com o instrumento de agravo solicitando que não fossem retirados das terras. A alegação era de que chegaram primeiro do que os índios. O agravo foi negado e a justiça determinou um prazo de 90 dias para os posseiros saírem do local. Oficialmente, a Justiça ordenou 45 dias, mas a Polícia Federal irá esperar 90 dias para evitar conflitos e outras brigas.  Em contrapartida, os índios falam que os moradores dos sítios Bem querer de baixo, Bem querer de cima, Caldeirão e Cacheado invadiram a terra indígena.

No momento do julgamento, dois pequenos grupos ficaram em frente ao Tribunal Regional Federal: um de agricultores  das terras dos quatro sítios e os índios Pankararus. A convivência dos dois grupos foi pacífica.

Entenda o caso

1987
O terreno que compreende os sítios de Bem querer de baixo, Bem querer de cima, Caldeirão e Cacheado, foi demarcado e decretado como terra indígena.

1993 
O Ministério Público Federal entrou com ação civil pública contra os ocupantes/posseiros/não-índios e contra Funai, Incra e Governo Federal  para que os ocupantes saíssem, que a Funai e União levantassem as benfeitorias de boa fé, como por exemplo uma casa, uma plantação e pagasse as benfeitorias.

Que o Incra cadastrasse as famílias que têm perfil de clientes da reforma agrária para reassentá-las. Nem todas as famílias que estão lá podem ser reassentadas.

2003 
Houve sentença e a ação civil foi acatada fixando essas obrigações aos órgãos e ordenando a saída dos não indígenas.

2010
A sentença transitou em julgado, não mais podendo haver questionamento.

2011
Houve tentativas de conciliação para saída pacífica, mas os ocupantes resistiam. Os posseiros não deixavam a Funai fazer a avaliação das benfeitorias de boa-fé – avaliação de quanto vale um imóvel para pagar a indenização

 2015 e 2016
Os depósitos da indenização da Funai foram feitos. O pagamento foi realizado para as pessoas caracterizadas pela Funai como de boa-fé – que não sabiam que não poderiam ocupar aquele local.

2017 
Juiz de Serra Talhada assinou acordo com os posseiros/ocupantes/não-indígenas concordando com a retirada e que a desocupação seria progressiva – 25% a cada três meses.

Em julho de 2017, a Funai percebendo que ninguém havia saído, entrou na Justiça pedindo providências. No acordo, os líderes dos ocupantes se comprometeram a pagar uma multa de R$ 2 mil cada um (duas pessoas) caso não saíssem. Foi pedido bloqueio judicial e eles entraram no Tribunal pra que fosse suspensa esse bloqueio

2018
Esgotou-se o prazo do acordo em fevereiro e março deste ano. A Justiça ordenou que a Polícia Federal cumprisse a desocupação à força em 45 dias.

Os não-indígenas entraram com o agravo de instrumento alegando que as terras dadas como indenização não prestavam, que não houve depósito da indenização em conta para suspender essa retirada. Operação estava em curso desde maio, mas foi suspensa pra que se esclarecesse a situação.

Nesta terça (19), a 4ª turma do TRF negou o agravo e eles têm 90 dias para sair das terras de forma pacífica.

Imagem: Índios Pankararus se reúnem em frente ao prédio do TRF, no bairro do Recife – Foto: Julya Caminha / Folha de Pernambuco

Comments (2)

  1. “A alegação era de que chegaram primeiro do que os índios”

    Esqueci dizer que este tipo de “argumento” é tão estúpido e absurdo que só num país onde educação e conhecimento são desvalorizados sequer for aduzido.

  2. “Num embate judicial que durou mais de 30 anos”
    “A alegação era de que chegaram primeiro do que os índios”

    Primeiro tenho de deixar claro que apesar da manchete que o “TRF determina” acreditarei apenas no conteúdo real da sentença quando o último posseiro de fato (de carne e osso) sair da T.I.
    Desconfiança lógica que não surpreende depois de tantas “decisões jurídicas” e nenhuma a ser acatada.

    Segundo quero lembrar que durante os 30 anos perdidos gerações de indígenas foram prejudicadas e gerações de invasores atendidos no sentido que continuaram lucrando em terras alheias.

    Terceiro quero frisar que o martírio dos Pankararu não constar nada excepcional (no assim eufemisticamente chamado Estado de “Direito” Brasil). Se for para se livrar de oponentes da situação latifundiária e bandeirante, o Poder Judiciário até consegue engrenar e funcionar. Se for, porém, para atender as vítimas desse sistema o mesmo Poder consta uma “falha” interesseira e douradura. O voto no Brasil é sempre do dinheiro. Anteriormente roubado. Pelos bandeirantes originais ate os bandeirantes contemporâneos (vulgo poder agropecuário).

    Finalmente quero recordar a situação dos Tapuya-Kariri e Tremembé (CE), dos Kariri-Xocó e Xukurú-Kariri (AL), dos Tupinambá e Pataxó (BA) – entre outros mais – nas “suas” T.I. respectivas. Sofrem a mesmíssima farsa jurídica e a mesmíssima guerra latifundiária e racista neste país bandeirante.

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