Candidatos procuram vice com voto e tempo de TV, mas sem olho gordo. Por Leonardo Sakamoto

no blog do Sakamoto

Com exceção do PSOL, que já oficializou Sônia Guajajara como vice de Guilherme Boulos, outros partidos estão tendo problemas para encontrar companheiros de chapa para seus candidatos.

Parte dos convidados agradece, mas declina, não raro dando um toco em candidato que já estava comemorando a cesta. Outros até desejam ocupar a vaga, mas seus partidos não deixam – afinal, o cálculo da eleição de parlamentares ou a promessa de compensação por parte da concorrência fala mais alto.

A busca é por alguém que garanta votos, traga credibilidade e/ou, ao menos, ajude a agregar tempo de rádio e TV, nessa que deve ser a última eleição presidencial em que esses meios de comunicação ainda terão papel central na definição do voto.

E, de preferência, alguém que não planeje a deposição da cabeça de chapa no futuro.

Discutiu-se no arremedo de Reforma Política levada a cabo pelo Congresso Nacional extinguir o cargo de vice. Afinal, vivemos um mundo on-line e o mandatário está conectado ao que acontece no país, no estado, no município mesmo à distância. A proposta, contudo, foi rejeitada, pois um bom vice continua sendo um coringa em uma eleição acirrada e resolve questões de coalizão. O problema é o que fazer com ele ou ela após a eleição.

Esse negócio de vice-presidente, aliás, vem sendo uma fascinante maldição. Sarney assumiu o lugar de Tancredo após sua morte. Itamar, o de Collor após um impeachment. Temer, o de Dilma após outro impeachment. Não se tem notícia de que Sarney e Itamar ajudaram a empurrar seus antecessores para fora da vida ou do cargo, mas o mesmo não se pode dizer de Temer.

E há uma predestinação tão inexplicável nesse treco que, após a infeliz e trágica morte de Eduardo Campos por conta da queda do avião em que estava, durante a campanha de 2014, Marina Silva, sua vice, assumiu a candidatura. Ou seja, a maldição envolve até quem ainda não foi eleito.

Temer, que era vice, não tem vice. Na sua ausência, assumia o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Tendo a certeza do que um vice é capaz, Temer não desgrudou o olho de seu aliado no Congresso Nacional. Que durante os dias em que o Brasil só queria ouvir as gravações interpretadas por Joesley Batista, foi sondado para fazer com Temer o que Temer fez com Dilma.

Desde abril, sempre que Temer viaja, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, presidente do Senado e segundo na linha sucessória, têm que arranjar uma viagem para a Disney ou similar e sair do país. Caso contrário, ficam impossibilitados de concorrer a outro cargo que não à Presidência da República. Assume a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia.

Chegou a circular um balão de ensaio com a ideia de uma chapa ”puro sangue” tucana, com Geraldo Alckmin, candidato, e João Doria, vice. Não se sabe de onde o boato surgiu, mas um deputado tucano me afirmou que isso é impossível de ocorrer porque ”o governador não é besta”.

Dada a dificuldade de encontrar perfis discretos, leais e reservados como o de Marco Maciel (o vice de Fernando Henrique) e o de José Alencar (o vice de Lula) e dado que a população raramente olha para a foto do vice na hora de votar na urna eletrônica (o vice de Dilma Rousseff), os parlamentares deveriam ter tido a bondade de, ao menos, ter aprovado a possibilidade de eleger bonecos infláveis ou animais da flora brasileira como vice em eleições presidenciais. Certamente, ter um inflável no Palácio do Jaburu nos traria menos depressão e ansiedade.

Por fim, um dado pitoresco: em 07 de dezembro de 2015, o então vice-presidente Michel Temer mandou uma cartinha à então presidente Dilma Rousseff. Foi o antológico texto que imortalizou a expressão ”vice decorativo”, preparando o terreno para o desembarque da confiança. Nela, ele publicizou até o ciúme que sentia de Joe Biden, outro vice, mas dos Estados Unidos: ”Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden – com quem construí boa amizade – sem convidar-me”.

A carta termina com um trecho paradigmático sobre o ser vice na vida de alguém: ”sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção”. Você pode não gostar da Dilma, mas deve reconhecer que ela estava certa. Apenas 3% da população, segundo a última pesquisa Datafolha, aprovam-no.

Como nela disse o próprio Temer: Verba volant, scripta manent. As palavras voam, os escritos permanecem.

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