Gilberto Maringoni, Giorgio Romano e Valter Pomar são alvo da Comissão de Sindicância da universidade pela participação em evento de lançamento do livro “A verdade vencerá”, que traz uma longa entrevista com o ex-presidente
Por Lucas Vasques, na Fórum
A Universidade Federal do ABC (UFABC) realizou no dia 18 de abril o lançamento do livro “A verdade vencerá”, da Editora Boitempo, que traz uma longa entrevista com o ex-presidente Lula realizada por Ivana Jinkings, Juca Kfouri, Gilberto Maringoni e Maria Inês Nassif. Hoje (24), os docentes Gilberto Maringoni, Giorgio Romano e Valter Pomar receberam a notícia de que a corregedoria da universidade abriu uma comissão de sindicância para investigar a participação deles no evento, após uma denúncia anônima. Pomar, sequer, esteve no local no dia do evento.
Em contato com a Fórum, Maringoni revelou que participou de uma reunião no Conselho Universitário e colocou a questão em discussão: “Enfatizei o absurdo da situação, que vai contra até mesmo o manual de procedimentos administrativos da CGU (que só admite a instauração de sindicância a partir da apuração prévia dos fatos), cria um clima péssimo na situação política atual, não apresenta denúncia concreta e envenena o ambiente acadêmico. Não há fato determinante claro. E falei que atos e iniciativas desse tipo são absolutamente inaceitáveis”, afirmou.
A mensagem da investigação
Os três docentes receberam a seguinte mensagem da Comissão:
De acordo com as normas que regem as sindicâncias, é necessário manter discrição sobre os documentos e informações que constam nos autos do processo, tendo em vista sua tramitação com visualização restrita aos interessados. De modo a podermos esclarecer os fatos, pedimos que sejam respondidos os seguintes questionamentos preferencialmente até quinta feira dia 26/07/2018.
1- O senhor participou da organização do evento A verdade vencerá, realizado nas dependências da Fundação Universidade Federal do ABC?
2- É de seu conhecimento quais pessoas participaram da organização do evento “A verdade vencerá”, realizado nas dependências da Fundação Universidade Federal do ABC? Poderia dizer o nome de outros organizadores?
4- A realização do evento foi autorizada por algum servidor? Se sim por quais?
5- O uso do espaço da UFABC (sala, anfiteatro etc.) foi autorizada por algum servidor? Se sim por quais?
6- Houve venda de livros durante o evento?
7- A venda de livros foi autorizada por algum servidor?
8-Durante o evento houve apologia ao crime?
9- Durante o evento ocorreram manifestações de apreço por parte de servidores em horário de serviço a favor de Lula e partidos de esquerda?
10- Durante o evento ocorreram manifestações de desapreço e contra o Presidente Temer e integrantes do poder judiciário-MP?”.
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Reação dos docentes
O fato provocou imediata reação por parte da Associação dos Docentes da Universidade Federal do ABC (ADUFABC), que divulgou uma nota:
Carta pública da diretoria da ADUFABC à reitoria da UFABC
São Bernardo do Campo, 24 de julho de 2018
Ao Reitor Dácio Roberto Matheus,
A diretoria da Associação de Docentes da Universidade Federal do ABC vem por meio desta carta pública solicitar, com a máxima urgência, uma reunião para tratar das implicações decorrentes da Comissão de Sindicância Investigativa nº 23006.001375/2018-70.
Essa comissão tem origem em denúncia anônima encaminhada à Corregedoria da UFABC, acerca do lançamento do livro “A verdade vencerá”, evento realizado dia 18 de abril, no auditório 5 do bloco Beta do campus São Bernardo do Campo.
Três professores, todos filiados a esta Associação, receberam através de seus correios eletrônicos correspondência em que se pede que respondam, preferencialmente até o dia 26 de julho, aos seguintes questionamentos … (eles relatam as questões).
Mesmo se tratando de uma Comissão de Sindicância Investigativa, a ADUFABC considera que estamos diante de uma situação grave, que extrapola os procedimentos burocráticos e administrativos, constituindo uma ameaça à liberdade acadêmica e aos direitos políticos constitucionais, uma demonstração dos riscos de perseguição política e assédio moral envolvidos no denuncismo acobertado pelo anonimato, sem falar no desperdício de recursos humanos e materiais.
Neste sentido, solicitamos à reitoria uma reunião em que pretendemos apresentar não apenas nossa posição a respeito, mas também demandar medidas que evitem esse tipo de situação.
Aproveitamos para informar que recomendamos a nossos afiliados que não respondam ao questionário; e que convocamos, para a próxima semana, um debate sobre o tema.
Cordialmente,
Maria Caramez Carlotto (presidenta)
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Governo Temer agiu contra posse de novo reitor
A posse do novo reitor da UFABC foi fruto de uma longa queda de braço. O candidato mais votado para reitor nas eleições. De 6 a 8 de novembro de 2017, Dácio Roberto Matheus, demorou a ser nomeado. O ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM) estendeu pro tempore (sem prazo) o tempo de gestão do ex-reitor Klaus Capelle, alegando falhas burocráticas no processo conduzido pela UFABC.
Reportagem do jornal Diário do Grande ABC de março apontou que o que estaria por trás desse atraso na nomeação do novo reitor seria um suposto alinhamento de Matheus com ideias alinhadas ao PT. O novo reitor conseguiu tomou posse apenas no dia 1 de junho de 2018.
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Nota da reitoria da UFABC sobre o fato
Sobre as recentes trocas de e-mails envolvendo a Corregedoria da UFABC
Em relação às recentes conversas referentes à denúncia anônima encaminhada à Corregedoria da UFABC, a Reitoria informa que está acompanhando os desdobramentos do caso, que já providenciou agendamento de conversas com áreas e entidades interessadas e atua no sentido de promover o melhor encaminhamento da situação, assegurando as apurações necessárias e garantindo que não sejam cometidos quaisquer excessos.
Cordialmente
Reitoria UFABC
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Foto: Universidade Federal do ABC