Justiça Estadual da Bahia determina reintegração de posse e povo Tuxá corre risco de despejo

O povo Tuxá da Aldeia Mãe, Terra Indígena D’zorobabé, questiona se a Justiça Estadual tem competência para atuar no caso. Território está em processo de demarcação pela Funai

Do Cimi

A Ilha de D’zorobabé era morada dos troncos velhos. Um chão sagrado para os Tuxá, povo que habita a região do município de Rodelas, sertão baiano. Com o avanço das águas que formaram o Lago de Itaparica, no final da década de 1980, para abastecer a Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga, a ilha acabou inundada. Pouco mais de 20 anos depois, em 2010, os Tuxá retomaram um pequeno pedaço de terra, com cerca de sete hectares, localizado na frente da vastidão de água onde nas profundezas está, como uma Atlântida perdida, a Ilha de D’zorobabé.

Para além do simbolismo desta retomada, há uma demanda de demarcação territorial, encaminhada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que em nada serviu para impedir uma decisão da Justiça Estadual da Bahia pela reintegração de posse e o despejo dos Tuxá da Aldeia Mãe, que vivem nesta ‘nova’ D’zorobabé. “Fomos surpreendidos. Vamos permanecer na terra tradicional. Decidimos não sair e tomar as medidas cabíveis”, afirma Izaraty Tuxá.

Na decisão publicada no dia 22 de novembro, o juiz José Carlos Rodrigues do Nascimento deu um prazo de 15 dias para que os Tuxá se manifestassem; do contrário, o despejo deverá ocorrer à revelia. Nesta ação, o grupo de impetrantes reivindicam que estão na terra há 200 anos. Para os indígenas, a Justiça Estadual “não tem competência para atuar num caso que é de exclusividade da Justiça Federal. Comunicamos o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública da União e a Advocacia-Geral da União”, diz Dinamã Tuxá.

Dinamã Tuxá, membro da diretoria colegiada da Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), lembra que em 2014 a Justiça Federal determinou à Funai a constituição de um Grupo de Trabalho para a Identificação e Delimitação do Território D’zorobabé do Povo Tuxá. O órgão indigenista não cumpriu a determinação. Então, em 31 de junho de 2017, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) reiterou a decisão de primeira instância e novamente sentenciou a União e a Funai a constituir o Grupo de Trabalho.

Como forma de pressionar as autoridades públicas e protestar, os Tuxá se organizaram e fizeram a autodemarcação do território. A Funai constituiu o Grupo de Trabalho, que já foi a campo realizar os estudos. A Prefeitura de Rodelas e grupos locais reagiram contra os Tuxá com manifestações públicas. Alegaram que a retomada dos indígenas atrapalha a capacidade produtiva do município, sem dizer que, na verdade, se trata de uma Área de Proteção Ambiental (APA) sobreposta ao território tradicional reivindicado oficialmente pelos Tuxá.

A retomada Tuxá

Os Tuxá da Aldeia Mãe, que vivem no território D’zorobabé, compõem 11 clãs totalizando cerca de 220 famílias. O retorno ao local se deu, sobretudo, pela demanda dos anciãos, que reivindicavam a presença do povo mais perto de uma terra considerada sagrada e de rituais. “Após o enchimento do lago de Itaparica, começamos a requerer a área. Em 2003, passamos a fazer manifestações e a pedir a devolução dos objetos arqueológicos retirados de lá como parte dos trabalhos de construção da usina. Então isso foi crescendo e em 2010 decidimos fazer a retomada “, diz Izaraty Tuxá.

A liderança do povo Tuxá explica que o povo foi surpreendido com a liminar: “O juiz nunca ouviu a comunidade ou foi ao local”, diz. Izaraty explica que conforme a decisão, área precisa ser desocupada imediatamente, com multa de R$ 1 mil por dia de permanência e uso de força policial autorizado. O juiz alegou que a área é altamente produtiva, com pastos e plantações, o que é mentira, lá é uma APA”. Para o Tuxá, a decisão tenta embarcar numa conjuntura cada vez mais desfavorável aos direitos dos povos indígenas.

Crianças Tuxá durante encontro na TI D’zorobabé, município de Rodelas (BA). Crédito da foto: Povo Tuxá

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