Carta do Conselho da CPT Regional Nordeste III 2018

Na CPT/BA

Nós, agentes da Comissão Pastoral da Terra Regional Nordeste III – Bahia / Sergipe e trabalhadores e trabalhadoras do campo representantes das comunidades acompanhadas pela CPT na Bahia, em número de 40 pessoas, reunimo-nos em Conselho avaliativo do ano, entre 10 e 14 de dezembro, na Casa da Roça, em Casa Nova – BA. Inspirados/as no sentimento de rebeldia e ousadia de comunhão dos movimentos camponeses de Canudos e Pau de Colher reafirmamos nosso compromisso pastoral junto aos povos da terra e das águas, nesta hora grave que vivemos. Estes movimentos ousaram reviver o que nos contam o livro dos Atos dos Apóstolos (4,32) sobre as primeiras comunidades cristãs: “… da multidão dos que creram, um só era o sentimento e a maneira de pensar. Ninguém considerava exclusivamente seu os bens que possuía, mas todos compartilhavam tudo entre si”. Ressurgem hoje como utopia e desafio.

Em Casa Nova, há oitenta anos, cerca de mil pessoas da comunidade de Pau de Colher foram assassinadas. Assim como em Canudos, esta gente enfrentou opressões, a extrema pobreza, o poder político-econômico e lutou bravamente pelo direito de viver com dignidade em comunhão. Eles não se renderam à violência brutal do Estado. Deles, herdamos nossa experiência de organização popular e resistência ativa.

Revigoramos nossas esperanças ao participarmos, no dia 13, da 16ª Romaria de Pau de Colher. Naquele local sagrado, romeiros e romeiras fizemos memória da experiência de comunidade pautada na justiça social. Na abertura da caminhada e na celebração final, o bispo da Diocese de Juazeiro, D. Carlos Alberto Breis, ressaltou que “toda memória é incômoda e fazer memória é a melhor maneira de encontrar coragem para que os fatos não se repitam”.

As lutas populares continuam e tendem a crescer. Afinal, lutar por soberania popular, pela emancipação da humanidade, pelo fim do patriarcado e do racismo está na ordem do dia. O golpe desferido contra a democracia pela burguesia nacional, os poderes judiciário, legislativo, midiático e setores conservadores da sociedade brasileira, aliados do imperialismo norte-americano, com o objetivo de superar a crise do capital financeiro internacional, tirou direitos dos trabalhadores/as, desviou mais valia social para os bancos e flexibilizou leis que facilitam a tomada de terras e o saque dos bens naturais.

Diante do difícil cenário compreendemos a necessidade de contribuir para o fortalecimento dos movimentos populares, das comunidades, agricultores familiares, assentamentos, quilombos, fundos e fechos de pasto nas caatingas e cerrados, extrativistas, indígenas, auxiliando-os nos processos organizativos e formativos. Ao mesmo tempo, nos colocar em diálogo com setores da sociedade dispostos a enfrentar o futuro governo protofascista, na construção de um projeto democrático de poder popular.

Reafirmamos nosso compromisso com o trabalho de base. Somente em diálogo permanente com os/as oprimidos/as entenderemos quais as questões concretas que dificultam a reprodução livre da vida. Com eles/as saberemos preencher de esperança a palavra política. Reafirmamos nosso compromisso de defender os bens comuns da terra contra a voracidade do capitalismo ultraliberal. As águas, as terras, os ventos, o sol que alimentam as sementes que nos dão vida, não são mercadorias.

Encerramos o Conselho com a certeza de que o povo saberá dar respostas aos seus desafios. Nosso dever pastoral é seguir em caminhada junto dele, sem esmorecer. A história das comunidades é a história do poder popular. Como diz o poeta Nego Bispo, “Fogo! Queimaram Palmares, Nasceu Canudos. Fogo! Queimaram Canudos, Nasceu Caldeirão. Fogo! Queimaram Caldeirão,  Nasceu Pau de Colher. Fogo! Queimaram Pau de Colher… E nasceram, e nasceram tantas outras comunidades que os vão cansar se continuarem queimando.”

Casa Nova, 14 de dezembro de 2018.

Foto da capa: 16ª Romaria de Pau de Colher – Thomas Bauer/ CPT Bahia

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