MPF recorre de extinção de processo contra delegados e agente da PF em MS envolvidos em ilícitos contra comunidade indígena

Acusação é de inserção de dados falsos no sistema Guardião, falsidade ideológica e prevaricação. Delegado foi flagrado em ligação telefônica com foragido mas conversa foi omitida de relatório oficial por ser considerada “sem relevância”

O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul (MS) recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) contra a extinção de processo, sem julgamento, em que acusa três delegados e um agente da Polícia Federal de Dourados de diversos ilícitos relacionados à investigação dos crimes cometidos contra a Comunidade da Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá I, em 14 de junho de 2016. A acusação não foi aceita na Justiça Federal de Dourados sob o argumento de que não há justa causa e os fatos não são típicos de uma ação penal. 

Os crimes tiveram início com a gravação de ligação telefônica entre um delegado da PF e o foragido da Justiça Dionei Guedin, em 22 de agosto de 2016, em que o produtor rural, acusado pelo MPF de crimes contra indígenas, afirma que iria se entregar. De fato, ele já possuía ordem de prisão expedida pela Justiça Federal. Durante a conversa, o delegado informa ao foragido que a PF não possui qualquer inquérito contra ele.

“Isso foi o MPF, não foi a gente não (…) inclusive a nossa relação com o MPF f*** de vez. Agora, vocês fazendeiros tem que se unir e bater no MPF (…) Eu vou dar a fórmula para vocês conseguirem reverter. É bater na imprensa, chamar a mídia e bater neles, que eles gostam de estar bem com a população”.

Esta conversa entre um delegado da PF e um foragido da Justiça não foi informada ao MPF, que tem o papel constitucional de fiscalizar as atividades policiais. Pelo contrário, a PF informou que o diálogo não tinha qualquer relevância para a investigação e ele foi omitido da documentação oficial.

Os denunciados foram além. Entre 22 de agosto e 8 de setembro de 2016, os acusados, valendo-se da estrutura da Delegacia de Polícia Federal de Dourados, excluíram informações corretas e inseriram dados e legendas falsos no Sistema Guardião, utilizado para escutas judicialmente autorizadas; também omitiram declaração que deveria ser repassada ao MPF, colocando em seu lugar uma outra, ideologicamente falsa, que alterou a verdade sobre fato juridicamente relevante; por fim, o procedimento disciplinar interno da PF, que investigava o caso, foi arquivado, sob o argumento de que “o fato não configura evidente infração disciplinar ou ilícito penal”.

Para o MPF, “os denunciados valeram-se da estrutura policial para ocultar a prática de crimes por um de seus servidores. O fato do diálogo omitido nos relatórios de interceptação não conter, em si, caráter criminoso, não significa que sua omissão seria penalmente irrelevante”.

Em seu parecer, a Procuradoria Regional da República da 3ª Região, que oficia junto ao TRF3, afirma que o juízo federal de Dourados “adentrou no mérito das condutas dos acusados, o que não deve ocorrer na decisão de admissibilidade da acusação. A confirmação dos fatos, com a necessária individualização das condutas e eventual responsabilização penal, fica reservada para a fase do contraditório e ampla defesa”. Em outras palavras, a Justiça Federal de Dourados, ao analisar a admissibilidade da denúncia do MPF, praticamente julgou os acusados, isentando-os de qualquer culpa, e extinguindo a ação penal.

Referência processual na Justiça Federal de Dourados: 0002539-57.2017.4.03.6002

Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul

Arte: Secom/PGR

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