Quando a empatia é desmerecida, quem liga para os direitos humanos?

Camisetas e cartazes com discursos de ódio foram expostos para mostrar como a violência não tem lógica

Por Alana Portela, no Campo Grande News

Quando se naturaliza o ódio, quem se importa com os diretos humanos? No momento em que os discursos ofensivos parecem livres nas redes sociais e a liberdade de expressão se deturpa, o Conselho Regional de Psicologia da 14º região de Mato Grosso do Sul fala de Direitos Humanos. Encontro realizado ontem na Uniderp lembrou que em momentos de tensão e raiva, é interessante ter empatia.

No corredor para chegar ao auditório, os organizadores espalharam cartazes e deixaram camisetas à mostra. O que mais chamou atenção foram as frases expostas, discursos de fúria que hoje são fáceis de encontrar em qualquer rede social. O membro da comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, Gabriel Medina, diz que teve um período de ascensão que liberou a raiva das pessoas.

“Há uns três anos. Antes as pessoas estavam acanhadas, poderiam até pensar isso, mas não manifestavam. É como se abrisse a caixa de Pandora e os discursos saíssem. Todos os cartazes foram com frases que estão presentes nas redes sociais. Procuramos abordar um conjunto variado, desde questão indígena, mulher, racismo, LGBTfogia, etc. São 17 públicos que abordamos por conta do compromisso da psicologia em enfrentar um discurso de ódio e construir uma sociedade baseada na defesa dos diretos humanos e constitucionais que são fundamentais”, afirma.

Nos cartazes, frases como “Migrante ou é bandido ou estuprador”, “eles vieram para roubar nossos empregos”, “Bandido bom é bandido morto”, “se ela apanhou é porque mereceu”, “tem que prender vagabundo mesmo”, “índio é tudo preguiçoso”, “tinha que ser preto para fazer besteira mesmo”. 

Sobre Mato Grosso do Sul, Medina faz uma observação. “Falamos de um Estado onde o agronegócio tem uma forte influência e tem a segunda maior população indígena do país. Temos gente dizendo que precisa civilizar os indígenas, reintegrar como se não fizessem parte da sociedade. Mas, eles que são os povos originários do Brasil”, diz.

Para Vanessa Silva, psicóloga e índia terena, as dificuldades que os índios enfrentam ficam cada vez maiores. “Somos invisíveis. As questões que o governo vem implantando, trazendo retrocesso as questões indígenas, que nós conseguimos através de saúde e questões de terras. Temos que lutar para manter direitos e conseguir novos”.

Outra avaliação surge sobre um ponto muito atacado quando surge o conceito de direitos humanos: o sistema prisional. “Saiu um relatório mostrando que Mato Grosso do Sul desponta em população carcerária. Vivendo uma situação difícil porque as principais autoridades públicas têm se manifestado na contramão do que deveria ser política afirmação dos direitos, de paz”, destaca.

A presidente do Conselho Regional de Psicologia, Irma Macário percebe a realidade nacional como delicada. “Em função das políticas sociais, de preconceito. O sistema prisional é um grande gargalo para o país e é importante falar sobre isso em todos os círculos, nas universidades, comunidades. Os direitos humanos são de todos. Sabemos que eles podem ser violados a qualquer momento. Acho que a sociedade não tem compreensão que ela tem direito”.

Sistema prisional

O professor doutor no Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Roberto da Silva chegou em Campo Grande no começo do mês e visitou os internos dos presídios, conversou com professores e agentes. Ele coordena um grupo de pesquisa sobre educação em regime de privação e liberdade na USP.

“Viajo o País monitorando os trabalhos. Fiz várias visitas a MS, elaboração do plano estadual de educação e prisões. A conversa é como os conselhos profissionais podem ter uma atuação mais incisivas nas prisões brasileiras. Todos os estados têm orientações nacionais para educação e prisões, são obrigados a fazer esse plano que define as atribuições de cada instituição responsável, que determina a forma de trabalhar. A dificuldade no âmbito das secretarias, é ter quadros suficientes que organiza essa parte de educação e prisões”, diz.

Roberto diz que a educação é um direito fundamental de todos, inclusive daqueles que estão privados da liberdade. “A sentença de condenação não retira dele os direitos, que não seja o de ir e vir. Temos que nos preocupar com as autoridades, gestores são eles quem organiza as políticas para atender os presos”.

Para ele, o cenário nacional não é favorável a discutir os diretos humanos, muito menos para implantação de políticas. “Por conta do resultado das últimas eleições, que polarizou a sociedade e fez surgir diversos fantasmas que estavam ocultos. Esses discursos de ódio contra as minorias sociais acabam vitimando as organizações e os trabalhadores que atuam nessa área. O Brasil é o que mais assassina defensor de direitos humanos”, afirma.

Conforme Roberto, para fazer com que a população seja mais empática, é necessário continuar os debates. “Esse trabalho de envolver discussões nas universidades, com os profissionais, é de formiguinha”.

Camisetas com discursos de ódio foram expostas no local. Foto: Paulo Francis

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