Para ex-dirigentes do BNDES, relatório da PEC da Previdência é incompatível com investimento, emprego e crescimento, e pode acabar com banco de fomento
Por Redação RBA
São Paulo – A Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES) promoveu na manhã desta quarta-feira (19), no Rio de Janeiro, um ato em defesa do banco de fomento e um debate com a participação e apoios de vários ex-presidentes da instituição. Na mesa de discussão, comentaram a proposta do relator da reforma da Previdência na comissão especial da Câmara dos Deputados, Samuel Moreira (PSDB-SP), que excluiu a destinação para o BNDES de 40% dos recursos das contribuições sociais do PIS/Pasep como previsto pelo artigo 239 da Constituição. O relatório redireciona a previsão constitucional para pagamento de pensões e aposentadorias. O texto original do governo reduz o montante que cabe ao banco para 28%.
Participaram do debate quatro ex-presidentes do BNDES: Pio Borges (do governo Fernando Henrique Cardoso), Luciano Coutinho (Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), Paulo Rabello de Castro e Dyogo Oliveira (ambos no período Michel Temer). Enviaram manifestações de apoio ao ato os também ex-presidentes do banco Márcio Fortes e Andre Franco Montoro Filho (José Sarney), Andrea Calabi e Luiz Carlos Mendonça de Barros (FHC) e Carlos Lessa (Lula). “Com esta medida, querem romper definitivamente os compromissos que a Constituição de 1988 estabeleceu com o BNDES e o desenvolvimento nacional”, diz a AFBNDES.
Luciano Coutinho situa a política de enfraquecimento do BNDES no momento em que “o país vive um momento de cansaço, desencanto, (com) o quarto ano consecutivo de recessão, crescimento pífio e desemprego”. A iniciativa contra o banco surge num momento em que, mais do que nunca, o Brasil “anseia por desenvolvimento econômico”, disse. “Dispensar o papel de uma instituição como o BNDES e debilitar o principal esteio de seu funding (financiamento) significa frustrar a possibilidade de desenvolvimento do país”, acrescentou.
Coutinho afirmou não acreditar em outras alternativas para substituir o papel de fomento ao desenvolvimento a longo prazo desempenhado historicamente pelo BNDES. A começar do setor externo, que está comprometido. “Hoje, no comércio internacional, são mais nuvens obscuras do que céu de brigadeiro”, disse, exemplificando com a crise entre Estados Unidos e China. Segundo Coutinho, a recuperação da economia depende de um aumento consistente do investimento em infraestrutura, que hoje está entre 1% e 2% do PIB.
De acordo com estudo realizado pela consultoria McKinsey a pedido do BNDES e da Corporação Financeira Internacional (IFC, na sigla em inglês) do Banco Mundial, o país precisaria que o investimento em infraestrutura fosse 4,7% do PIB para alcançar a média mundial em 20 anos.
“A nossa presença é a mensagem”, resumiu o ex-presidente do banco Paulo Rabello de Castro. Segundo ele, um dos mitos em torno da instituição é o de que o BNDES “expulsa” o setor privado dos investimentos. “É um mito. Ele é hoje é um associado do setor privado. O que expulsa o desenvolvimento é o baixo crédito para o setor produtivo.” O economista pediu aos servidores ligados ao banco um corpo a corpo junto aos deputados em Brasília.
Em sua fala, Dyogo Oliveira disse que o convencimento dos deputados deve ser feito “de maneira clara e objetiva, e não como questão corporativa”. Sobre o relatório de Samuel Moreira, propôs “uma discussão para esclarecer, sem ideologia. Não adianta uma interlocução como defesa do BNDES. Isso não vai mobilizar mentes, no Congresso”. Ele exemplificou com um caso que a iniciativa privada não executaria sem financiamento: “Uma única linha de transmissão de Belo Monte custa 5 bilhões de reais.”
O BNDES financiou 61% do projeto de implantação de sistema de transmissão que irá conectar a Estação Conversora Xingu à Estação Conversora Terminal Rio para escoamento da energia gerada pela Usina Hidrelétrica Belo Monte. O valor total do projeto é de R$ 8,5 bilhões.
Para Oliveira, é preciso mostrar aos parlamentares, com dados técnicos, que se está tirando do país a capacidade de financiamento do desenvolvimento. “É mostrar o que gera investimentos, e que outros países não farão isso por nós. Ninguém vai financiar exportações para o Brasil. Se não tivermos a capacidade, ninguém vai financiar por nós. Isso tem que ser falado.” O economista defendeu mostrar a importância do papel do banco à população. “Temos que corrigir esse equivoco antes que seja perpetrado”, disse.
Em 2019, o PIS/PASEP representa 35,3 % do funding do BNDES. Em 30 anos de existência do FAT, foram desembolsados pelo banco mais de R$ 662 bilhões, atendendo a mais de um milhão de empresas, em 96% das cidades brasileiras (5.342 municípios). Tais recursos contribuíram para gerar e manter 10 milhões de empregos diretos e indiretos, de 1996 a 2017.
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Da esq. para dir.: Pio Borges, Luciano Coutinho, Rabello de Castro e Dyogo Oliveira no debate, Foto: RBA