Carta dos Atingidos e Atingidas da Amazônia

Da Cordilheira dos Andes à Mata Atlântica brasileira

Dos seringais nativos aos açaizais de várzea

Entre centenas de povos indígenas e quilombolas,

Do Rio Amazonas, entre as nascentes e a foz, furos, brejos e vilas

Da diversidade animal e vegetal à pesca ribeirinha

O garimpeiro tradicional e a agricultora familiar

Dos nove países aos nove estados brasileiros

Somos todos Amazônia

E se ela está em risco… Somos todos atingidos e atingidas!

No Mab

Nós, atingidos e atingidas dos nove estados da Amazônia brasileira, reunidos na Universidade Federal do Pará, em Belém, nos dias 29 e 30 de outubro, no Encontro Amazônia em Risco: Somos Todos Atingidos, analisamos e debatemos a questão da Amazônia e apontamos iniciativas comuns para defendê-la. A seguir, apresentamos as ideias centrais discutidas coletivamente:

1 – Vivemos em uma ordem mundial de profunda crise do sistema econômico vigente. Percebemos que o capitalismo, para ampliar seus lucros, busca apropriar-se dos bens naturais estratégicos, aumentar a exploração dos trabalhadores e retirar direitos historicamente conquistados pelos povos. Os ataques à Amazônia se inserem nesse contexto.

2 – A Amazônia está no centro de uma disputa dos interesses econômicos e políticos, dos setores dominantes locais, nacionais e internacionais. Entre os setores há os fazendeiros, madeireiros e empresários ligados ao agronegócio, que atearam fogo à floresta e pretendem ampliar a incorporação de novas áreas para a criação de gado, monocultivos, extração de madeira e mineração em áreas protegidas, unidades de conservação e territórios dos povos originários e tradicionais. Ha também interesse de grupos nacionais e internacionais, em especial do capital financeiro, que pretendem se apropriar da agua, da floresta, da biodiversidade, dos minérios, da energia e das terras. Em nome de um discurso de preservação e combate às mudanças climáticas, estes grupos buscam a privatização e a transformação do território Amazônico em mercadoria.

3 – Esses setores são responsáveis por um conjunto de práticas criminosas, que se expressam: nos grandes projetos de hidrelétricas, mineração; no avanço da soja e do gado e na violência no campo, na privatização da água e da floresta, no desmatamento e nas queimadas, na exploração sexual, na violência urbana e tráfico de drogas, no aumento da pobreza, violação dos direitos das populações atingidas, na criminalização e assassinatos de defensores\as de direitos humanos.

4 – A Amazônia historicamente sempre foi pensada pelas elites dominantes de fora e para seus interesses. Nunca se escutou o clamor dos seus povos, como denuncia o documento final do Sínodo da Amazônia.  Essa situação se agrava principalmente com a emergência de governos de extrema-direita que impõem um projeto de entreguísimo e destruição, como no caso brasileiro. O maior risco em curso à Amazônia vem da iniciativa desses governos de promover sua exploração de forma subordinada ao imperialismo estadunidense, sob um falso discurso de defesa do interesse nacional.

5 – Essa realidade revela que somos todos atingidos e atingidas. Enquanto denunciamos esse projeto do capital, reafirmamos que aqui há povos em luta e resistência, preocupados com o futuro da Amazônia, do Brasil e da humanidade. Nossa luta se dá nos territórios, no campo, nas florestas e nas cidades, com a consciência de que ela não se restringe ao local, mas está interligada com a luta de todos os povos do Brasil e do mundo que defendem nossa Casa Comum.

6 – Inspirados pela mensagem do Sínodo da Amazônia, nos identificamos e nos comprometemos a fortalecer a luta com alegria e esperança, assumindo em nossa prática os princípios da Ecologia Integral, o cuidado com a “casa comum” e a defesa da Amazônia.

7 – Para podermos enfrentar os desafios dos tempos que vivemos, entendemos que os povos da Amazônia não podem esperar nenhuma medida de defesa da Amazônia vinda das classes dominantes, porque seus projetos são de destruição, exploração e subordinação. A única alternativa possível é por meio da soberania popular. Assim, reafirmamos os seguintes compromissos:

  • A organização é nossa força e meio de luta. Por isso, é necessário dar um salto de qualidade em nossas organizações por meio do trabalho de base, da formação política, ampliando cada vez mais a participação das mulheres e da juventude.
  • Fortalecer a unidade entre as diferentes organizações comprometidas com esses princípios, estimulando iniciativas comuns de defesa da Amazônia e dos seus povos.
  • Elevar o grau de consciência por meio do conhecimento compartilhado e da valorização das experiências históricas de luta dos povos da Amazônia e suas organizações.
  • Construir pontos de unidade internacional com os povos da Amazônia dos países vizinhos, que compartilhem dos nossos princípios e desejos, são nossos irmãos e  irmãs,  independentes de fronteiras institucionais.
  • Lutar incessantemente contra todas as estruturas injustas, que oprimem e exploram os povos. Lutar em defesa da vida, por uma nova sociedade justa, de liberdade com igualdade.

Defender a Amazônia é defender a vida!

Água energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular

Belém, 30 de outubro de 2019

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