O Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil-MPP vem a publico manifestar seu repúdio frente ao maior desastre ambiental que vem ocorrendo no BRASIL. Além da violação cotidiana que sofremos em nossos territórios, estamos agora atingidos de morte, pelo derramamento de óleo (petróleo bruto) que ocorre em nosso litoral desde o fim do mês de agosto, provocando a morte de diversas espécies de pescado, animais e aves marinhas, além de ecossistemas inteiros.
Esses ecossistemas são vitais para a manutenção do nosso modo de vida, mas principalmente pela manutenção da vida nos oceanos e mares. Esse crime nos expõe a uma situação extrema de vulnerabilidade ambiental, social, econômica e cultural. Mais de 3mil km de costa já foram atingidos por esse derramamento, aproximadamente 300 comunidades tradicionais pesqueiras estão recebendo em suas portas a chegada incontrolável de óleo, e mais uma vez nos tornarmos uma grande zona de sacrifício invisível para a grande mídia e para o governo. Esse desastre ambiental reflete de forma muito contundente a opção do governo brasileiro de negligencia e sucateamento da questão ambiental.
A flexibilização da legislação, a retirada de servidores com expertise nessas áreas, a retirada de recurso impõe ao povo brasileiro uma série de violações socioambientais. Denunciamos a omissão do governo federal que permanece indiferente frente a essa tragédia. Apesar do Brasil possuir mecanismos legais que estabelece o que o que deve ser feito em termos de prevenção, controle e fiscalização de poluição causada por lançamento de óleos e outras substâncias em águas brasileiras, os mesmos só passaram a ser utilizados há pouco mais de uma semana. Enquanto isso a situação das comunidades foi se transformando num cemitérios de porções de óleo recolhidos pelos próprios pescadores e pescadoras artesanais.
Se o Plano Nacional de Contingência tivesse sido acionado quando ocorreram às aparições das primeiras manchas certamente o impacto teria sido menor, no entanto o mesmo passou a ser acionado muito recente, depois de forte incidência do Ministério Público Federal. Mesmo com as notícias de que o plano está em execução não dispomos de informações sobre os desdobramentos dessa ação. Repudiamos a falta de um processo transparente e participativo, que inclua as comunidades nos processos de tomadas de decisão. Repudiamos as falas irresponsáveis do ministro do Meio Ambiente, que tem atacado organizações da sociedade civil como responsáveis pelo desastre, assim como faz pronunciamentos públicos sem qualquer subsidio técnico, uma tentativa clara de esvaziar a responsabilidade que o estado tem para com essa situação, assim como ocorreu recentemente no caso da Amazônia. Inclusive em entrevista recente fora do Brasil, o presidente da república reconheceu que potencializou as queimadas ocorridas na Amazônia, mais uma vez demonstrando sua perspectiva clara de ataques aos povos indígenas e comunidades tradicionais. Repudiamos também as recentes declarações do secretário da Pesca do estado, que relativizou a possibilidade de contaminação dos pescados, alegando que esses animais são muito inteligentes e desviam de poças de óleo.
Esse é o triste retrato da gestão da pesca no Brasil que sem nenhuma responsabilidade técnica dispara informações pouco responsáveis para a sociedade. Essas declarações merecem ser apuradas com rigor. É inadmissível a ineficiência do Estado no não reconhecimento da dimensão e gravidade do problema, e principalmente na falta de transparência publica e celeridade em tomar medidas emergenciais para contenção dos impactos. Diante a falta de atuação do estado nós pescadores e pescadoras artesanais temos colocado nossa vida em risco numa tentativa desesperada de retirar o óleo de nossos locais de vida, das águas de onde vivemos e onde mantemos nossas famílias e alimentamos a sociedade brasileira com pescado saudável e de qualidade. Pesquisadores apontam que o óleo é toxico e cancerígeno, e já temos relatos de companheiros e companheiras que apresentaram problemas de saúde após o contato com o mesmo principalmente em Pernambuco. É necessário observar as recomendações na área da saúde que estão sendo realizadas e disponibilizadas por profissionais da área que tem muita experiência no tema e tem atuado com responsabilidade no sentido de informar a sociedade e, sobretudo aos pescadores e e pescadoras sobre os riscos para a saúde. Repudiamos a tentativa de “compensação” anunciada pelo secretário de pesca, que previa a liberação de uma parcela do seguro defeso. É uma medida ineficaz, desproporcional e ridícula diante de todas as perdas que estamos acumulando com esse desastre.
Esperamos que com a decisão de volta atrás dessa medida o governo brasileiro dialogue com as comunidades uma forma de compensação que seja proporcional aos danos causados e que ocorra um processo transparente e sem a intermediação de institutos ou fundações, mas que haja um dialogo direto com as comunidades para o encaminhamento das soluções. Sentimos profunda revolta, encontrarmos animais como tartarugas, golfinhos, peixes, caranguejos mortos cobertos de óleo. Nos causa dor ver nossos territórios sendo destruídos pela ganância de grandes projetos que nos causam morte há milhares de anos. Mas não nos calaremos diante de mais uma violência promovida pelo capital. Nós pescadores e pescadoras artesanais não iremos descansar enquanto nossas vidas estão ameaçadas e conclamamos a toda a sociedade a se juntar a nós nesse grito em defesa da vida nas águas.
No rio e no mar: Pescadores da Luta! Nos açudes e barragens: Pescando liberdade! Hidronegócio: Resistir! Cercas nas águas: Derrubar!
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Foto: Léo Malafaia /AFP /Folha de Pernambuco