Risco iminente – Coordenação de índios isolados deve ter experiência na área

INA

A Indigenistas Associados (INA), associação de servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai), vem a público através da carta Risco iminente – Coordenação de índios isolados deve ter experiência na área, de 3 de fevereiro de 2020, manifestar a profunda incompatibilidade técnica e o risco de danos irreparáveis em virtude de possível nomeação de um profissional com experiência missionária contrária aos objetivos da Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC) e da própria Funai, conforme noticiado nacional e internacionalmente desde o dia 31 de janeiro.

Leia a carta na íntegra:

NOTA PÚBLICA

Risco iminente

Coordenação de índios isolados deve ter experiência na área

A Indigenistas Associados (INA), associação de servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai), vem a público manifestar a profunda incompatibilidade técnica e o risco de danos irreparáveis em virtude de possível nomeação de um profissional com experiência missionária contrária aos objetivos da Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC) e da própria Funai, conforme noticiado nacional e internacionalmente desde o dia 31 de janeiro.

A CGIIRC é a responsável, na Funai, por coordenar as políticas e ações de proteção dos povos indígenas isolados e de recente contato, visando garantir o pleno exercício de sua liberdade e das suas atividades tradicionais sem a necessária obrigatoriedade de contatá-los. Os estudos de localização e monitoramento dos povos indígenas isolados seguem diretrizes específicas, respaldadas na Constituição Federal e na Política para Índios Isolados, em consonância com convenções e tratados internacionais. Segundo dados da Funai, há cerca de 107 registros da presença de índios isolados no Brasil. A Funai considera isolados “os grupos indígenas que não estabeleceram contato permanente com a população nacional, diferenciando-se dos povos indígenas que mantêm contato antigo e intenso com os não-índios”. Essa decisão autônoma de isolamento desses grupos é reconhecida e deve ser protegida.

Contraditoriamente, de acordo com as reportagens, Ricardo Lopes Dias atuou durante anos como missionário profissional da filial brasileira da ONG americana New Tribes Mission, que tem por objetivo, como descrito pelo próprio indicado em sua dissertação, “a plantação de uma igreja nativa autóctone em cada etnia”.

Embora tenha formação em antropologia e teologia, a experiência profissional do indicado se mostra contrária ao artigo 231 da Constituição, no qual “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. O projeto de plantar uma igreja em cada etnia é antagônico ao reconhecimento da diversidade de povos e culturas, quando se visa, de forma planejada e sistemática, alterar drasticamente tais culturas.

A incompatibilidade profissional é notória. Destituída de qualquer experiência na política indigenista, esta nova indicação na Funai configura mais um ato contra os direitos indígenas. O histórico profissional do indicado representa um duplo risco aos povos isolados e de recente contato – grupos de extrema vulnerabilidade física e social -, seja por sua completa inabilidade em tema altamente sensível e complexo, seja por sua ligação histórica com ONGs missionárias internacionais. É em função da extrema vulnerabilidade destes povos que o cargo em questão, até o momento, foi ocupado apenas por profissionais com experiência. Para povos indígenas isolados e de recente contato, amadorismos e experimentações como esta podem causar, rapidamente, danos irreparáveis, correndo-se riscos de genocídios e alterações traumáticas na organização social e cultural dos povos.

A Indigenistas Associados se soma ao grande conjunto de manifestações que ressaltam a incompatibilidade de nomeação de um profissional com  tal perfil de planejada ingerência religiosa ao cargo de coordenador da política para povos indígenas isolados e de recente contato. Reiteramos e apoiamos ainda a “Carta aberta dos servidores da Funai responsáveis pela política de povos indígenas isolados e de recente contato”. Essa carta ressalta que o proselitismo religioso e a atuação missionária, ao pertubar as práticas religiosas dos povos indígenas, se configuram como crimes aos costumesagravados quando em comunidades de Povos Indígenas Isolados ou de Recente Contato (art. 231 da CF/88 e art. 58 e 59 da Lei nº 6.0001/1973).

É necessário que o Ministério da Justiça e Segurança Pública avalie a incompatibilidade técnica e o risco às vidas indígenas acarretados por tal nomeação, cabendo ao Ministro Sérgio Moro não endossar práticas criminosas contra os povos indígenas no Brasil, aos quais cumpre proteger.

INDIGENISTAS ASSOCIADOS

03 de fevereiro de 2020.

Membros da tribo assistem o helicóptero passar. O grupo vive em uma região protegida nas nascentes dos rios Humaitá e Envira

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