Indígenas correm risco de genocídio por coronavírus

Especialistas alertam sobre falta de produtos de higiene nas comunidades e criticam falta de ações do governo

Por Redação RBA

A primeira indígena vítima do novo coronavírus foi confirmada no dia 1º deste mês. Para evitar um genocídio dos povos tradicionais, especialistas pedem uma atenção especial do Estado e alertam para a falta de produtos básicos nessas comunidades.

As primeiras suspeitas de infecção pelo novo coronavírus entre a população indígena aconteceram no dia 16 de março e, um dia depois, um decreto da Fundação Nacional do Índio (Funai) suspendeu por 30 dias as autorizações de entrada em terras indígenas em função da pandemia.

Apesar da medida de isolamento ser positiva, o Ministério Público Federal (MPF) fez um alerta e afirmou que os indígenas enfrentam um cenário de risco de genocídio. O antropólogo Gersem Baniwa, professor da Universidade Federal do Amazonas e conselheiro no Fundo Brasil de Direitos Humanos, explica que o isolamento deve ser tratado de maneira diferente para cada comunidade, já que há povos que vivem em centros urbanos e outros, mais afastados.

“Nas terras mais distantes, acho que a melhor estratégia seria mantê-los isolados, com o menor contato possível com o centro urbano, mantendo apenas os trânsitos essenciais, como o das equipes de saúde”, explicou, à jornalista Talita Galli, no programa Bom Para Todos, da TVT.

A superintendente do Fundo Brasil de Direitos Humanos, Ana Valéria Araújo, também reforça as diferenças das etnias, já que existem povos que moram em aldeias em que não é possível produzir alimentos, dependendo da cesta básica e do acesso ao mercado.

“Uma coisa é pensar as populações na Amazônia, que a gente precisa ter cuidado imenso de mantê-los afastados da doença e que podem ficar isolados porque sobrevivem da caça e da pesca. É muito diferente da situação das terras indígenas no restante do país, que estão mais próximas das cidades. Nesses casos, há a necessidade de isolamento, mas tem que se pensar em políticas para garantir o atendimento humanitário, a chegada de alimentos e de kits de higiene”, acrescentou Ana.

#FicaNaAldeia

O Instituto Socioambiental (ISA) lançou a campanha “Fica na Aldeia” para conscientizar os povos tradicionais. No site, há recomendações de como evitar o novo coronavírus, quais os sintomas e como é feita a transmissão.

“A experiência de indígenas e quilombolas no Brasil com epidemias é arrasadora. A história mostra que essas populações sofrem muito com as doenças transmitidas pelo contato com a sociedade nacional, tanto pela diferença do sistema de imunidade como pela dificuldade de acesso à saúde”, diz o comunicado do ISA.

Gersem afirma que as ações do governo voltadas à população indígena são tímidas e lideranças locais assumiram o compromisso da conscientização. “Os indígenas estão confinados do ponto de vista político. Falta muito material de higiene para eles. Isso seria fundamental nesse momento. A gente não vai conseguir isolar as aldeias sem conscientizá-los”, ponderou.

Mapeamento

O Instituto Socioambiental também lançou, na última sexta-feira (3), uma nova plataforma para monitorar o avanço da pandemia nas Terras Indígenas e municípios próximos a elas. O site “Covid-19 e os Povos Indígenas” reúne as principais bases de dados sobre a doença e a estrutura de saúde no Brasil.

A plataforma indica casos confirmados e mortes causadas pela Covid-19 em todo o Brasil, com destaque para os casos específicos nos povos indígenas. Além disso, também apresenta uma linha do tempo com o histórico de epidemias que atingiram as populações indígenas desde a invasão do Brasil pelos portugueses, em 1500. Por fim, reúne as notícias e uma lista de iniciativas de apoio às aldeias e comunidades quilombolas e ribeirinhas durante a pandemia.

“A expansão da Covid-19 apresenta desafios ao nosso sistema social e de saúde. Entre eles estão a garantia da segurança alimentar e proteção dos territórios, bem como a capacidade de prever e quantificar o aparecimento de novos casos devido a infecções comunitárias. Em decorrência da mobilidade dos povos indígenas nos municípios vizinhos e invasões de garimpeiros e madeireiros ilegais no interior desses territórios, é possível que vejamos um crescente número de infecções nas aldeias”, alerta Antonio Oviedo, pesquisador do ISA.

Salário mínimo

Nesta terça-feira (7), foi apresentado o Projeto de Lei (PL) 1142/20, que institui o auxílio emergencial aos povos indígenas no valor de um salário mínimo mensal por família, enquanto durar o estado de emergência decorrente da pandemia do novo coronavírus e as medidas restritivas de circulação no país.

A proposta foi feita pelos deputados Professora Rosa Neide (PT-MT), Célio Moura (PT-TO), José Ricardo (PT-AM), Joenia Wapichana (Rede-RR) e Airton Faleiro (PT-PA).

De acordo com o projeto, o auxílio poderá ser executado de forma descentralizada, sem a necessidade de inscrição das famílias em cadastros sociais anteriores. Pescadores, ribeirinhos, quilombolas e povos das florestas também poderão ser beneficiados.

Os parlamentares argumentam que os povos indígenas costumam ser esquecidos pelas políticas públicas. “Se as epidemias são horrendas para a sociedade em geral, para os indígenas o impacto tende a ser maior. O modo de vida, fundamentalmente comunitário que os caracteriza, pode facilitar uma rápida propagação do coronavírus caso não haja controle e medidas urgentes de prevenção, apoio e cuidado”, diz o projeto.

Assista à entrevista da TVT:

Nesta terça-feira (7), foi apresentado o Projeto de Lei (PL) 1142/20, que institui auxílio emergencial aos povos indígenas, no valor de um salário mínimo mensal por família – Victor Moriyama/ISA

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