Diante da dor dos outros, manipulação e gargalhada

Dia trágico tem recorde de mais de mil mortes por coronavírus. Mas Saúde tenta mudar de assunto, Secom comemora “placar de vidas” e Bolsonaro mistura deboche e fake news. Leia também: mais fardados no ‘Milistério’

por Maíra Mathias e Raquel Torres, em Outra Saúde

AS MIL MORTES

Mais de mil vidas perdidas. Ontem, pela primeira vez, o Brasil encabeçou a lista mundial de mortes por coronavírus em 24 horas. Não foi o único recorde trágico do dia: a marca também nos colocou no pequeno grupo de nações, composto por EUA, Reino Unido, França e China, que chegaram a registrar mil mortes diárias nessa pandemia. Segundo o Ministério da Saúde, entre segunda e terça-feira, foram contabilizados 1.179 óbitos. O saldo letal está em 17.971. No mesmo intervalo, também foi registrado um recorde de novos casos. Foram 17.408, num total que ultrapassa os 271 mil. Nesse ritmo, atingiremos as 300 mil infecções confirmadas por coronavírus na sexta-feira.  

Tudo isso não mereceu atenção do Ministério da Saúde. Na coletiva de imprensa diária, o governo escolheu dois destaques: o lançamento de uma campanha de doação de leite materno e de um serviço de teleatendimento psicológico para profissionais da saúde que atuam no combate à covid-19. Não houve comentários da pasta sobre o recorde de óbitos. Tampouco sobre protocolos de uso de medicamentos prestes a sair, como o da cloroquina. Desde que o general Eduardo Pazuello assumiu o Ministério, as coletivas têm sido povoadas por autoridades do segundo e terceiro escalões que não se sentem à vontade para responder às perguntas mais importantes sobre as ações do governo federal. Provavelmente porque faltam ações. Mas também porque falta respeito às instituições democráticas e à população.

Desde o começo dessa semana, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República dobrou aposta no contorcionismo narrativo. Num dia marcado por um número de mortes que superou aquelas causadas pelos deslizamentos e chuvas na região serrana do Rio de Janeiro, em 2011, quando 900 óbitos foram registrados, a Secom divulgou um “Placar da Vida”. Nele, os únicos números em destaque são o de “brasileiros salvos”, “em recuperação” e infectados. O Ministério da Saúde prontamente compartilhou a peça publicitária em suas redes. O tal placar começou a ser divulgado na segunda-feira (18). 

A distorção da realidade encontra seu maior mestre no presidente Jair Bolsonaro. Ontem, ele afirmou que em “poucos lugares faltaram respiradores ou leitos de UTIs” – assim mesmo, no passado, como se estivesse fazendo um balanço de uma situação já superada. E, claro, desprezando o colapso dos serviços de saúde em vários estados.

Bolsonaro também falou em “caixa-preta” sobre as mortes do coronavírus. Mas não porque haja mais mortes do que o registrado, como apontam toda a comunidade científica e vários gestores públicos. O presidente está interessado em disseminar o boato de adulteração em atestados de óbito. Sem provas consistentes, como de praxe. “Temos muito vídeo de famílias enlutadas, no cemitério, reclamando que no atestado de óbito o problema nunca foi esse e saiu com vírus. Por que se faz isso? Não quero responder aqui. Mas estamos tomando providências aqui para abrir essa caixa-preta que está acontecendo em alguns estados”, disse. 

Finalmente, Bolsonaro reclamou que “parece que no Brasil só tem gente com problema de vírus”. É claro que não. Mas é curioso perceber que, ontem, a covid se tornou a principal causa de mortes no país, superando o conjunto de todas as doenças cardiovasculares, como infartos e AVCs, que matam 980 brasileiros por dia; deixando para trás as mortes diárias por câncer (624) e aquelas por causas externas, como acidentes e violência (413). Os números, levantados pela Folha, se referem a dados de 2018, os mais recentes do DataSUS.

SOLUÇÕES FÁCEIS

O novo protocolo a respeito do uso da hidroxicloroquina, afinal, não saiu ontem; de acordo com Jair Bolsonaro, o general Pazuello vai assiná-lo hoje. No mesmo dia em que o Brasil registrou, pela primeira vez, mais de mil mortes em 24 horas, o presidente riu demais ao falar do medicamento: “Quem é de direita toma cloroquina, quem é de esquerda toma Tubaína“, disse numa entrevista em vídeo a Magno Martins, mal podendo conter suas gargalhadas.

Como lembramos aqui, a orientação no sentido de prescrever o remédio em casos leves vem dois meses depois de o governo federal pedir a expansão da produção pelos laboratórios das Forças Armadas. Ontem o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP) oficiou o Planalto cobrando os estudos científicos que embasaram esse pedido de ampliação.

Pois é. Sem ministro da Saúde, sem equipamentos suficientes, sem vergonha de fazer troça da tragédia e sem perspectiva de sair do buraco, o governo brasileiro escolhe se fiar em promessas de cura ainda pouco prováveis. Sabemos: estudos com vários medicamentos já existentes são bem vindos, dentro de protocolos de pesquisa estabelecidos. Anunciar o incerto como promessa é que são elas.

Ontem, pouco depois que boatos anunciaram sua iminente demissão, o ministro da Ciência e Tecnologia Marcos Pontes trouxe uma novidade sobre os ensaios da Pasta com a nitazoxanida (vermífugo comercializado como Annita) em pacientes com covid-19. Mas essa novidade não foi o resultado dos testes que vêm sendo conduzidos há um mês com 500 pacientes internados, e sim o fato de que agora outros 500 pacientes com sintomas leves também vão fazer parte do experimento.

Não ficou muito claraa metodologiade nenhum dos dois ensaios – no caso dos internados, Pontes explicou que eles recebem o vermífugo somado aos procedimentos hospitalares habituais, mas não mencionou se há um grupo de controle sem tomar Annita, para que depois os resultados sejam comparados apropriadamente. Nos casos leves, o protocolo foi ainda menos explicitado. O ‘astronauta’ afirmou que não é permitida a divulgação de resultados parciais e que não há previsão de conclusão. Há cerca de um mês, ele havia anunciado o início das pesquisas com imenso otimismo: “No máximo na metade de maio teremos uma solução de tratamento. Um remédio sem efeitos colaterais, (com estudo) desenvolvido pela pesquisa brasileira com todo o rigor científico”, afirmou então.

O MILISTÉRIO

Na mesma entrevista a Magno Martins em que disse os absurdos listados acima, o presidente Jair Bolsonaro elogiou o ministro interino da Saúde. “Por enquanto, deixa lá o general Pazuello. É um tremendo de um gestor“.

Pois ontem, o gestor em questão avançou mais casas na militarização do Ministério da Saúde. O general nomeou nove fardados para cargos estratégicos da pasta, como assessoria direta ao gabinete do ministro, Secretaria Executiva e Secretaria de Atenção Especializada em Saúde (que foi prometida ao Centrão). Além dos novos nomes, Pazuello remanejou Antônio Élcio Franco Filho, que é coronel, para ser seu braço direito na pasta. Ele é ex-secretário de saúde de Roraima – estado alinhado com o bolsonarismo e um dos primeiros a flexibilizar medidas de distanciamento social. 

Hoje, a Frente Nacional dos Prefeitos tem uma reunião virtual com Eduardo Pazuello às 11h. Em plena pandemia, a entidade passou quase dois meses sem ser recebida por um ministro da Saúde. Os prefeitos querem respostas do governo federal sobre habilitação dos leitos de UTI prometidos e também compra de equipamentos e testes de diagnóstico.

Falando em testes, o “tremendo gestor” Pazuello pode acabar assinando a compra de 22 milhões de exames com laboratórios que já sofreram até interdição da Anvisa por apresentarem “resultados insatisfatórios” em testes para detecção de outras doenças e distribuidoras sem histórico de contratos com o setor público. A negociação pode representar uma mordida de R$ 1 bilhão para o Tesouro – e acontecerá sem licitação. As informações são do Estadão, que teve acesso a documentos sobre o andamento da chamada pública, lançada em 20 de abril. 

MERGULHO NA CRISE – E ALÉM

Antecipamos nosso podcast semanal para mergulhar na crise instalada por Jair Bolsonaro no Ministério da Saúde. Convidamos a sanitarista Sonia Fleury para analisar os últimos acontecimentos, mas também ir além dos factoides e discutir os riscos para o SUS de uma autoridade sanitária nacional que não tem autoridade nenhuma em plena pandemia. Nessa entrevista, a pesquisadora da Fiocruz também falou sobre o futuro do Sistema Único, que ganhou apoio popular na crise, sobre as pressões que vem por aí por parte do setor privado, que viu no breve Nelson Teich suas aspirações de gerir o Ministério irem por água abaixo, e sobre o papel do Conselho Federal de Medicina, que se colocou a serviço da obsessão presidencial pela cloroquina com a liberação da prescrição para casos leves, mesmo admitindo que não há qualquer evidência científica a embasar a decisão. Está imperdível.

O PROBLEMA DAS MÁSCARAS

A Câmara aprovou ontem um projeto que obriga a população a usar máscaras em ruas, transportes públicos e prédios. Inicialmente o texto previa uma multa de R$ 300 para os não-mascarados, mas, por fim, os deputados federais determinaram que o valor vai ser definido por estados e municípios. Quem estiver trabalhando precisa receber a máscara do empregador; o projeto prevê ainda o fornecimento de máscaras a populações pobres e, onde isso não ocorrer, os que não tiverem dinheiro para comprar o equipamento não vão poder levar multa. Não há, no projeto, nenhuma especificação sobre como devem ser essas máscaras, mas uma emenda aprovada diz que podem ser industriais ou artesanais.

Desde que as autoridadesde alguns países – entre eles, o Brasil – começaram a orientar a população a usar máscaras, pipocam campanhas nas redes sociais informando o quanto isso protege quem usa e quem está ao redor, inclusive no caso de máscaras caseiras. Isso é preocupante, porque não é necessariamente verdadeiro.

Quando, no início do mês, a Royal Society de Londres publicou um relatório sugerindo que qualquer máscara, mesmo caseira, poderia contribuir para a redução da transmissão viral, foi um deus nos acuda na comunidade científica, com vários pesquisadores contestando o documento. Isso porque, apesar de essa ser uma das sociedades científicas mais antigas e respeitadas do mundo, o próprio relatório reconhecia não haver evidências suficientes sobre a questão. Trocando em miúdos: como não havia evidências de que as máscaras protegiam nem de que faziam mal, o documento sugeria o uso ampliado, por precaução – o que não é lá muito científico, daí as críticas.

Pouco depois, saiu um estudo (já revisado por pares e publicado na revista da American Chemical Society) comparando máscaras caseiras feitas com tecidos diferentes. A pesquisa não avaliou exatamente a capacidade de diminuir a contaminação, mas o quanto os tecidos conseguiam bloquear a passagem de partículas de tamanho parecido ao das nossas gotículas respiratórias. E descobriu que esse bloqueio variava imensamente, entre 10% e 60%. Alguns materiais, como duas camadas de algodão 600 fios, protegiam bem. Outros, como o algodão 80 fios, não protegiam praticamente nada.

Se o problema fosse só escolher o melhor tecido, até que não seria difícil oferecer alguma segurança. Porém… Quando há espaços entre a pele e a máscara, as gotículas passam mais e a proteção pode cair até 70%. E o pior é que sempre há espaços nas máscaras caseiras. Às vezes são maiores, às vezes menores, mas eles estão lá. O podcast Luz no fim da quarentena, da Piauí, fez recentemente dois programas discutindo essa questão. Em um deles, o biólogo Fernando Reinach explica um jeito fácil de perceber essa folga: é quando os óculos embaçam, o que basicamente acontece com todo mundo que usa óculos. Isso não quer dizer que as máscaras não ajudem nada a proteger, diz ele. Provavelmente, ajudam.

Só que não são elas que vão acabar com a pandemia se for todo mundo pra rua. Muito menos se forem usadas de forma incorreta, deixando o nariz de fora ou sendo retiradas o tempo todo, como se vê por aí.

OMS: RISCO DE ENFRAQUECIMENTO

Chegou ao fim a Assembleia Mundial de Saúde, que esse ano foi virtual e praticamente toda dedicada ao enfrentamento da pandemia. A resolução final aprovada pelos 194 Estados-membros apoia a possibilidade de quebra de patentes de futuras vacinas ou tratamentos contra a covid-19. Como já era esperado, os Estados Unidos foram contra. Não chegaram a bloquear a medida, mas emitiram um comunicado à parte afirmando rejeitar não só isso, mas as partes do texto que tratam do acesso à saúde sexual e reprodutiva durante a pandemia. Para o governo Trump, esses são termos… indesejados.

Também se confirmou a aprovação de uma investigação “independente e imparcial” sobre a resposta global à pandemia. Os pesquisadores Matheus Falcão e Clara Alves Silva acompanharam as reuniões e escreveram no Outra Saúde uma análise do encontro e das forças políticas em jogo. Contam como se desenha um “enfraquecimento da OMS” que tem duas faces: financiamento e governança. Na primeira delas, temos a ameça de suspensão permanente do repasse de verbas dos Estados Unidos. Na segunda, há interesses privados que podem minar o papel da OMS na governança global em saúde, garantindo mais espaço para o setor privado.

MORDE E ASSOPRA

Donald Trump disse mais uma vez que estuda vetar voos do Brasil para os Estados Unidos. “Não quero pessoas infectando nosso povo“, afirmou. Mas declarou também que está “ajudando o Brasil com respiradores” (como? quando? não sabemos…). Pouco depois, a embaixada americana em Brasília anunciou o repasse de US$ 3 milhões (R$ 17 milhões) para o combate à pandemia aqui. Não tem nada a ver com respiradores. Segundo a embaixada, a verba seria para “melhoria do rastreamento de casos, no controle de surtos e no fornecimento de dados para uma reabertura segura”.

POR TODA A PARTE

Em em seis países ou regiões asiáticas (Hong Kong, Japão, Cingapura, Taiwan, Tailândia e Vietnã), quase metade dos primeiros casos de transmissões locais do novo coronavírus aconteceu nos locais de trabalho. A conclusão é de um estudo da Escola de Saúde Pública T.H. Chan da Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Os pesquisadores queriam identificar as principais profissões mais vulneráveis às transmissões e viram que, nos dez primeiros dias de contágio, trabalhadores da saúde não foram os mais expostos a risco. Em vez disso, taxistas, vendedores de lojas e guias turísticos foram os que mais tiveram chances de contaminação – e também os que mais passaram o vírus adiante, para suas famílias e círculos sociais. A pesquisa deixa claro como é importante ter uma vigilância eficaz nos locais de trabalho, agora quando vários países começam a planejar suas reaberturas.

Outro estudo que vai nesse sentido reconstituiu nos mínimos detalhes o que aconteceu em uma empresa alemã que teve 16 infectados, mas controlou o surto a tempo. Esse controle só foi possível porque a ‘paciente zero’ da empresa foi identificada rapidamente, assim como seus contatos. O mesmo aconteceu com todos os funcionários que foram sendo identificados em seguida. O estudo mostra a importância de diagnosticar os casos logo, mas não apenas isso: quando se identifica um surto, o rastreamento e testagem de todos os contatos dos contaminados é essencial para que o vírus não continue se espalhando, mesmo a partir de pessoas assintomáticas. E os cientistas usaram o sequenciamento genético do vírus para refazer todos os seus caminhos, mostrando como ele passeia pelos lugares mais inocentes: “Estabelecer o contágio entre o paciente 4 e o 5 foi mais complicado. Não tinham estado juntos em reuniões ou em qualquer outro contexto. Exceto uma vez. Foi na cantina da empresa. Estavam sentados de costas um para o outro. O número 5 se girou e pediu o saleiro ao número 4. Isso foi dois dias antes de o paciente 4 desenvolver os sintomas”, conta a matéria do El País.

ELEIÇÕES PARA DEPOIS

O Congresso Nacional vai criar um grupo de trabalho para discutir o adiamento das eleições municipais em razão do coronavírus. A ideia já vinha sendo discutida entre os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP); do Supremo, Dias Toffoli; e o ministro do STF Luis Roberto Barroso, que assumirá o comando do Tribunal Superior Eleitoral no dia 25. Embora adiado, o pleito deve ocorrer em 2020 para evitar a prorrogação dos mandatos de prefeitos e vereadores. 

Uma das propostas prevê adiar o primeiro turno das eleições, marcado para 4 de outubro, para o dia 15 de novembro, deixando a segunda rodada – hoje prevista para 25 de outubro – para o início de dezembro. “Até recentemente, o Congresso resistia a tratar do tema, mas, com o avanço da pandemia, o cumprimento do calendário eleitoral – que exige convenções partidárias para a apresentação das candidaturas – ficou apertado”, relata a reportagem do Estadão. Já segundo Rodrigo Maia, há “quase unanimidade” entre os líderes partidários. 

A mudança só pode ser feita por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que exige apoio de pelo menos três quintos dos deputados e dos senadores, em dois turnos de votação na Câmara e no Senado.

ENEM E VESTIBULARES TAMBÉM

Ontem, o Senado aprovou por 75 votos o adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e dos vestibulares. O único contrário à proposta foi o filho 01, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). O projeto de lei prevê que todos os processos seletivos de acesso à educação superior sejam prorrogados automaticamente até o momento em que estejam concluídas as atividades do ano letivo no ensino médio em todo o país. Dessa forma, o PL não chega a estabelecer uma nova data para o Enem. A proposta precisa ser aprovada pela Câmara – o que possivelmente vai acontecer – antes de ir à sanção presidencial.

Diante disso, o ministro da Educação Abraham Weintraub, anunciou em uma transmissão ao vivo que pretende abrir uma consulta pública sobre o adiamento do Enem. A votação aconteceria no fim de junho e seria feita aos candidatos inscritos no Exame.

AINDA O REAJUSTE

Até hoje não se resolveu nada sobre o veto de bolsonaro à possibilidade de reajuste para determinadas categorias de servidores públicos – uma exigência de Paulo Guedes para que estados recebam o socorro financeiro da União. Bolsonaro já disse que veta, depois que não veta, depois que veta, mas não tem nada certo. Partindo do pressuposto de que o veto vai acontecer, a equipe econômica quer que isso se dê em um cenário favorável no Congresso, para de fato ser mantido. Para isso, pretende que governadores pressionem os parlamentares para desistirem de blindar categorias. Segundo a Folha, os prefeitos já estão dentro: a Frente Nacional dos Prefeitos e a Confederação Nacional dos Municípios já decidiram apoiar o congelamento salarial a todos servidores públicos, sem as exceções criadas no Congresso. Querem, é claro, acelerar a assinatura do projeto que libera as verbas.

MAIS VERDE, MAIS AMARELA

Depois que a MP do programa Verde Amarelo (focado em ‘facilitar’ a contratação de jovens afrouxando seus direitos trabalhistas) caducou antes de ser aprovada pelo Congresso, a equipe de Paulo Guedes está preparando um novo modelo. Segundo o Estadão, deve haver uma “carteira verde amarela  mais robusta”. O novo programa provavelmente vai ter um formato diferente e não necessariamente focado em faixas etárias, mas ainda não há detalhes. Em videoconferência fechada com cerca de 30 empresários ontem, Guedes disse que a MP anterior estava muito frágil e que seria preciso “menos sindicato e legislação trabalhista mais simplificada”. Agora, a ideia, ao que parece, é desonerar bastante as empresas que façam contratos simplificados.

QUARENTENA NOS PRESÍDIOS

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, ligado ao Ministério da Justiça, publicou ontem diretrizes para o combate à covid-19 em presídios. Vieram bem tarde. O Conselho recomenda isolar novos presos por 14 dias em locais destinados só para isso; instalar estruturas de saúde temporárias para atendimento de casos leves; ter estruturas para isolar detentos dos grupos considerados de risco, como idosos e pessoas com comorbidades. Ficou vedado o uso de contêineres ou similares para isolar detentos.

CINCO MILHÕES EM FAVELAS

Ontem, o IBGE divulgou um importante levantamento sobre a situação de moradia dos brasileiros. Segundo o Instituto, existem 5,1 milhões de domicílios localizados em “aglomerados subnormais”. O conceito se refere a moradias irregulares ou em condições precárias, como favelas e palafitas. E tudo isso tem relação com o espalhamento do novo coronavírus. Cruzando os dados, dá para ver que os estados com mais moradias precárias são praticamente os mesmos que registraram muitos casos da covid-19 e colapso nos serviços de saúde. No Amazonas, 34,6% dos domicílios está nesses “aglomerados”. Na sequência, vêm Espírito Santo (26,1%), Amapá (21,6%), Pará (19,7%), Rio de Janeiro (12,6%), Bahia (10,6%), Pernambuco (10,5%), Ceará (9,2%), Acre (8,5%) e Maranhão (7,8%). Entre as cidades com mais de 750 mil habitantes, Manaus e Belém lideram o ranking da precariedade – com, respectivamente, 53% e 55% de domicílios vulneráveis – e também são exemplos de capitais onde a pandemia atacou forte.

O IBGE destaca também uma boa notícia: aproximadamente 75% dessas moradias estão a dois quilômetros de uma unidade básica de saúde. Provavelmente, boa parte dessa população é acompanhada por equipes de saúde. Um viva para o SUS. 

MAIS PROBLEMAS

O estudo nacional que pretende estimar a quantidade de pessoas infectadas pelo novo coronavírus no Brasil enfrenta mais problemas. Falamos por aqui que alguns entrevistadores foram agredidos e até detidos pela polícia. Pois ontem surgiu uma informação que não ajuda: três deles estavam infectados no momento das entrevistas. A descoberta foi feita pela prefeitura de Irecê, na Bahia, que exigiu que os 14 entrevistadores enviados de São Paulo para o município fizessem o teste. A cidade também reclama que não tinha sido informada sobre a pesquisa – e foi uma das que mandou os entrevistadores para a delegacia. O imbróglio, junto com o resultado dos testes, fez com que Irecê decidisse não participar do estudo.

De sua parte, a Universidade Federal de Pelotas, que coordena o levantamento, garante que todas as autoridades municipais e estaduais foram comunicadas. Além disso, informou que todos os entrevistadores – cerca de dois mil, vinculados ao Ibope – foram testados para covid-19 antes de ir a campo. Os entrevistadores em questão, designados para Irecê, passaram por testes rápidos no dia 7 de maio, uma semana antes de viajarem para a cidade. O resultado deu negativo. Mas sabemos que os testes rápidos têm um atraso entre a infecção e a detecção do vírus, pois identificam anticorpos produzidos alguns dias depois de o patógeno se instalar no organismo. “É claro que pode acontecer de, em meio a um número grande de entrevistadores, alguns serem contaminados”, reconheceu a coordenadora da pesquisa, Mariângela Freitas da Silveira, em entrevista à Folha

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