Por Jeffer Castelo Branco e Marcio Antonio Mariano da Silva*
Está em curso um projeto que pretende à instalação de um mega incinerador na cidade de Santos – SP sofisticamente denominado URE Valoriza Santos (Unidade de Recuperação de Energia). Na verdade, além de não valorizar a cidade de Santos, pelo contrário, desvaloriza. Outra contradição grave é que ele não recupera energia, na verdade queima recursos da Prefeitura e causa um ônus elevado aos contribuintes da cidade.
O projeto vai contra os princípios e diretrizes da política nacional de resíduos sólidos, em relação ao meio ambiente e à saúde pública. A queima de resíduos não é o melhor modo de prevenção; ao contrário, transforma 70% do lixo, que em aterros possui um risco controlado e relativamente contido, em emissões reais de gases tóxicos e de efeito estufa, além de gerar 30% de resíduos perigosos (cinzas) que irão requerer um aterro para resíduos perigosos classe 1.
A iniciativa não está considerando variáveis intrínsecas ao processo, de ordem ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública, pois, além de se tratar de um processo antigo, que encontra resistência no Brasil e em quase todo mundo que toma conhecimento dos seus riscos, não leva em consideração o lado socioeconômico e cultural da região, que inclui os processos de reciclagem e os trabalhadores, por conseguinte, suas famílias, que vivem da coleta de lixo/resíduos na região.
O processo de incineração pode ser considerada uma das ações antrópicas mais insustentáveis do antropoceno, indo totalmente contra o desenvolvimento sustentável. De um lado, a análise sob o enfoque da prevenção condena a incineração e de outro lado, a análise sob o enfoque da precaução, opta pela não implantação do incinerador (URE Valoriza Santos), devido às diversas incógnitas científicas que cercam este processo.
O projeto não é ecoeficiente, não atende ao balanço custo benefício para os contribuintes, não satisfaz as necessidades humanas e reduz a qualidade de vida. Também não reduz impactos, ao contrário, acelera e aumenta a quantidade das emissões atmosférica nocivas, além de consumir violentamente recursos naturais que são primordiais à manutenção da vida humana e da biota na região de influência do incinerador URE Valoriza Santos. Desta forma, o projeto que leva em seu nome algo que remeta à “valorização da cidade” pode, ao contrário, acarretar a sua desvalorização.
O processo representa uma não cooperação entre o setor público e os segmentos da sociedade afins, o que contraria a lei nacional de resíduos, uma vez que incide direta e negativamente na economia destes seguimentos, sendo uma via não responsável para um ciclo de vida sustentável dos produtos.
O projeto não reconhece o resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania, o que de certa forma é um desrespeito à diversidade local e regional.
O EIV antes do debate público (audiências públicas), em tempo de pandemia, pode se configurar na redução e/ou cerceamento do direito da sociedade à informação e ao controle social de forma ampla e irrestrita. Sendo importante considerar que o acesso às tecnologias para participar de reuniões virtuais não é de domínio ou possibilidade de toda a população.
A incineração não representa a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, não contribui com a não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos. Ao contrário, ela incentiva a produção desenfreada de resíduos sólidos urbanos e o descarte contínuo de resíduos perigosos que o processo produz.
O processo não significa a redução do volume e da periculosidade dos resíduos, muito pelo contrário, representa o aumento geométrico da tonelada métrica, representado pela emissão de gases poluentes tóxicos e de efeito estufa. Além de transformar uma massa de resíduo sólido urbano e doméstico classe III (inerte) em uma massa de resíduo perigoso classe I (perigoso).
Portanto, o incinerador URE Valoriza Santos não representa a adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais, tampouco é estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços.
Sendo assim, resta claro que o projeto age ao arrepio da Lei Federal nº 12.305 de 2010 em sua totalidade. Pois, além da insustentabilidade ambiental, social e econômica do projeto, o incinerador URE afasta o poder público das políticas de incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matérias-primas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados; descarta a prioridade, nas aquisições e contratações governamentais, de produtos reciclados e recicláveis, bem como desestrutura a integração dos catadores de materiais reusáveis, reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
Posto, isso entendemos que o projeto, além de se configurar um pesado impacto negativo de vizinhança, impacta os esforços locais, regionais e mundiais de desenvolvimento sustentável, ofende vários dispositivos previstos nos objetivos de desenvolvimento sustentável e contraria a Convenção de Estocolmo assinada pelo Brasil. A Convenção de Estocolmo coloca os incineradores de resíduos, incluindo co-incineradores de resíduos urbanos, como é o caso da URE Valoriza Santos, na categoria de fontes industriais que têm o potencial de formação e liberação comparativamente altas da molécula da morte às dioxinas, além dos dibenzofuranos policlorados, hexaclorobenzeno e bifenilas policloradas.
Neste sentido se faz necessário a mobilização social do povo Santista, no sentido de garantir a proteção ambiental, saúde pública e coletiva e a proteção social, inclusive das economias adjacentes.
Para mais informações, acesse:
https://acpo.org.br/nossa-luta/campanhas/incineracao/
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Referências
BRASIL, Presidência da República. Política Nacional de Resíduos Sólidos. Brasília, 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em: jun. 2020.
ENERGIA SPE. Estudo de Análise de Risco: EIV URE Valoriza. AMrisk Consultoria e Engenharia de Risco. SGW Services Engenharia Ambiental Ltda. Santos/SP, abr. 2020 Disponível em: <https://www.
santos.sp.gov.br/static/files_www/files/portal_files/site/ear_valoriza_1.pdf>. Acesso jun. 2020.
SÃO PAULO, AGEM/Condesb. Plano Regional de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos da Baixada Santista PRGIRS/BS. Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de SP (IPT). São Paulo, 2018.
*Diretores da ACPO – Associação de Combate aos Poluentes
Muito esclarecedor o texto, grato. Eu, na condição de leigo quanto aos aspectos técnicos, porém catedrático “nas voltas que o mundo dá” acrescento que incorretos ainda no risco de no os colocar novamente como subalternos dos impérios de prestadores de serviço quando esses alcançam o monopólio do mercado, em um primeiro momento a novidade quase sempre se mostra a alternativa mais atraente ,economicamente falando, mas uma vez como posseira do destino único dos descartes, não se enganem, os “aditivos contratuais” os “reequilibrios financeiros” vão dar o ar da graça ou melhor da desgraça.
Somos a ONG Ambiental ECOPHALT com sede em Praia Grande…próximo a Santos.
SOMOS CONTRA A INCINERAÇÃO!
Assinem nossa petição :
http://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR116364
Ou acessem nosso site:
http://www.projetoecophalt. org
Face:
Movimento contra incineração e pirolise.
A solução certa é BIODOGESTAO, Compostagem, Reciclagem e a Coleta Seletiva!
A baixada santista é sempre o alvo da destruição ambiental, a cava sub aquática, a transposição do Rio Itapanhau, a termoelétrica em Peruíbe e agora um mega incinerador, obras que só reforçam a falta de compromisso e respeito com o povo e o ambiente que vivemos