O Horror. Por Alceu Castilho

Alceu Castilho

Essa foto é da Exposição de Roupas Utilizadas na Posse Presidencial por Jair Bolsonaro, presidente da República, e Michelle Bolsonaro.

Imediatamente me lembrei de Fellini, no quanto o filme “Amarcord” terá dito sobre a cafonice embutida no fascismo — com todo o respeito aos cafonas originais. A cafonice como linguagem, como política, mas uma cafonice capturada, falsa.

E não é que o universo Fellini sempre nos oferece algum outro olhar essencial? De “Amarcord” passei para “Roma”, com seu desfile de moda eclesiástica. (Guardadas as proporções. Bolsonaro se encarrega de desidratar qualquer coisa parecida com pompa.)

E de “Roma de Fellini” fiquei a pensar no que seria uma “Brasília de Bolsonaro”, aquela cidade esvaziada de seus mínimos esboços de civilidade, a arquitetura de Niemeyer implodida, incendiada e pisoteada — como se o ar respirado por Bolsonaro pudesse contaminar o que restasse de algum afresco. Motoqueiros girando com suas Harley Davidson em torno de uma ema, Anna Magnani a correr na Esplanada dos Ministérios (sei que já estou misturando os filmes e cineastas) e sendo fuzilada, enquanto os quatro filhos do presidente correm de sunga pelo Eixão.

O horror, o horror, o horror. Mas o horror contemplado, percebido pelo ogro e pela ogra como a Sétima Maravilha da Natureza. Um terno (o paradoxal terno de um ser artisticamente violento), um vestido, um cheque, ah, é mesmo, não foi exposto nenhum cheque ali, um vestido branco, noites não exatamente brancas, uma atmosfera às avessas a contaminar Brasília, um pesadelo, ensaio sobre uma cegueira especifica, a kriptonita a extrair não as últimas energias de cada cidadão, mas a última capacidade estética.

Os sapatos de Michelle, as mãos gigantescas de Michelle a aplaudir a cena, as mãos envergonhadas de Bolsonaro — são mãos burras, vocês percebem, elas falam de uma maneira burra — quase a simbolizar este grande haraquiri, aquela espécie de país que, um dia, tivemos aqui.

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