Ministério Público ouve comunidade de Genipapo, Saúde-Bahia, impactada pela mineração na Serra da Santa Cruz

Por Maria Aparecida de Jesus Silva, da CPT CN Diocese de Bonfim-BA

Na manhã dessa sexta-feira (26), o Ministério Público, representado pela promotora de justiça Drª Milena Moreschi, promoveu uma reunião virtual, com o objetivo de ouvir a comunidade de Genipapo, socioambientalmente impactada pela atividade de mineração na Serra da Santa Cruz.

Durante a reunião, moradores\as, relataram os danos provocados pela mineradora ZLF BRASIL QUARTZO MINERAÇÃO LTDA não só à comunidade de Genipapo e circuvizinhança, mas, à toda  sociedade, dada a importância da Serra para a produção de água – pois faz parte da Serra da Jacobina, Caixa d’água da Bacia do Itapicuru, bem como, para a preservação da fauna e da flora, de memórias ancestrais, símbolos, práticas e costumes que atravessam gerações.

Além das formas de uso e costumes que configuram as territorialidades do lugar, a comunidade demonstra forte sentimento de pertença à Serra da Santa Cruz, conforme pode ser observado na fala de um morador: “Nasci aqui e já levei meus alunos muitas vezes para visitar as pinturas rupestres.  A história dessa serra se confunde a nossa história, estamos intrinsecamente ligados a ela, é uma questão de pertencimento para o nosso povo, e, nossa serra ser explorada dessa forma criminosa, nos machuca muito. Plantamos ao pé dessa serra, contemplamos, desde nossos avós… para nós, é muito maior do que desmatar a mata, devastar a serra… é questão de pertencimento. Estão tirando um símbolo de nossa fé, estão tirando o cartão postal da nossa comunidade…”. Afirmou Oton Andrade.

Por tudo isso, a Serra é considerada um lugar sagrado para a comunidade, patrimônio natural, histórico e cultural de valor  imensurável do ponto de vista material e simbólico. Neste sentido, um jovem da comunidade afirma que “a Serra da Santa cruz sempre foi um lugar sagrado para a gente do Genipapo, mas não só, também para as comunidades vizinhas e visitantes”. Lá é um local de peregrinação religiosa, tem uma capelinha construída há quase um século, onde as pessoas devotas expressam sua fé. No local são encontradas pinturas rupestres, cerâmicas, dos povos originários payayá. A Serra sempre foi um verdadeiro refúgio para os amantes da natureza, com vistas maravilhosas…”.

Como já mencionado, moradores\as e pessoas de localidades próximas ao Genipapo, tradicionalmente, fazem peregrinações na Serra da Santa Cruz, sobretudo no período da Semana Santa, na Sexta Feira da Paixão, quando os\as devotos\as sobem o monte para fazer suas orações, como é de costume em muitas localidades da região. Este ano, a peregrinação na Serra da Santa Cruz vai ser diferente, não só por conta das medidas de prevenção ao novo corona vírus, mas, porque, a Serra não é mais a mesma. Para uma moradora “ foi tirada a alegria da serra, deixando nela uma ferida enorme. A destruição que foi feita não tem como recuperar com a exploração, o caminho que dá acesso ao cruzeiro ficou muito estreito, dificultando o acesso”, relatou emocionada.

Estes relatos, nos aproximam minimamente da dolorosa realidade vivida pelas famílias do  Genipapo de Saúde, que “da noite para o dia”,  viram sua Serra da Santa Cruz desmoronar e junto com ela os seus direitos, violados tanto pela mineradora, quanto pelo Estado, considerando que, além da destruição visível a olho nu, não houve consulta à população local sobre a instalação do empreendimento, os poderes públicos não parecem empenhados em cumprir sua função de fiscalizar, ao contrário, aliam-se as empresas. Exemplo concreto, é o fato de o poder público do município de Caldeirão Grande, em 05 de outubro de 2019, ter concedido licença expedida pelo Secretário Municipal de Meio Ambiente e pelo Prefeito Municipal, à empresa ZLF BRASIL QUARTZO MINERAÇÃO LTDA.

“O município de Caldeirão Grande, deu uma licença mesmo sem ter secretaria com competência legal para isso. O empreendimento atinge dois municípios, quando neste caso a competência legal é do INEMA – Instituto do Meio Ambiente. Além disto, o processo de licenciamento é cheio de falhas legais”, afirmou Almacks Luis, agente da CPT Ampliada CN, Diocese de Bonfim.

Durante toda a reunião, os\as participantes estiveram emocionados, demonstraram seus sentimentos de tristeza, indignação e preocupação com a situação da Serra da Santa Cruz e das pessoas que dela necessitam para viver, emitindo um grito de socorro. Ao final, manifestaram a alegria de serem ouvidos pela promotora de justiça, que se comprometeu em realizar uma visita in loco.

Imagem: Serra de Saúde – foto: Thomas Bauer

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