por Raquel Torres, em Outra Saúde
CORONAVAC E IDOSOS
Um estudo preliminar conduzido em São Paulo aponta que o desempenho da CoronaVac cai com a idade. No geral, a efetividade observada para maiores de 70 anos foi de 42%, mas esse percentual variou bastante: 61,8% em pessoas entre 70 e 74 anos; 48,9% entre 75 a 79 anos; e apenas 28% em maiores de 80 anos. Outra constatação foi a de que o imunizante não conferiu proteção após a primeira dose, sendo necessários 14 dias após o reforço para esses valores serem observados.
Foram analisados os dados de 15,9 mil idosos com mais de 70 anos vacinados no estado de São Paulo entre janeiro e abril, quando já predominava a variante P.1. Os valores encontrados para maiores de 75 anos estão abaixo da eficácia constatada nos ensaios clínicos de fase 3, que foi de 50,7%. No entanto, apenas 5% dos participantes desses ensaios tinham mais de 60 anos. Quando a Anvisa concedeu aprovação emergencial para o uso do imunziante, ressaltou que os dados disponíveis eram insuficientes para “determinar um perfil de eficácia e segurança da vacina” para idosos.
Segundo os autores, “esse fenômeno [redução da efetividade entre pessoas mais velhas] ocorre na vacina influenza e é esperado que ocorra em outras vacinas”. É importante sublinhar, porém, que os números tratam apenas da proteção contra covid-19 sintomática. Análises para calcular o impacto na redução de hospitalizações e mortes ainda estão em curso, e de fato a proporção de idosos mortos no Brasil por covid-19 caiu desde o começo da vacinação. Recentemente, o Chile divulgou seus dados de “vida real” com a CoronaVac e eles mostraram uma proteção de 80% contra mortes. Porém, os resultados não estavam divididos por faixa etária, e é possível que exista uma distribução desigual.
O trabalho tem financiamento da Opas (a Organização Pan-Americana da Saúde) e foi realizado pelo grupo Vaccine Effectiveness in Brazil Against Covid-19 (Vebra Covid-19), que envolve pesquisadores da Fiocruz, Incor, UnB e outras instituições nacionais e internacionais. Embora ainda não tenha sido publicado em revista científica nem passado por revisão de pares, a pesquisa chamou a atenção de especialistas sobre a possível necessidade de reforçar em breve a vacinação dos idosos no Brasil. “Teremos que, muito provavelmente, discutir com os dados de hospitalização e óbitos se devemos ou não priorizar esse grupo para revacinação quando isso [queda da efetividade] começar a acontecer”, diz no G1 o infectologista Julio Croda, pesquisador da Fiocruz e um dos autores.
Nesse sentido, é importante começar a testar o que acontece quando se aplica um reforço das vacinas de Pfizer ou de Oxford/AstraZeneca após a CoronaVac. Mas a dificuldade maior não é essa: é que faltam vacinas. Se a necessidade de revacinação desse grupo se confirmar, o país vai estar diante de escolhas difíceis e enormes desafios logísticos, políticos e de comunicação.
A repórter Fabriana Cambricoli, do Estadão, perguntou ao Ministério da Saúde sobre a eventual necessidade de reforço para idosos. A pasta informou que vai manter a estratégia de vacinação até que haja novas evidências.
Vale notar que a China começou a administrar essa e outras vacinas de desenvolvimento próprio a sua população ainda em 2020, mas, até o mês passado, apenas pessoas entre 18 e 59 anos podiam recebê-las. O motivo era que os ensaios das vacinas chinesas praticamente só haviam envolvido pessoas nessa faixa etária, de modo que só nela a eficácia e a segurança relatadas estavam garantidas. Mas há uma enorme diferença entre a China e o Brasil: o país asiático conseguiu controlar seus casos e mortes, mesmo sem imunizantes. Aqui, a ausência de dados específicos para idosos era confrontada com a realidade de que os óbitos se acumulavam, e uma avaliação de riscos e benefícios apontava para a necessidade de oferecer a CoronaVac aos grupos que morriam mais. Essa vacina salvou muitas vidas. Para que outras mais sejam salvas, talvez seja preciso rever a estratégia, dependendo do que os números mostrarem em relação às hospitalizações e mortes.
VOLTINHA DE MOTO
Com sua popularidade à míngua, Jair Bolsonaro tem investido na promoção de aglomerações Brasil afora. Ontem, atravessou diversos bairros da capital do Rio de Janeiro em uma “motociada”, acompanhado por milhares de pessoas. Desnecessário dizer que nenhuma medida de prevenção contra a covid-19 foi seguida.
Ao parar no Aterro do Flamengo, perto do Centro da Cidade, o presidente fez um pequeno discurso a seus apoiadores. E a seu lado, no palco, estava o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que na semana passada tentou convencer a CPI da Pandemia de sempre ter sido a favor do uso de proteção facial e distanciamento. Sem máscara, Pazuello sorria, acenava ao público e apoiava Bolsonaro enquanto ele repetia seus bordões: que é contra medidas de isolamento, a favor da liberdade, do direito de ir trabalhar, de ir à igreja…
Na CPI, Eduardo Pazuello alegou que o presidente faz esse tipo de coisa para “tratar o psicossocial” da população. Mas, se Bolsonaro nunca é punido por seus atos, com o general pode ser diferente: militar da ativa, ele está proibido pelo Estatuto dos Militares e pelo Regulamento Disciplinar do Exército de participar de manifestações coletivas de caráter político. O Comando do Exército ainda não se pronunciou oficialmente. Ontem, o ministro da Defesa, Braga Netto, e o comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira, falaram ao telefone para tratar da crise aberta após o ato. A pressão para general a ir para a reserva, que já havia, só fez crescer.
Oficiais ouvidos pela Época adiantaram que vai haver punição. Um deles disse que Pazuello “derramou o caldo”, e que, se o Paulo Sérgio Nogueira não fizer nada a respeito, isso vai abrir brecha para outros militares começarem a subir em palanques também. Além disso, se Oliveira não punir o general, estará ele próprio cometendo uma transgressão. Por outro lado, diz a colunista d’O Globo Malu Gaspar, uma punição pode vir a ser revogada por Bolsonaro…
Ainda segundo a Época, Pazuello mandou uma mensagem ao comandante do Exército se dizendo arrependido.
A colegas mais próximos, disse que “não fez pronunciamento político”: apenas agradeceu “a galera” e disse que “não podia perder esse passeio de moto”, “que era imperdível”.
O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que Pazuello será reconvocado para prestar novos esclarecimentos. Para o vice-presidente, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Pazuello “auto indiciou”: “É o primeiro caso em uma CPI no qual a pessoa se indicia. O que ele fez hoje é crime contra a saúde, contra regras de conduta do Exército, contra autoridade judicial”.
Em tempo: o governo do Maranhão autuou o presidente, na sexta, por gerar aglomeração com mais de cem pessoas sem controle sanitário em meio à pandemia e por não usar máscara em um evento em Açailândia. Bolsonaro tem 15 dias para se defender. Depois disso, é multa, que pode variar de R$ 2.000 a R$ 1,5 milhão.
NOVO ELEMENTO
Senadores da CPI da Pandemia querem convocar Arthur Weintraub, ex-assessor da Presidência da República, para falar do “gabinete paralelo” que, tudo indica, aconselha Jair Bolsonaro na pandemia. Vídeos divulgados este sábado pelo portal Metrópoles mostram Weintraub, em discurso e lives nas redes sociais, indicando que pode ter coordenado o tal grupo. Entre outras coisas, diz que estudou artigos científicos sobre a hidroxicloroquina e entrou em contato com médicos que defendiam o tratamento.
DUROU POUCO
E a médica infectologista Luana Araújo, anunciada há dez dias para chefiar a recém-criada Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19, decidiu recuar e não aceitar o cargo. Ela havia se manifestado a favor da vacinação em massa e a medidas restritivas, e contra o “kit covid”. Segundo a Veja, Araújo não aceitou determinações impostas pelo Palácio do Planalto. A CPI também quer convocá-la para ouvir o porquê do recuo.
DE FORA, DE NOVO
Um conjunto de 62 países apresentou à OMC uma nova proposta de quebra de patentes, pedindo que a suspensão seja válida por pelo menos três anos. O período, dizem, seria suficiente para permitir que laboratórios em todo o mundo ampliem suas produções e fabriquem versões genéricas das vacinas e outros produtos. O Brasil ficou de fora, como já havia ficado na proposta anterior, de outubro do ano passado.
O jornalista do UOL Jamil Chade atualiza como anda essa discussão entre os países ricos: apesar do “ok” de Joe Biden, não há consenso entre os líderes do G-20, que se limitaram a aprovar uma declaração prevendo o compromisso da doação de bilhões de doses para as economias mais pobres do mundo. Laboratórios farmacêuticos estariam dispostos a enviar 1,3 bilhão de doses este ano, seja sem lucro ou com preços mais baixos. Mais 1,3 bilhão estaria garantido para 2022. Isso ainda é menos do que os países europeus e os EUA garantiram para os próximos dois anos, nota Chade.
Hoje, os países de alta renda, que têm 15% da população mundial, compraram 45% de todas as doses disponíveis. Ainda há cerca de dez nações, a maioria na África, que não aplicaram uma dose sequer.
SÃO MUITO DIFERENTES
Pesquisadores do Instituto de Física da USP testaram a eficiência de 227 máscaras encontradas em lojas e farmácias brasileiras. O estudo, publicado no periódico Aerosol Science and Technology, incluiu desde respiradores PFF2 até as mais variadas mascaras de tecido, analisando sua capacidade de filtrar partículas de aerossol do mesmo tamanho das que carregam o coronavírus.
O resultado está descrito em uma reportagem da BBC e mostra uma diferença enorme entre os produtos. Enquanto as PFF2 filtraram nada menos que 98% das partículas, as de algodão retiveram, em média, apenas 40% delas. Mas, como não há nenhuma certificação para máscaras de pano, entre elas há opções melhores e outras péssimas: algumas filtraram 70% das partículas, e outras, míseros 15%. As que tinham apenas uma camada protegem mal; as que têm costuras na frente (que são muito comuns) também são menos eficientes.
Quanto às máscaras cirúrgicas, os dados devem ser interpretados com cautela. A pesquisa indicou uma filtragem de 89%, mas a medição leva em conta apenas o material, sem considerar as falhas de vedação que esse produto normalmente tem. Com os enormes vãos que costumam ficar nas laterais, esse percentual certamente não é atingido na prática. Mas a mensagem é que, se estiver muito bem ajustada, essa também é uma boa opção de proteção. O ajuste é fundamental em qualquer máscara usada e, como já dissemos por aqui, uma forma de melhorar a vedação nas cirúrgicas é acrescentar uma máscara de tecido por cima.
Embora no início da pandemia a escassez de equipamentos de proteção individual fosse um problema, hoje a situação é bem distinta. Há mais de 60 de fabricantes brasileiros de PFF2, e a produção nacional triplicou em um ano. Os preços também não são proibitivos: em lojas de materiais de construção, é fácil encontrar PFF2 por cerca de R$ 3,00 a unidade e, fora do ambiente hospitalar, é possível reutilizar esse respirador em média dez vezes. Vale lembrar que as máscaras de tecido também têm vida útil limitada – a Anvisa recomenda no máximo 30 lavagens, pois com o tempo a trama começa a se abrir.
Recomendamos o site PFF para Todos, que mapeia disponibilidade e preço de PFF2 em lojas físicas e virtuais de todo o país.
A VARIANTE NO MARANHÃO
Depois que os primeiros casos da cepa B.1.617 (identificada primeiro na Índia) foram confirmados no Maranhão, o Ministério da Saúde decidiu implantar barreiras sanitárias em aeroportos, rodoviárias e grandes rodovias. Vai enviar ao estado um adicional de 5% no quantitativo de vacinas e 600 mil testes rápidos de antígeno – estes são diferentes dos testes de anticorpos, e detectam casos positivos no momento em que a pessoa está contagiosa. Os testes devem ser usados nos aeroportos e demais locais de entrada ao estado.
A pasta também resolveu monitorar passageiros provenientes do Maranhão que se dirigirem à capital paulista por estradas, e deve depois ampliar essas medidas para outras capitais.
E pelo menos dois outros estados – Ceará e Pará – investigam casos suspeitos.