Ir às ruas para salvar 1,5 milhão de pessoas. Por Gilvander Moreira*

O dia 19 de junho de 2021 provavelmente entrará para a história como um dia histórico, por dois motivos: a) o dia em que no Brasil ultrapassou 500 mil mortos[2] durante a pandemia da covid-19, mortos não apenas pelo coronavírus, mas, principalmente, pela política genocida, política de morte, planejada e coordenada pelo desgoverno federal do inominável antipresidente; b) o dia que cerca de um milhão de pessoas foram às ruas em 420 cidades no Brasil e em dezenas de cidades no exterior gritar por “Fora, Bolsonaro”, “Vacina, já!” e “Auxílio Emergencial justo e digno, de pelo menos R$600,00”. Duplicou-se o número de pessoas na luta nas ruas e também o número de cidades em relação às manifestações de 29 de maio último. Iniciou-se o dia 19 de junho com a notícia de que o Brasil tinha ultrapassado os 500 mil mortos, vítimas da política genocida em curso no país. Ao entardecer do mesmo dia, se vê a imagem de 500 mil pessoas na Avenida Paulista em São Paulo lutando em defesa da vida, da democracia e por todos os direitos. 

Todos com máscara, álcool em gel, distanciamento, muita criatividade, com muito amor, ao som dos tambores, com inúmeras mensagens estampadas em cartazes, faixas e banners, com uma energia revolucionária contagiante! O povo, de crianças a idosos, mas com destaque para a juventude e as mulheres, deu mais uma vez o recado em alto e bom som. Destaco algumas das centenas de gritos ecoados nas ruas no último sábado. Por exemplo, uma vovó, em João Pessoa, cantou: “Eu vou, eu vou rezar, vou rezar o meu rosário para que Nossa Senhora bote fora Bolsonaro.”; “Se o povo protesta em meio a uma pandemia, é porque o governo é mais perigoso que o vírus.”; “Eu te responsabilizo, Bolsonaro!”; “MAIS amor, vacina e ciência e MENOS ódio, negacionismo e Bolsonaros.”; “Queremos vacina no braço, comida no prato e Fora, Bolsonaro!”; “Não tem vacina, mas tem chacina. Em memória dos 29 do Jacarezinho.”; “Nem tiro, nem fome e nem covid. Fora, Bolsonaro!”; “Vacina salva vidas, Amazônia salva o Planeta”; “Com Bolsonaro no poder, as mortes só aumentam.”; “Não estão todos, faltam 500 mil vidas.”; “Nem tiro, nem vírus, nem fome: a CPI tem que acabar em impeachment.”; “Pela Vida! Pela Vacina! Fora, BolsonaroFora, Governo Genocida!”; “Vida, Pão, Vacina e Educação! Fora, Genocida!”; “A Ciência e a Educação salvam. Bozo mata!”; “Fora, Bolsonaro! Chega de mortes! Vacina, já!”; “Chega de genocídio, fome e desemprego!”; “Vacina para todos, já!” “Luto(a) pelas 500 mil vidas perdidas. Basta! Chega! Vacina e responsabilização, já, de Jair Bolsonaro, na CPI e no STF!”.

Marcante também foi a articulação dos Movimentos Sociais Populares e outras forças vivas da sociedade que, em mutirão estabeleceram redes e transmitiram ao vivo os Atos Públicos, as Marchas e as manifestações que ocorreram em 420 cidades. O “Jornal A Verdade” e a “TV Resistência Contemporânea”, por exemplo, fizeram cobertura ao vivo durante quase dez horas, com centenas de lideranças entrando ao vivo e mostrando os Atos por todo o Brasil, via celular configurado em Rotação Automática e usado na posição horizontal (deitado). Militantes do Mídia Ninja, Jornalistas Livres, TV 247 etc divulgaram ao vivo muitos flashes das manifestações ao longo do dia. Marcante também foi a participação de centenas de cidades do interior mostrando que é possível e necessário que aconteçam Atos Públicos em todas as 5.568 cidades brasileiras nos próximos “Fora, Bolsonaro!”. Canindé, no Ceará, e Ibirubá, no Rio Grande do Sul, por exemplo, deram o exemplo a ser seguido. Nestas duas cidades do interior, dezenas de pessoas em um ponto simbólico da cidade, com uma série de cartazes e várias faixas, entoaram vários gritos de luta por “Fora, Bolsonaro!” e por direitos. Gravaram vídeos e divulgaram. O exemplo de luta do povo de Canindé e Ibirubá precisa ser seguido pelas forças vivas de todas as cidades do país. As lutas precisam passar a ser quinzenais, semanais e diárias. Bolsonaro e seu desgoverno parecem invencíveis, mas são vencíveis, pois são opressores recheados de mentiras, violência e contradições. Por isso, “têm pés de barro”.

Em todas as lutas por direitos o povo corre risco: repressão da PM, risco de ter que enfrentar fascistas, risco de algum incidente etc. Lutar tem risco, mas o maior risco hoje é não lutar pela superação dos desmandos na política brasileira. A política genocida está se reproduzindo cotidianamente. Estamos já no início da terceira onda da política genocida, nos alertam os infectologistas. Os números são assustadores. De 2 mil a 2.500 mortos por dia; quase 5 mil em dois dias; dez mil em 4 dias; 20 mil em uma semana; 80 mil por mês. 160 mil em dois meses. Se continuarmos assim, até as próximas eleições em 2022 poderemos ter cerca de 2 milhões de mortos. Portanto, ir às ruas e realizar lutas populares cada vez mais massivas em todas as periferias, cantos e recantos, se tornou o caminho necessário, justo e urgente a ser trilhado para impedirmos que mais 1,5 milhão de pessoas sejam mortas nos próximos 1,5 ano. Com Bolsonaro e seu desgoverno no poder, só aumenta o número de mortos e a devastação dos biomas: Amazônia, Pantanal, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga e Pampas etc. Ninguém tem o direito de se omitir, pois omissão significa cumplicidade com a política de morte e de violência que campeia no Brasil.

Evangélicos e católicos contra o fascismo, na luta pela democracia e por todos os direitos sociais, foram às ruas com a mensagem bíblica que diz: “Javé – Deus solidário e libertador – disse a Moisés: “Por que clamas a mim? Diga ao povo que marche!” (Êxodo 14,15). Esta passagem bíblica faz referência ao momento em que o povo, após uns 500 anos de superexploração pelo imperialismo dos faraós no Egito, está unido, organizado e irmanado para fugir da “casa da escravidão” – o Egito. O povo está encurralado: na frente o Mar Vermelho; atrás, a tropa de choque das forças repressivas e milicianas do faraó. Muita gente orando e pedindo a Deus para livrá-las da morte, como muita gente que ora hoje pedindo a Deus que acabe com a “pandemia”. Moisés, um dos líderes do movimento popular religioso de libertação, ao lado das mulheres parteiras – Séfora e Fua -, de Miriã e outras, transmite ao povo o que o Deus da vida pede: “Dê um passo à frente! Marche!” Irmanados/as, de cabeça erguida, superando o medo e o encurralamento, o povo, em luta libertária, deu um passo à frente e o mar Vermelho se abriu. Assim, o povo escravizado passou “a pé enxuto” e o exército de faraó afogou-se nas águas do mar Vermelho. No episódio da partilha dos pães, narrado seis vezes nos quatro evangelhos da Bíblia, diante dos que se esquivavam da responsabilidade em solucionar o problema da fome e das injustiças, Jesus Cristo também mostrou o caminho a ser seguido: “Vocês é que têm de lhes dar de comer” (Mateus 14,16). Enfim, “felizes os/as que constroem a paz” (Mateus 5,9), fruto da justiça social, agrária, urbana e ambiental, o que passa necessariamente pelo resgate da democracia, o que exige “Fora, Bolsonaro!”.

22/06/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 – Atos “Fora, Bolsonaro!” com mais de 1 milhão de pessoas em mais de 400 cidades no Brasil– 19/06/2021

https://www.youtube.com/watch?v=ugveR5zBN28

2 – Ato “Fora, Bolsonaro!” Belo Horizonte, MG – 19/6/2021 – “POVO NA RUA: FORA, BOLSONARO!”

3 – COBERTURA ESPECIAL DO JORNAL A VERDADE DAS MANIFESTAÇÕES #19JFORABOLSONARO

4 – AO VIVO. Semana de protestos no Brasil começa com os Povos Indígenas em Brasília.

5 – Atos “Fora, Bolsonaro!”: BH, Recife, Juiz de Fora, Dublin/Irlanda e outras cidades – 19/6/2021

https://www.youtube.com/watch?v=r4ki_DhmA88

*Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente da CPT, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH e de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG.

[2] Esse é o número oficial. Há pesquisas que indicam que o número de mortos por covid-19 no Brasil possa estar sendo 20% acima dos números divulgados, pois, segundo Pesquisa de uma Universidade dos Estados Unidos sobre mortos no Brasil em 2019 morreram 50 mil pessoas e em 2020 morreram 150 mil pessoas por Síndrome respiratória aguda, o que pode ser por covid-19 não diagnosticado. Logo, é possível que em 2020 tenha tido 100 mil mortos por covid-19 não caracterizados em atestado de óbito. E nos primeiros seis meses de 2021?

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