No Ceará, Audiência Pública se posiciona contra os despejos no estado

Em Limoeiro do Norte, Defensoria promove audiência pública para discutir a situação das famílias acampadas no acampamento Zé Maria do Tomé

Por Aline Oliveira, na Página do MST

Na manhã de ontem (27), a Defensoria Pública do Estado do Ceará realizou audiência pública com o objetivo de discutir a situação das famílias acampadas no Acampamento Zé Maria do Tomé. 

O evento aconteceu no auditório da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM) em Limoeiro do Norte, e contou com a presença de Sâmia Costa Faria, subdefensora pública geral do Ceará, Leandro Bessa, defensor público assessor de planejamento e gestão, João Alfredo Teles, advogado e ambientalista, Diane Figueiredo, do Centro de Referência de Direitos Humanos do Estado do Ceará (CRDH), Castro Junior, representando a CODEA/SDA, Lucenir Jerônimo, representando a FAFIDAM, Maria de Jesus dos Santos, representando a Direção Estadual do MST, Damiana Bruno, representando as famílias, além de dirigentes e militantes do MST e representantes do Movimento 21. O Departamento de Obras Contra as Secas (DENOCS) foi convidado, mas não compareceu.

“Diante de tudo que eu ouvi e vi na visita ao acampamento, vejo o quanto é importante vivenciar o que a sociedade vive, porque a partir daí, é impossível não se sensibilizar com a pauta e com as demandas. Seria importante que todas as instituições viessem também conhecer e ouvir o que vocês tem pra falar e mostrar dos resultados dos 8 anos de permanência no acampamento”, afirmou Sâmia Costa.

Sâmia ainda destacou o compromisso da defensoria no apoio no diálogo entre as partes envolvidas com o objetivo de resolver a situação. “Existe uma articulação da defensoria no estado junto com o legislativo. No próximo dia 29 temos uma audiência na Assembleia Legislativa e a defensoria está constantemente reunida com o governo e tem se colocado a disposição para promover o diálogo e vê o que é possível ser feito. Diante das demandas, assumimos três encaminhamentos: a articulação da reunião com o DENOCS; uma reunião com as prefeituras de Limoeiro do Norte e de Quixeré; e também um levantamento de como se encontra o TAC e saber se é possível retomar a execução desse TAC. O tempo é pequeno, mas saibam que a defensoria publica está do lado de vocês, porque essa é a razão da gente existir, sem a população a defensoria não existe”

Heloisa Sousa, do acampamento Zé Maria do Tomé, fez o seu relato. “Hoje destaco três sentimentos: dor, tristeza e gratidão. Gratidão por esse apoio, por essa articulação e mobilização que vem sendo feito para que a gente continue em nossas casas. Quero expressar minha dor, minha angústia de saber que, se esse despejo se concretizar, a maioria não tem pra onde ir. Ali construímos tudo com nosso suor, nosso esforço, estamos lá tentando construir o nosso futuro, o futuro das nossas crianças. Diante de tudo isso, tenho refletido muito: que justiça é essa que tira nossos direitos? Que justiça é essa que não nos deixa ficar lá, produzir e viver com dignidade, que vira as costas pra gente, a gente só quer um pouco de dignidade? Queremos continuar tendo o prazer de dividir o alimento, ser solidário com quem tem fome” relatou emocionada.

A audiência teve início por volta das 10 horas e seguiu até 12 horas, e o espaço contou com uma ornamentação com mais 20 variedades de produtos da Reforma Agrária vindos do acampamento Zé Maria, faixas e cartazes destacando a resistência dos mais de 8 anos de luta, a produção de alimentos saudáveis, a solidariedade e a reivindicação da terra para os agricultores. No final do evento mais de 500 quilos de produtos foram disponibilizados para os participantes, como banana, manga, pimentão, mamão, limão, feijão, jerimum, urucum, batata doce, mel, entre outros. 

Uma história de Luta, Resistência e Solidariedade

Desde do dia 05 de maio de 2014, a Chapada do Apodi foi ocupada por trabalhadores/as Rurais Sem Terra, que ocuparam a área com o objetivo de produzir alimentos e construir um espaço de moradia, local antes ocupado por empresas ligadas ao agronegócio. A luta das famílias para tornar a acampamento um assentamento irrigado é com o intuito de continuar a produzir alimentos e garantir um espaço para morar, como destaca José Evandir de Sousa, acampado. “Nós só queremos ter dignidade, produzir alimento saudável pra nossa sustentação e de nossa família, pra nossa região e doar pra quem mais precisa. Nós não temos pra onde ir de formos despejados”.

As famílias produzem e vivem com dignidade, mas a insegurança de não saber se nos próximos dias terão um teto e um espaço para produzir e retirar o sustento é muito presente. São mais de 100 famílias, homens, mulheres, crianças, idosos, que com o fim da ADPF 828 que proíbe os despejos na pandemia, a ameaça segue e os despejos poderão acontecer a qualquer momento. Segundo dados da campanha nacional Despejo Zero, com o fim da prorrogação, cerca de 132 mil famílias podem ficar sem teto e jogadas as margens das estradas e nas ruas sem ter onde morar e o que comer.

“O acampamento Zé Maria tem resistido muito e essa resistência sido para ter o acesso a terra e água, tem muita produção, uma comunidade construída. Nós não aceitamos despejo, não aceitamos que dentro do perímetro irrigado não se admita o pequeno agricultor com condições de produzir. Lutamos para que o perímetro seja um espaço que caiba pessoas, a mulher, a criança, o idoso, o jovem e que hoje não tem sido isso”, defende Ana Paula Furtado, da Direção Estadual do MST na região do Vale do Jaguaribe.

Ela finaliza lembrando o papel do acampamento hoje. “Temos demostrado que dentro do perímetro irrigado pode sim ter vida, ter família, ter diversidade de produção, ter organização dos trabalhadores e trabalhadoras, e hoje é isso que está ameaçado com a ordem de despejo, a qualidade de vida dessas famílias”, concluiu.

No último dia 21, uma representação das famílias acampadas realizaram um ato simbólico em defesa do acampamento Zé Maria do Tomé em frente ao prédio da Justiça Federal do município de Limoeiro do Norte. A ação fez parte da jornada nacional por um Brasil Sem Despejo, que exige do STF a Prorrogação da ADPF 828, para suspensão de despejo de mais de mais de 132 mil famílias acampadas, no campo e na cidade.

*Editado por Fernanda Alcântara

Foto: Aline Oliveira

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