Uso da tecnologia e valorização do saber tradicional podem favorecer o convívio dos povos com a natureza. Entrevista especial com Carlos Marés

“O Estado tem que continuar sua função fundamental de preservação das áreas, porque os indígenas não conseguem lutar, por exemplo, contra a invasão de garimpeiros”, diz o jurista e ex-presidente da Fundação Nacional do Índio – Funai

Por: Patricia Fachin, em IHU

A ambiguidade em relação aos efeitos do desenvolvimento tecnológico e científico é uma marca da nossa era: ao mesmo tempo em que melhoram as condições de vida das pessoas, as tecnologias geram inúmeros e novos problemas, especialmente relacionados a questões éticas e socioambientais. Apesar dos desafios a serem superados neste campo, “não é possível imaginar hoje, passando o primeiro quarto do século XXI, que desenvolvimento e tecnologia são destruição da natureza e dos povos que estão convivendo com ela”, disse Carlos Marés ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Segundo ele, “desenvolvimento e tecnologia” devem “favorecer o convívio dos povos com a natureza” e manter as florestas em pé, sem que para isso as comunidades tenham que abrir mão dos seus conhecimentos tradicionais. “Em geral, a ciência moderna e a cultura ocidental negam a capacidade desses povos de tomar os conhecimentos e utilizá-los sem grande formação. Esse é um primeiro problema de preconceito em relação ao conhecimento dos povos, até porque os povos são muitos. Oferecer tecnologia e a utilização desta misturada ao conhecimento dos povos é algo que enriquece muito. Ou seja, os povos têm determinados conhecimentos, aprendem outras coisas, e aplicam isso junto com seus conhecimentos”, disse.

Na entrevista a seguir, concedida por telefone ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU, depois de retornar de uma visita à aldeia do povo Tiriyó, que vive no Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, no Amapá, Marés reflete alternativas autônomas para os povos implementarem projetos coletivos em suas comunidades, como fundos de recursos internacionais que estão sendo captados pelos indígenas, e sobre a condição dos povos tradicionais no país à luz das eleições presidenciais deste ano e da gestão do governo Bolsonaro. “Sempre houve um processo em que os indígenas faziam projetos, seja de saúde, de eletrificação etc., e conseguiam verba para realizá-los através de uma captação internacional. Há algum tempo, cerca de três ou cinco anos, os indígenas começaram a inverter essa lógica: eles não querem fazer projetos; eles querem ter o dinheiro à disposição para então pensar onde e com o que gastar coletivamente. Essa é a ideia desses fundos indígenas”, explica.

Investimentos em saneamento e eletrificação com placas solares, acrescenta, “são coisas que melhoram as condições de vida da população, que pode ter um refrigerador, ou seja, ter um lugar para guardar os peixes e não ter que pescar todo dia ou comer tudo que se pesca. Poder guardar o alimento é algo que ajuda as comunidades e eu chamaria isso de desenvolvimento. Mas também tem que perguntar se eles querem ter acesso a isso”.

Carlos Frederico Marés de Souza Filho é graduado, mestre e doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. É procurador do Estado do Paraná desde 1981. Integra o Programa de Mestrado e Doutorado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, onde é professor titular de Direito Agrário e Socioambiental. Foi presidente da Fundação Nacional do Índio – Funai, procurador-geral do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra e diretor do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul. É sócio-fundador do Instituto Socioambiental – ISA.

Confira a entrevista.

IHU – Recentemente, o senhor visitou uma aldeia indígena no Amapá. Esteve participando da Assembleia Geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB ou visitou a comunidade por outra razão? Pode nos falar sobre a razão da visita à aldeia?

Carlos Marés – Eu fui por outra razão, mas participei inicialmente da Assembleia da COIAB. Não fiquei o todo o tempo, mas estive no Oiapoque, no lugar da Assembleia. Fui, na verdade, para conversar com o povo Tiriyó a respeito de um fundo indígena para o parque Tumucumaque [Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque]. Dentro do parque Tumucumaque há grande concentração indígena do povo Tiriyó, que vivem em lugar especial porque o parque é considerado a maior reserva contínua de mata de floresta do mundo. É um lugar muito grande, perto do Suriname e, inclusive, entra, em parte, no país vizinho. Nesse lugar, em um determinado momento, houve uma missão católica, então construíram uma casa para os padres franciscanos, e a aeronáutica brasileira construiu uma pista de avião para controle de fronteiras, enquanto os povos indígenas estão em volta. Relativamente perto da pista, os indígenas construíram uma grande oca para reuniões e festas. Eu fui nesta oca, onde realizamos a reunião com todas as lideranças Tiriyó.

O tema da reunião foi sobre a possibilidade de constituição de um fundo indígena. Agora, estão sendo estruturados quatro ou cinco fundos indígenas no Brasil. Sempre houve um processo em que os indígenas faziam projetos, seja de saúde, de eletrificação etc., e conseguiam verba para realizá-los através de uma captação internacional. Há algum tempo, cerca de três ou cinco anos, os indígenas começaram a inverter essa lógica: eles não querem fazer projetos; eles querem ter o dinheiro à disposição para então pensar onde e com o que gastar coletivamente. Essa é a ideia desses fundos indígenas. Então, os doares internacionais não doariam para a eletrificação, mas doariam um dinheiro para que os indígenas decidissem o que fazer com ele. A lógica é diferente, e é justamente sobre isso que os Tiriyó queriam conversar e este foi o tema da reunião: como funcionaria esse fundo, o que seria etc. Como eles têm protocolos de consulta, a discussão foi feita dentro dos padrões destes. Foi muito interessante; uma experiência muito rica e uma iniciativa indígena muito importante.

IHU – Qual é a origem do fundo e qual é a proposta deles em relação ao uso do dinheiro?

Carlos Marés – Eles têm várias coisas para fazer com o fundo, dependendo do dinheiro que juntarem, mas, principalmente pretendem investir na eletrificação para a energia solar em algumas aldeias e saneamento, que são as maiores preocupações deles no momento. A população indígena cresceu muito, é uma população grande, e começam a surgir problemas de saneamento.

IHU – Eles terão total autonomia para gerir esses recursos e contratar pessoas para os projetos?

Carlos Marés – A ideia é justamente esta: juntar um dinheiro para que eles possam, autonomamente e coletivamente, discutir como usar esse recurso a partir dos protocolos que eles têm.

A fonte desse dinheiro é internacional, e quem articula isso são organizações internacionais de apoio, que não têm dinheiro direto, mas têm formas de articulação. Isso está caindo bem no gosto dos gerenciadores internacionais, aparentemente. É uma novidade do ponto de vista das formas de financiamento, da preservação ambiental e cultural.

IHU – Esse modelo de fundos seria uma alternativa para as comunidades que vivem em um país como o Brasil, em que há tantos problemas em relação à política indigenista estatal?

Carlos Marés – Não é a única alternativa, mas é uma boa alternativa principalmente porque os projetos são muito pessoais e isso cria certos constrangimentos dentro dos povos. Os projetos são pessoais, ou seja, é um indígena que consegue uma arrecadação e consegue fazer algum projeto. Há uma evolução aí que precisamos entender. O primeiro passo é a questão da consulta, e dela são gerados os protocolos. Esses protocolos de consulta são normas internas que eles mesmos decidiram como funcionaria a organização em relação às condições externas, à sociedade hegemônica, à sociedade branca. Eles criaram esses protocolos em 2016, portanto, é algo muito recente e agora eles estão utilizando os protocolos para outras coisas e não somente para consulta.

A consulta era feita assim: se o Estado vai construir uma hidrelétrica, tem que consultar as comunidades – e as consultas geravam conflitos e problemas. Agora, alguns povos – e isso está se disseminando cada vez mais – estão usando esses protocolos para algumas decisões internas, porque não tinham formas de decisões internas. Essas decisões internas e coletivas facilitam a existência de fundos para que eles discutam como vão aplicar o dinheiro. É uma forma mais autônoma e é esse exercício de autonomia que tem acontecido.

Agora, se você pergunta se isso é uma alternativa, diria que faz parte das alternativas, mas não é “a” alternativa. O Estado tem que continuar sua função fundamental de preservação das áreas, porque os indígenas não conseguem lutar, por exemplo, contra a invasão de garimpeiros. Então, essa proposta não é uma alternativa ao Estado.

IHU – Qual é a condição de vida dos Tiriyó?

Carlos Marés – Do ponto de vista material, os indígenas do parque vivem relativamente bem porque eles ainda têm área preservada; há muita área, muito rio e, particularmente neste momento, os rios estão muito cheios, há muita água, uma abundância de peixes, e eles vivem um certo isolamento. É claro que eles têm problemas sanitários a partir da vinda de fora, porque eles transitam muito pelas cidades, mas eles estão mais isolados do que a média dos indígenas no Brasil justamente porque eles têm muita floresta. Então, as condições de vida deles são boas: têm boa alimentação, boas condições de moradia, bons rios para tomar banho. É um lugar diferente dos outros. Há começo de invasão em alguns pontos – não neste em que estive, que é uma área bastante preservada. Mineradoras e garimpeiros estão na beira da área e não dentro dela.

IHU – No parque Tumucumaque existem povos completamente isolados, como na terra indígena do Vale do Javari, como os que têm feito contato mais recentemente por causa dos problemas ambientais que eles têm enfrentado, como falta de água nos rios?

Carlos Marés – Deve haver povos absolutamente sem contato no parque, muito provavelmente. Mas não conheço levantamentos sobre isso porque estes não são tão fáceis de serem feitos. Os povos que visitei têm contato com outros e uma boa parte deles fala português. Muitos são católicos e tem até uma igreja bonita lá. Eles têm contato com o mundo branco e saem para outras cidades. Como tem a pista de pouso lá, volta e meia chegam aviões de carga e eles mesmo vão e voltam para a cidade de avião. Eles têm uma relação com as cidades de Macapá e Santarém. Dentro do parque existem povos que têm menos contato e, muito próximo dali, existem outros que fizeram contato muito recentemente, como, por exemplo, os Zo’é. Aliás, a ideia seria criar um fundo que também abrangesse os Zo’é porque esse povo vive uma situação mais difícil e são poucos os que falam português. Não é uma região como as que estamos acostumados a ver no Sul, onde praticamente todos os indígenas falam português e a relação é mais ou menos fácil. Lá, se você não tiver um intérprete ou não falar o idioma deles, passa aperto.

IHU – Que balanço faz da situação das comunidades indígenas hoje no país, três anos e meio depois do governo Bolsonaro? Quais são os principais retrocessos na política indigenista neste período, em um governo que desde o início se posicionou contrário à pauta indígena?

Carlos Marés – Os povos indígenas tiveram, nesse período de quase quatro anos, dois inimigos muito fortes. Um é o próprio governo e o apoio deste ao incentivo à invasão de terras, garimpos, pesca ilegal, destruição da natureza – não é só um problema dos indígenas propriamente, mas do conjunto que os estes representam. As áreas indígenas, especialmente as da Amazônia, são preservadas e assim têm que estar. O avanço contra a natureza é também um risco para as comunidades, e esse é um grande primeiro problema que eles tiveram. Não é só a destruição das comunidades, mas da natureza, que destrói a comunidade. A consequência mais visível desse incentivo que o governo Bolsonaro fez para a ocupação e invasão das terras indígenas foi, no Vale do Javari, a morte do Bruno [Araújo Pereira] e do Dom [Phillips]. Quando a política incentiva a destruição, acontece isso – e não é só para os indígenas. Convenhamos que a morte de pessoas e a violência armada está disseminada no país inteiro e a considero corresponsabilidade direta da ação governamental. Mas os indígenas sofrem duplamente porque essa destruição é a destruição do seu lar.

O segundo grande problema que não tem tanto a ver diretamente com o governo Bolsonaro, mas tem a ver por causa da ausência de políticas, é a Covid-19. Isso foi um problema muito grande de duas ordens: primeiro, da doença propriamente dita, que matou muita gente. O índice de mortandade nas populações indígenas é muito maior do que o da população do Brasil. Isso demonstra a fragilidade dessa questão – e é claro que é frágil porque os povos indígenas têm uma vida comunitária e o isolamento, para eles, é muito difícil. A Covid-19 ceifou vidas muito importantes, de grandes lideranças e foi, em si mesma, um problema. É claro que o governo ajudou porque demorou para dar insumos, teve dificuldades de transporte, de tirar alguns indígenas das aldeias e levá-los para hospitais e entubá-los. Mas, por outro lado, também houve uma dificuldade do sistema de saúde ocidental no sentido de entender os problemas de saúde indígenas propriamente ditos. Isso é uma coisa recorrente e permanente e a Covid-19 revelou isto: muitos faleceram sem o apoio da comunidade e isso é ruim para ela porque gera problemas culturais. A violência que é o tratamento médico ocidental em relação a alguns preceitos indígenas é algo complicado e isso gerou um desconforto nas populações.

Políticas

Eu poderia dizer que as políticas indigenistas do Estado brasileiro desde Temer, mas até um pouco antes, têm sido muito ruins porque têm sido políticas agressivas aos povos indígenas, como a falta de demarcação e fiscalização das terras. Todas as coisas que são negativas aos povos indígenas aumentaram muito neste período: desflorestação, invasão de garimpeiros, garimpo nos rios e poluição das águas, pesca e caça proibidas.

A Funai, por sua vez, que sempre foi um órgão que, bem ou mal, às vezes mais mal do que bem, trabalhou junto com os índios, constituída por um grupo de funcionários dedicados aos povos indígenas, agiu contra eles porque esses funcionários não puderam trabalhar. O exemplo mais visível é o do Bruno, que foi punido exatamente porque defendeu os índios. É uma situação muito complicada essa em que os funcionários da Funai não conseguem agir na defesa dos índios; há uma enfermidade grande no Estado.

IHU – Além dos conflitos entre indígenas e invasores ilegais, há um conflito específico entre indígenas e ribeirinhos em algumas regiões remotas porque, assim como os primeiros, os ribeirinhos também se sentem completamente abandonados e desassistidos pelo Estado. Como o senhor analisa esse tipo de conflito que não envolve diretamente o garimpo, a caça e o desmatamento ilegal, mas é uma hostilidade marcada por povos que também estão isolados e se ressentem da falta de assistência? Como resolver esse tipo de conflito entre grupos que são vulneráveis e mantêm uma relação de hostilidade um com o outro?

Carlos Marés – Num determinado momento, especialmente durante o período da ditadura, havia um incentivo a esse conflito. Em alguns lugares, foram feitos projetos de colonização dentro de áreas indígenas ou ao lado delas para que houvesse esse conflito. A ideia era a aposta na sociedade do conflito. Mas os conflitos se estabelecem, incentivados pelo Estado ou não. É o caso dos seringueiros, que foram levados para o Acre, principalmente pelo Estado. Há conflitos entre os seringueiros e os indígenas porque eles estão no mesmo território. Então, esses conflitos existem. É fácil de resolvê-los com políticas públicas, mas, em primeiro lugar, tem que haver a demarcação das terras indígenas, ou seja, o reconhecimento do limite destas. Havendo o reconhecimento dos limites das terras indígenas e havendo uma proteção aos outros povos que não são indígenas, também concedendo terras a eles, garantindo território e possibilidades de vida, os conflitos diminuem. Esse tipo de conflito só existe porque um é empurrado pelo outro. Na verdade, o garimpeiro empurra o ribeirinho e o ribeirinho empurra o indígena porque o espaço é um só. Então, as ações do Estado de proteção aos povos não-indígenas favoreceriam o não conflito.

Em certas áreas onde há garimpo, este age de duas formas: uma, dificultando a vida dos ribeirinhos e, outra, cooptando-os. São duas coisas diferentes. Quando há cooptação – não só de ribeirinhos, mas também de indígenas –, isso se torna dramático porque o conflito se estabelece dentro da comunidade, seja indígena ou ribeirinha. A cooptação acontece pela ausência do Estado, porque ela é feita por quem não poderia cooptar, por ilegais. É muito difícil ter algum garimpo legal que faça cooptação direta. Então, tudo gira em torno da ação do Estado. É possível controlar esses conflitos? É possível, sim; é só separar bem as territorialidades.

Lembro de um caso muito concreto de um governo da ditadura que colocou uma colonização de camponeses dentro de uma área indígena e se estabeleceu o conflito. A ideia era a de que os camponeses resistissem aos indígenas porque estavam melhor armados, mas, no fim, não conseguiram porque dentro do mato a coisa complica. Qual foi a solução logo depois da ditadura? Foi reassentar todos os camponeses e retirá-los daquelas terras. Foi uma política muito complicada, difícil, mas foi feita no governo [José] Sarney, no primeiro governo depois da ditadura.

Então, se o Estado resolve o problema dos camponeses, resolve o problema dos índios e o conflito junto. As políticas precisam ser muito locais e têm que envolver todos os agentes, ou seja, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra e a Fundação Nacional do Índio – Funai precisam estar envolvidos, todos com boa fé e boa vontade. Quando há má fé e má vontade, não há solução. A ditadura agia sempre com má vontade e má fé, e elas têm voltado, principalmente agora. O governo Bolsonaro é o governo da má fé e da má vontade com essas populações.

IHU – Segundo notícias da imprensa, o governo Bolsonaro certificou 239 mil hectares de fazendas privadas em terras indígenas não homologadas em 12 estados. Como o senhor analisa esse procedimento e o que ações como essas significam para as comunidades indígenas, para os conflitos e para a concentração da terra?

Carlos Marés – As duas coisas estão muito relacionadas, mas se olharmos do ponto de vista da questão indígena propriamente dita, há uma violação direita da lei, porque o direito dos indígenas, estabelecido na Constituição e nas normas internacionais, como a Convenção 169 da OIT, é ter a territorialidade prevalente sobre qualquer outra. Então, qualquer tomada de decisão sobre terra indígena que não seja a garantia do território indígena é ilegal e inconstitucional.

Essas ações de regularização de terras privadas em áreas indígenas são ilegais e nulas. Podem ser anuladas, mas este é um problema. O Supremo Tribunal Federal – STF, o sistema judiciário brasileiro e as cortes internacionais, principalmente a Corte Interamericana de Direitos Humanos, podem anulá-las. Mas é uma enxurrada de ações, porque são muitas. Outro problema são as formas de regularização fundiária que vêm desde o governo Temer e um pouco antes, especialmente na Amazônia, que é independente de terra indígena. Mesmo que não tenha conflito com terra indígena, tem o resto: áreas de preservação, rios etc.

A construção de grandes concentrações fundiárias, em geral, é nada mais, nada menos do que a regularização do uso ilegal da floresta e a destruição dela, dos rios, dos igarapés. A chamada regularização fundiária não é nada mais, nada menos do que a legalização do crime. Independentemente da questão indígena, a questão fundiária é muito grave porque há indígenas que estão protegidos, mas as populações quilombolas, os ribeirinhos e a natureza, onças e tamanduás, estão desprotegidos.

IHU – Como o senhor tem pensado sobre o que seria um desenvolvimento adequado para a Amazônia, levando em conta a realidade dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, a situação de povos que ainda vivem isolados, as mudanças climáticas, o aumento da extração de recursos naturais, mas também o desenvolvimento tecnológico científico que a humanidade produziu até aqui?

Carlos Marés – A primeira questão que temos que discutir é conceitual, em torno do desenvolvimento e da tecnologia. Não é possível imaginar hoje, passando o primeiro quarto do século XXI, que desenvolvimento e tecnologia são destruição da natureza e dos povos que estão convivendo com ela. No meu entender, desenvolvimento e tecnologia só podem ser no sentido de favorecer o convívio dos povos com a natureza. Eu falava dos povos indígenas que pensam em saneamento e eletrificação com placas solares. Isso são coisas que melhoram as condições de vida da população, que pode ter um refrigerador, ou seja, ter um lugar para guardar os peixes e não ter que pescar todo dia ou comer tudo que se pesca. Poder guardar o alimento é algo que ajuda as comunidades e eu chamaria isso de desenvolvimento.

Mas também tem que perguntar se eles querem ter acesso a isso. Por isso, no início da nossa conversa, falamos sobre os fundos no sentido de que o próprio povo é quem deve dizer o que quer fazer com a oferta de tecnologia ou de dinheiro. No meu modo de ver, a tecnologia que é altamente desenvolvida, como as comunicações e a eletrificação, tem que servir para a manutenção da floresta, e não o contrário. Não posso entender que o desenvolvimento tenha que passar pela destruição da floresta e dos minerais. Isso não diz respeito somente à Amazônia; é mais do que isso – é em todo o planeta.

A produção de automóveis, no fundo, é uma criação de lixo de automóveis, porque se faz uma série de carros que depois vão parar em um lixo qualquer. Por que não se reaproveita esse material? Porque é mais caro. Mas estamos falando só de custo ou de possibilidades de vida futura? O minério vai acabar, assim como as florestas que estão sobre ele e, portanto, vamos ter todos os problemas derivados do fim do minério. Vamos esperar o fim do minério e das florestas para repensar o modo de desenvolvimento que temos, de criação de coisas novas que ficam obsoletas e vão parar no lixo? O problema todo é repensar a vida global. Os indígenas têm a ensinar para isso a sua forma de vida integrada com a natureza – não só os povos indígenas, mas também os quilombolas e outros povos. É possível melhorar a vida? Claro que é possível. E isso tem que ser feito.

Os camponeses, por exemplo, têm dado grandes exemplos de utilização da tecnologia para melhorar as condições de produção. A produção de alimentos orgânicos hoje está altamente tecnológica, mas não é uma tecnologia destrutiva, e sim construtiva. É mais difícil, realmente, fazer uma adaptação, porque é mais fácil produzir um veneno químico, já que se conhecem as propriedades químicas; e quimicamente se resolve um problema. Isso é tecnologia e é relativamente fácil hoje. O difícil é não utilizá-la ou avaliar quais são os impactos que tem uma química determinada e utilizar outras formas que também são baseadas no conhecimento e na tecnologia. A perspectiva da utilização das tecnologias é para as boas práticas, mas temos que pensar que boa prática não é a que resulta em recursos financeiros maiores ou destruição.

IHU – Há casos de comunidades indígenas e povos tradicionais que trabalham com a produção de alimentos, como castanhas, por exemplo, preservando a natureza e o seu modo de vida com o auxílio das tecnologias. Esse seria um modelo a ser expandido para a Amazônia? Na prática, como o senhor pensa a possibilidade de conciliação entre tecnologia e saberes tradicionais?

Carlos Marés – Antes de entrar na questão prática, é importante destacar a negação do conhecimento. Em geral, a ciência moderna e a cultura ocidental negam a capacidade desses povos de tomar os conhecimentos e utilizá-los sem grande formação. Esse é um primeiro problema de preconceito em relação ao conhecimento dos povos, até porque os povos são muitos. Oferecer tecnologia e a utilizar misturada com o conhecimento dos povos é algo que enriquece muito. Ou seja, os povos têm determinados conhecimentos e aplicam a eles outras coisas que aprendem.

Na prática, não acho que haja muita necessidade – a não ser em casos muito concretos e específicos – de uma interação e uma ação tão interna entre os povos. Os povos têm capacidade de resolver os seus problemas, inclusive o tecnológico, porque o aprendizado é muito rápido. Há um preconceito das universidades em relação aos povos indígenas e visualizei isso na última viagem ao Oiapoque, ao observar a dificuldade que alguns indígenas têm, em uma região que é predominantemente indígena, nas universidades. Nós, do lado de cá, ainda temos que aprender muito a respeitar o conhecimento dos povos indígenas.

Eles, por sua vez, há uns 30 anos, tomaram a decisão – não se sabe até que ponto de modo consciente e organizada – de aprender a tecnologia dos brancos. Hoje, há muitos estudantes indígenas e quilombolas e outros que vão para as universidades para depois voltarem para suas aldeias atuando como advogados, médicos, contadores. Eles, cada vez mais, têm capacidade de alta administração dos seus recursos. É muito importante formar – e a ideia dos fundos é mais ou menos essa – administradores dos próprios recursos a partir da hierarquia existente nos povos – porque isso é muito importante; não se pode quebrar as hierarquias e culturas locais. Essa é a importância da manutenção, porque se eles mantêm as estruturas agregando o conhecimento ocidental, tecnológico e científico, o caminho de sobrevivência é muito maior. Não acho que alguns povos precisem, de outro lado, de formas capitalistas de produção para a sobrevivência.

Modo de produção e de vida

Você se referiu especificamente à castanha. Uma das vítimas da Covid-19, uma das grandes lideranças kayapó, Paulo Paiakan, tinha uma experiência de produção de óleo de castanha que vendia para a Body Shop. Conheci a unidade de produção dele, que era na aldeia, com algumas máquinas de quebrar castanha e escorrer o óleo, mas não tinha funcionários permanentes. Todos sabiam que era preciso produzir para vender e que era bom vender porque assim compravam outras mercadorias. Então, ele construiu uma forma de produção onde as pessoas da comunidade trabalhavam espontaneamente e cada um fazia um pouco. Uns trabalhavam dez minutos; outros, duas horas; outros, o dia todo, se quisessem. Não importava o tempo que cada um dedicasse à produção do óleo da castanha. Era uma coisa completamente diferente da produção de uma fábrica capitalista. Todo mundo trabalhava de graça e recebia os benefícios do dinheiro que vinha com a venda do óleo. Esse dinheiro não era distribuído individualmente – como era uma aldeia isolada, eles não tinham a perspectiva individual de cada um ter o seu dinheiro. Eles sabiam que estavam produzindo para a coletividade. No contrato com a Body Shop não havia obrigatoriedade de produtividade, ou seja, se eles produzissem dez quilos, vendiam dez quilos, se produzissem cem, vendiam cem. Em alguns meses, produziam pouco porque o pessoal ia caçar e tinham festas e a produção caía. Havia épocas em que o tempo estava chuvoso e ninguém tinha outras coisas para fazer, então produziam mais e a produção crescia muito. Temos que entender essas dimensões diferentes dentro das possibilidades porque essa é uma coisa possível.

O que não é possível, mas foi tentando em uma aldeia no Xingu, foi a produção de óleo de pequi. A empresa queria que a produção fosse de acordo com a extração do pequi em determinados momentos e queria uma produção determinada, mas aquilo foi impossível para aquela aldeia. O contrato foi rompido porque havia uma exigência que se produzisse como se produz em uma indústria, o que não era possível. As unidades fabris assim pensadas são incompatíveis com o modo de vida deles. Não pode ser assim. Eu poderia citar vários exemplos de “coisas de moda”, como missangas, que o comércio exigiu determinada produção [das comunidades] e não foi possível porque a produção não pode ser assim; ela tem que ser espontânea e da forma que eles querem. Por isso é fundamental a interação interna e sempre coletiva.

Há situações diferentes, por exemplo, no Sul – e mesmo na Amazônia –, de indígenas que são trabalhadores de fábricas, são intelectuais e advogados. Conheço advogados indígenas que não advogam para a comunidade, mas têm uma banca e advogam para quem aparecer. É claro que isso também é possível, porque não está vetado ao indivíduo indígena exercer o seu papel na sociedade como outro qualquer. Essa é uma dimensão que temos que entender: “cada quem é cada qual”. Mas boa parte dos indígenas que é conhecida tem e mantém uma relação muito forte com as aldeias. Apesar de serem “astros” fora, ainda mantêm uma interação, uma relação e uma vida voltada para as aldeias.

IHU – O que significaria mais um mandato do presidente Bolsonaro para os povos indígenas?

Carlos Marés – É difícil responder a essa pergunta, mas com mais quatro anos de destruição, a minha sensação é de que quem melhor vai estar são os povos indígenas, porque eles têm uma capacidade de resistência maior do que nós aqui fora. Com mais quatro anos de Bolsonaro, vamos ter um país destruído. Já está meio destruído e vai ficar mais: vai aumentar a fome, o desespero das pessoas, a saúde vai decair porque vão destruir o Sistema Único de Saúde – SUS. A minha sensação é que os pobres sofrerão mais. Em uma área como a de Tumucumaque, onde estive, é muito difícil haver uma destruição, em quatro anos, de grande parte da área, por mais incentivo que o governo dê. Então, os indígenas se recolhem e têm uma vida relativamente saudável dentro das suas florestas. Nós, os pobres das periferias das cidades, vamos ficar sem saúde e sem comida e, portanto, a destruição maior vai ser aqui. Claro que não vai haver um avanço nas terras indígenas; vai haver muita morte, sofrimento e invasões, aumento do garimpo, da mineração, mas o que isso vai resultar e reverberar para fora é capaz de ser pior do que o que reverberará para dentro dos povos indígenas.

IHU – O que se pode esperar de um futuro governo Lula em relação à questão indígena e ao futuro do país? O que possivelmente mudaria em relação ao que é feito hoje em relação ao meio ambiente, ao desmatamento, a extração ilegal de recursos, ou ao que foi feito nas gestões passadas, já que o governo Lula também teve bastante problemas com essas pautas?

Carlos Marés – Teve. Por isso que em outras respostas eu dizia “a partir do Temer e antes”, porque realmente essas não foram pautas centrais nos governos do PT. No governo Lula, um pouco mais porque ele fez coisas interessantes, como [demarcação da terra indígena] Raposa Serra do Sol, o decreto quilombola. Então, não podemos negar que o governo Lula fez coisas boas para os povos tradicionais. Eu diria que fez aquém do que se esperava, mas fez coisas boas.

IHU – Também fez Belo Monte…

Carlos Marés – Fez Belo Monte, Santo Antônio e Jirau, a transposição do Rio São Francisco. Fez tudo isso e se orgulha disso. Mas o governo Dilma foi mais intenso nisso do que os governos Lula.

Em um próximo governo Lula, a minha sensação é de que ele vai precisar arrumar a casa, e acho que ele arruma. Minha sensação também é que Lula aprendeu três coisas – não sei se aprendeu em Curitiba ou se aprendeu de uma reflexão maior do primeiro governo Dilma.

Primeiro, que os movimentos camponeses são fundamentais para o Brasil e, portanto, a relação dele com a reforma agrária vai ser um pouco diferente. Se ele já tinha políticas razoáveis e boas sobre agroecologia, orgânicos, vai caminhar nesse sentido mais intensamente e isso é positivo.

A segunda coisa que acho que ele aprendeu é que os povos indígenas não são atrasados e têm um papel a cumprir na nossa sociedade do futuro. Tenho quase certeza de que ele aprendeu isso e, se aprendeu, vai pensar duas vezes antes de repetir Belo Monte, Jirau, Santo Antônio e a transposição do Rio São Francisco. Ou seja, ele vai ponderar essa ideia de preservação dos povos indígenas.

A terceira coisa é a natureza. Acho que ele aprendeu também que a questão do clima está vinculada diretamente às florestas e, com isso, as políticas desenvolvimentistas que ele continua tendo – ele é um desenvolvimentista, obviamente, e tem uma concepção desenvolvimentista – vão ser moderadas em relação à destruição da natureza.

É possível conciliar o desenvolvimentismo com a preservação da natureza? Acho que não é possível; é inconciliável, tem que mudar o ponto de vista e a forma de vida. O desenvolvimentismo não é a solução para a humanidade. Mas, no estágio em que estamos, um pouco de desenvolvimentismo – desde que não agrida tanto – é possível e acho que essa vai ser a política do Lula.

IHU – Ele vai lançar o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC 3?

Carlos Marés – Um PAC 3 mais sustentável (risos), o que é impossível, porque nenhum PAC é sustentável. Nenhuma aceleração do desenvolvimento é sustentável, mas pode ser mais sustentável do que a demarcação simplesmente como está. Mas o governo vai ter muitas dificuldades porque o país está arrasado e as políticas do Bolsonaro foram arrasadoras para as populações mais pobres.

IHU – O que se pode esperar para o futuro do país? Como repensar o imaginário político em um contexto eleitoral em que há hegemonia do PT pela esquerda e Bolsonaro do outro lado?

Carlos Marés – O Brasil está inserido no mundo e na América Latina e a minha sensação é de que estamos, neste momento do mundo, numa bifurcação. Por um lado, o poder dos EUA tem caído brutalmente. EUA e Europa estão perdendo a hegemonia e sabem disso, e estão jogando esses momentos finais com muita dificuldade. Nesse momento de dificuldade, nós, da América Latina, somos o quintal dos EUA e, portanto, a perda de hegemonia destes significa um avanço deles sobre a América Latina – como eles estão perdendo em outros espaços, não podem perder na América Latina, e a disputa aqui passa, portanto, a ser extremamente briguenta. O Brasil está vivendo esse momento de disputa briguenta e entreguismo total contra tentativas de manter processos de desenvolvimento que não sejam de entrega total para os EUA. Esse é um lado. Por outro lado, temos um avanço de países como a China e a Rússia, que é “bucha de canhão” da China.

IHU – Mesmo na guerra contra a Ucrânia?

Carlos Marés – Mesmo nesta guerra. Esta guerra, para mim, é uma tentativa de respiro da Rússia, uma tentativa de ela se manter como país hegemônico e forte, porque está perdendo totalmente a hegemonia – e a guerra reforça a posição russa e enfraquece a posição do Ocidente. A grande potência é a China, que é amiga da Rússia, que será a aliada dos chineses. Claro que não podemos desconsiderar o poder da Rússia e o que o país é e seu passado socialista, que às vezes desprezamos e achamos que é bobagem, mas aquilo organizou internamente a sociedade. A hegemonia do Oriente – chinesa, principalmente – vai causar abalos na América Latina porque a briga com os EUA acaba aproximando esta da China, que tem interesses marcantes tanto na África quanto aqui; interesses, inclusive, demográficos. Essa ideia da China de utilização dos espaços territoriais vai avançar nos próximos anos porque os chineses têm problemas demográficos e vão se expandir.

IHU – O que vai nos tornar mais dependentes do modelo agroexportador?

Carlos Marés – Não tenho dúvidas que os EUA vão querer que esse modelo se aprofunde no sentido de que continuemos não produzindo bens tecnológicos e exportando bens primários. O problema é que os primários, cada vez mais, são mais baratos, e os tecnológicos, mais caros. Essa relação é absolutamente injusta, mas essa é a consequência do entreguismo. E as direitas da América Latina vão agir como Bolsonaro age: um entreguismo total, gerando o empobrecimento das Américas. Mas isso está claramente em disputa. É só olhar para o Chile e a Colômbia. É uma disputa que não é fácil.

IHU – A justificativa constante dos governos é que o modelo agroexportador é mais rentável para o país em termos financeiros.

Carlos Marés – Sim, mas é rentável porque há uma redistribuição de renda no sentido de que retira renda dos pobres para colocar nesse modelo exportador, porque este, principalmente o agrícola, mas também o mineral, só sobrevive com financiamento público, com o dinheiro público que vem dos impostos. Como sabemos que o imposto de renda é um dos principais impostos do Brasil, de onde sai essa renda? De quem ganha salário. No Brasil, o imposto de renda é imposto salário. É esse dinheiro que é usado para financiar o agronegócio, porque este por si mesmo, sem financiamento, não seria viável e não daria renda porque paga caríssimos insumos, seja os tratadores ou os agrotóxicos. E paga para quem? Para a indústria tecnológica internacional. Qual é o preço das sementes? O preço da tecnologia internacional. Essa produção é muito cara e o pior de tudo é que não produz alimentos. A deformidade está em todos os lados. Esse dinheiro público transita em dois lugares: no agronegócio e nos bancos, porque são os bancos que ganham com isso a partir dos empréstimos do próprio governo. Então, é um mundo cão, onde quem é muito rico ganha muito dinheiro e quem é muito pobre paga para o rico ganhar muito dinheiro. Essa é a lógica, mas é a lógica do entreguismo. Isso é o que está em disputa.

IHU – A questão é para quem vamos entregar…

Carlos Marés – Para quem vamos entregar. Agora, do ponto de vista do outro lado, da China, não se pode esperar muita bondade. Entretanto, há uma compreensão – e essa é a perspectiva da China – de construção de soluções sociais. A China acabou com a fome e também tem exemplos positivos para mostrar para o mundo. Como enfrentar essa disputa com a hegemonia dos EUA e da Europa? A minha esperança é que, para enfrentá-la, se tenha que fazer uma política diferente. Agora, isso estamos para ver, assim como de que forma a América Latina reage em relação a esses dois imperialismos.

IHU – O caminho do meio, tão esperado, é possível?

Carlos Marés – Isso é muito difícil, mas há alternativas. A América Latina tem pensamento, cultura e território para construir uma barreira, pelo menos, aos imperialismos. Ao imperialismo norte-americano, com certeza. Ao imperialismo chinês, a questão é mais complexa. Mas, por outro lado, é mais factível, porque a aliança da China é com governos sociais e não com governos bolsonaristas e fascistas. Isso facilita a vida porque a conversa se torna um pouco mais aberta e de boa fé.

Foto: Marcelo Camargo | Agência Brasil

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