MPF ajuíza ação para fim do modelo de ensino por turmas multisseriadas em escolas indígenas de Paragominas (PA)

Órgão defende a implementação do ensino seriado regular, organizado de acordo com a faixa etária e níveis de conhecimento dos alunos

Ministério Público Federal no Pará

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública, com pedido de liminar, para o fim do modelo de turmas multisseriadas na rede escolar indígena da Terra Indígena Alto Rio Guamá, localizada no município de Paragominas, no sudeste do Pará. Turmas multisséries reúnem numa mesma sala de aula alunos de várias séries, com idades e níveis de conhecimento diferentes.

Ao expor o quadro de negligência dos direitos educacionais dos indígenas, o órgão ministerial defende a implementação do ensino seriado regular, com divisão de turmas de acordo com a faixa etária e níveis de conhecimento dos alunos.

A ação foi ajuizada, nesta terça-feira (14), contra a União, o Estado do Pará e o Município de Paragominas. O MPF detectou diversos problemas no ensino das escolas indígenas em razão das turmas multisseriadas, além da falta de recursos, da ausência de acompanhamento pedagógico para professores e da precariedade das instalações físicas.

Segundo o MPF, o modelo de classes multisséries, contribui para aumentar índices de evasão, repetência, analfabetismo e distorção entre idade e série do estudante. Situação presente nas escolas indígenas de Paragominas, muitas delas apenas com uma sala de aula, em que há crianças de três anos de idade estudando com alunos de 11 anos, sob supervisão de apenas um professor.

Por outro lado, conforme narra a ação, “é nítido que os professores não foram preparados pelo poder público para lidar com este tipo de turma – aliás, não é possível preparar nenhum professor para situação grave que é apresentada, pois tal agrupamento tão amplo é vedado pelas normas de regência”. No caso, a resolução da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CEB/CNE nº 2/2008), que estabelece diretrizes, normas e princípios para a Educação Básica do Campo, e veda o agrupamento de crianças da educação infantil e do ensino fundamental em uma mesma turma, justamente por reconhecer dificuldades intransponíveis para a aprendizagem dos alunos.

Quanto às instalações físicas das escolas, durante visitas em novembro de 2022, o MPF encontrou um quadro de precariedade, com escolas improvisadas, estruturas muitas vezes cedidas pela própria comunidade, com poucas carteiras, materiais didáticos insuficientes, sem banheiros e bibliotecas. Ainda encontraram locais muito quentes, com pouca luz, e escolas nas quais, em dias de chuva, é impossível ter aulas.

Além do fim do modelo de turmas multisseriadas na região, o MPF pede a condenação dos entes estatais para que, no prazo máximo de 180 dias, tomem providências para desmembrar turmas de onze escolas municipais indígenas. O MPF pede, ainda, que garantam professores para as novas classes, instalações físicas e equipamentos adequados, materiais didáticos apropriados e supervisão pedagógica aos professores, sob pena de multa diária de R$ 10 mil.

Outra solução proposta pelo órgão ministerial é que, no prazo de 30 dias, seja feita a divisão das turmas em turnos matutino e vespertino, metodologia, inclusive proposta pela comunidade, separando as séries do ensino primário e fundamental, bem como aumentando a carga horária dos professores a fim de possibilitar o atendimento dos dois turnos.

O Ministério Público pede também o pagamento de danos morais coletivos em favor dos indígenas da TI de Alto Rio Guamá no valor mínimo de R$ 100 mil.

Histórico do caso – A situação das escolas indígenas da Terra Indígena Alto Rio Guamá vem sendo acompanhada pelo MPF desde 2022, quando foi instaurado procedimento administrativo sobre as ações desenvolvidas pelo poder público referente à implementação e execução da educação escolar indígena nas aldeias.

Em junho de 2022, a Secretaria Municipal de Educação (Semec) de Paragominas negou pleito da comunidade para a divisão das turmas multisséries, sugestão oferecida pelos próprios professores, e informou sobre o desenvolvimento de um plano de ação. No entanto, em visita a cinco aldeias, após quase seis meses de implementação do respectivo plano de ação, o MPF constatou, a partir dos relatos de pais de alunos e de professores indígenas, além de inspeção nos locais, que não houve mudança alguma no ensino prestado nas comunidades.

Apesar da negativa, os próprios professores das aldeias, informalmente, passaram a fazer a divisão das turmas em dois períodos, o que em pouco tempo resultou em uma significativa melhora na aprendizagem dos alunos. Por outro lado, não houve acordo com a Semec quanto à divisão das turmas multisseriadas nas escolas indígenas, e, no último dia 30 de janeiro, cerca de 30 indígenas ocuparam, de forma pacífica, a sede da Prefeitura de Paragominas para reivindicar melhorias na área da educação em suas comunidades, em especial a divisão das turmas multisséries.

Em janeiro, o MPF enviou recomendação ao município para que fossem implementados, ainda em 2023, sistemas de ensino fundamental II e médio em todas as aldeias, para que não fosse prejudicado mais um ano letivo.

A ação civil pública foi ajuizada na Vara Federal Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Paragominas (PA), sob o no 1000888-97.2023.4.01.3906.

Íntegra da ação

Arte: Secom/MPF

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