Atentado: Outro grito. Agora, de Blumenau

Novo massacre em escola é sintoma de uma sociedade enferma. Agora, proliferam análises superficiais: bolsonarismo, educação frágil, jogos virtuais… É preciso entender as causas em todas as suas dimensões. A tarefa será árdua

por Maurício Abdalla*, em Outras Palavras

Mais um atentado bárbaro em local onde deveria reinar a paz e o cuidado. Desta vez em Blumenau. Fere nossos ouvidos mais um grito de uma sociedade doente, que nos alerta sobre a grave enfermidade de que padece.

Não é hora de acharmos que sabemos as causas e as soluções, ou de simularmos que sabemos. Não é momento para a disputa discursiva que visa agradar as expectativas de segmentos de público.

Estamos diante de fenômenos complexos que exigem múltiplas abordagens. Mas requerem, antes de tudo, humildade e preocupação real para se entender e resolver o problema de forma eficaz. Antes de pensarmos “que discurso vou fazer sobre isso?”, ou “como deverei falar sobre isso para meu público?”, devemos pensar “como entender isso?” e “como resolver isso de forma definitiva?”

A verdade é que ainda não sabemos. Ou sabemos apenas de partes. Contudo, não se monta um quebra-cabeças apenas acumulando peças. A melhor forma de contribuir para eliminar essa barbaridade é, cada um na sua especialidade, mas em conjunto, tentar entender concretamente as múltiplas determinações desse problema complexo.

Não há um só culpado; não há um só elemento de causalidade. Logo, não há soluções simples. Às vezes, fenômenos que estão relacionados podem ser, ambos, consequências de um problema maior. A tentação de culpar apenas o fascismo, o bolsonarismo, a “deep web” ou as bolhas digitais pode não ser adequada, por colocar efeitos de uma causa maior desconhecida em ordem de causalidade equivocada. Não seriam o bolsonarismo e a violência irracional que vitima crianças ambos efeitos de uma mesma causa mais complexa?

A resposta tampouco está pronta na teoria do autor que estudo ou ensino na universidade, por mais sublimes que sejam suas ideias.

Precisamos reconhecer que ainda não sabemos analisar o problema em todas suas dimensões. Culpar o governo anterior, o armamentismo, as redes sociais, os jogos digitais, as falhas da educação etc. são as respostas mais simples. Porém, só chegaremos a um bom entendimento com uma abordagem coletiva e pluridisciplinar, com rigor metodológico e crítico.

Está na hora de superar a arrogância da explicação única. Quando se quer realmente saber, reconhecer a ignorância é uma virtude, não manifestação de incompetência.

Há medidas emergenciais, é óbvio, que podem ser cobradas das autoridades e instituições. Mas não nos movamos pelo tempo das redes sociais, que exigem discursos e postagens imediatas – no “timing” certo para aumentar o impacto da manifestação – mas que aceitam o silêncio e o esquecimento nos intervalos entre as tragédias.

Valerá mais a eficácia de nossa reflexão, estudo, pesquisa, diálogo, propostas e ação política – feitos de forma contínua, rigorosa, aprofundada e, às vezes, silenciosa e anônima – do que as impressionantes imagens dramáticas e falas de efeito nas diversas mídias.

O mundo precisa mais de conserto do que de narradores.

*Filósofo e doutor em Educação, professor do departamento de filosofia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Também é membro da Rede Nacional de Assessores do Centro de Fé e Política Dom Helder Câmara (CEFEP/CNBB) e do Projeto Novos Paradigmas de Desenvolvimento (ABONG/ISER Assessoria).

Imagem: Nathan Rutkowsk

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