“Impactos climáticos têm gênero, condição social e cor”, diz Observatório do Clima

O tema foi pauta de discussão do seminário “Agroecologia e Meio Ambiente”, que aconteceu no dia 12 de maio, durante a 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária

Por Ana Carolina Vasconcelos, na Página do MST

Diferente do que comumente se pensa, as mudanças climáticas não devem ser tema de preocupação apenas de grandes conferências ou líderes mundiais. Isso porque, quem mais sofre seus impactos no cotidiano são justamente as populações mais pobres e seus territórios.

O tema foi pauta de discussão do seminário “Agroecologia e Meio Ambiente”, que aconteceu no dia 12 de maio, durante a 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária, em São Paulo.

Durante o encontro, o Secretário Executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini, enfatizou que a crise ambiental tem como principal consequência a alteração da nossa capacidade de produção.

“Todos os mecanismos que existem no planeta, da chuva, da seca, do vento, da polinização, do calor, do frio, vão mudar. Portanto, aquelas áreas ou aquele modo de vida ao qual a gente se adaptou vão ser afetados”, explica.

Como vivemos em uma sociedade marcada por diferenças econômicas, de gênero e de raça, Márcio Astrini destacou que as contradições entre as classes também demarcam quem e como são sentidos os impactos desse cenário.

Dessa forma, a população mais pobre, mulheres e negros enfrentam cotidianamente os desdobramentos da crise ambiental, mesmo não sendo esses os principais sujeitos a desenvolver as atividades que a geraram.

Os impactos das mudanças climáticas têm gênero, condição social e cor. Existe um levantamento que diz que os 10% dos mais ricos do planeta provocaram metade do problema. Enquanto isso, 50% dos mais pobres contribuem com apenas 15% do problema. Os que contribuíram menos são justamente os que pagam a maior parte da conta”, argumentou.

“É como se você fosse chamado para um almoço em um restaurante, chegasse lá da metade para o final, não consumisse nada e tivesse que pagar pela conta”, complementa.

Para exemplificar essa contradição, Márcio Astrini resgata que no mesmo período em que a cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi atingida por fortes chuvas, que destruíram casas, parte da estrutura da cidade e deixou mais de 100 mortos, aconteceu um furacão nos Estados Unidos da América. Ele nos convida a refletir sobre qual contexto teve maior amparo.

“O que vai ser reconstruído primeiro? As casas de moradia popular em um país pobre como o Brasil ou as casas de moradia num país rico como os EUA? É disso que se trata. As perdas vão ser iguais para todo mundo. Mas, o impacto é diferente”, explica.

Na avaliação do secretário do Observatório do Clima, a resposta para esse contexto passa necessariamente pela organização e mobilização popular.

“Precisamos corrigir o que nos trouxe até aqui. Mas, quem causou o problema não quer mudar porque não vai ser impactado e ficou rico causando o problema. O único jeito é a pressão popular”, concluiu.

O lugar da agroecologia

Também participaram do seminário Fernanda Savisk, da Associação Brasileira de Agroecologia, e Bárbara Loureiro do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Loureiro ressaltou que o sistema capitalista tem buscado dar respostas para a crise ambiental, porém, sob a ótica do lucro e não das necessidades das pessoas e dos territórios. Dessa forma, ela acredita que a agroecologia ajuda a desmentir algumas premissas falsas estimuladas pelas grandes empresas.

A primeira é a ideia de que o ser humano é naturalmente destruidor e, portanto, precisaria existir porções de natureza intocáveis “protegidas” dos seres humanos. A segunda, que é consequência da anterior, é a de que podemos artificializar o ecossistema e pensar uma agricultura sem base com a natureza.

“Temos sentido muito nos territórios da Reforma Agrária a combinação das formas clássicas de exploração, como o agronegócio e a mineração, com as grandes agendas do clima, como a descarbonização e a agenda verde das empresas”, relatou durante o encontro.

Bárbara Loureiro contou que, entre as consequências dessa combinação, está o aumento do controle dos territórios. Para ela, é necessário criar uma nova governança e superar a lógica na qual se debate as questões do meio ambiente atualmente.

“Precisamos formular uma nova governança sobre o clima, porque a atual sugere a ideia de que tem que sentar todo mundo junto para discutir o futuro comum do planeta. Dessa forma, é negado o conflito de interesses que existe, com a ideia de que está todo mundo no mesmo barco. Se está todo mundo no mesmo barco, o colete salva-vidas não está disponível para todos”, defende.

Ela ainda destacou que, para o MST, o enfrentamento da crise ambiental passa necessariamente pela discussão sobre o acesso à terra, pela agroecologia como perspectiva de construir novas relações humanas, baseadas na cooperação, e pelo cuidado com os bens comuns da natureza.

Em concordância, Fernanda Savisk, da Associação Brasileira de Agroecologia, enfatizou que a agroecologia é o caminho para a superação do atual modelo.

“Para superarmos a crise sanitária, econômica, política e ecológica, precisamos discutir os sistemas agroalimentares, que parta da agroecologia, e não reformas do sistema hegemônico. A agroecologia não é uma alternativa, ela é o caminho e isso é revolucionário”, concluiu.

*Editado por Fernanda Alcântara

Foto: Sara Sulamita

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