ES: Comunidade de Guaibura, em Guarapari, pede criação de unidade de conservação

MPES também move processo contra empresa que quer instalar condomínio de luxo em área de APP

Por Fernanda Couzemenco, Século Diário

A comunidade de Guaibura, na região da Enseada Azul, em Guarapari, divulga um abaixo-assinado em que pede a transformação de seu território em uma unidade de conservação, de forma a frear a especulação imobiliária que ameaça sua existência.

A petição destaca a ameaça que uma Área de Preservação Permanente (APP) sofre, com a tramitação do licenciamento de um condomínio de luxo para 460 pessoas, o que equivale ao triplo da população local.

“O Morro de Guaibura (…) é um local rico em diversidade e ponto estratégico de conservação de Mata Atlântica à beira-mar. O Morro possui um manguezal e aquíferos que permitem a procriação de aves nativas e migratórias. Além disso, representa um ponto de contato com o sagrado de diversas religiosidades (…) é fundamental para a sobrevivência da comunidade pesqueira tradicional que habita em seu pé, a Vila Guaibura”.

O condomínio, chamado “Residencial Guaibura”, é de propriedade de Jan Siepierski, informa a petição, que chama a atenção para o fato do empreendedor querer instalar a grande obra em uma península, que tem apenas uma entrada e saída. “Além disso, a região não conta com coleta e tratamento de esgoto adequados, de forma que os corais e os mariscos do pé do morro estão ameaçados, junto com as praias que rodeiam o morro”.

O pedido de desapropriação para criação de uma unidade de conservação é direcionado à Prefeitura de Guarapari, Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Governo do Estado, Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), Ministério do Meio Ambiente e Governo Federal.

A posse do terreno, agora reivindicada pelos Siepierski, afirma a comunidade, não tem comprovação. “Nenhum dos ditos proprietários ao longo dos anos teve, efetivamente, posse sobre o local. A posse é da comunidade e assim a comunidade quer que permaneça”.

A polêmica sobre a posse do terreno consta no processo aberto pelo MPES sobre o caso – Nº 2022.0025.3298-86 –, que também aborda a ameaça ao meio ambiente e à sobrevivência da comunidade. A ação foi aberta após publicação de reportagem neste Século Diário, em novembro de 2022, às vésperas de mais uma audiência pública referente ao licenciamento em curso para o empreendimento.

Em um primeiro momento, o promotor de Justiça Otávio Guimarães de Freitas Gazir solicitou à prefeitura informações como “planta baixa indicando a quantidade de unidades, área ocupada, posicionamento em relação aos marcos naturais, etc.”, bem como “se houve avaliação das repercussões e impactos paisagísticos do empreendimento e eventuais medidas adotadas para mitigação do impacto” e sobre a caracterização ambiental da região, incluindo “tipo de vegetação do local, fauna, a fauna de migração transeunte e (…) Área de Preservação Permanente”.

Colaborando com a investigação, uma denúncia foi anexada ao processo do MPES, com informações do laudo da vistoria realizada pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) realizada em 2007. Sobre o Morro da Guaibura, o laudo afirma que “o patamar inferior caracteriza terrenos de marinha sujeitos à ação contínua de maré, do espraiamento das ondas e/ou ‘spray marinho’. É constituído por costão rochoso que em alguns pontos forma poças de marés e, em outros, possibilita desenvolvimento do ambiente com características de manguezal, com flora e fauna estabilizados”.

A denúncia também afirma que “a comunidade pesqueira de Guaibura, povoou a região há mais de 90 anos e, por decisão coletiva, não povoou o morro da Guaibura por se tratar de espaço comum e área de preservação, e reuniu-se em 2009 para limpeza da região de mangue do morro, de forma que a biodiversidade da região aflorou ainda mais nos últimos anos, contando com a presença de Guaiamuns”.

Aborda ainda a mudança no Plano Diretor Municipal (PDM), em 2016, o que mudou a classificação da área para Zona de Uso Turístico (ZTU), tornando possível construções de prédios de até quatro pavimentos. “Nessa brecha, fizeram o projeto de construção no morro”, explica Juliana Paradela, que assina a denúncia anexada ao processo do MPES.

Foi um “retrocesso legislativo na proteção ambiental”, acentua, pois a prefeitura “nunca adequou seu plano diretor para demarcar áreas com função de preservação permanente”, tampouco “promoveu estudos antropológicos que permitissem compreender a dinâmica sócio-histórica da região, composta por povo originário que vive da pesca e preserva hábitos tradicionais de origem afro-indígena”.

“Ressalta-se ainda que existe uma consciência coletiva de que o morro se trata de um espaço público. A placa, no entanto, foi removida e substituída, sem explicações, por outra que avisa a propriedade particular do local. É importante que o Ministério Público investigue (…)”, acrescenta.

Apesar do licenciamento ainda não ter sido concluído e do processo do MPES, o empreendimento já está sendo anunciado para vendas. “Tudo o que eles estão postando sobre venda, é sobre um empreendimento que não tem licença”, alerta.

Moradora de Guaibura, a jovem Thaís de Almeida Santos complementa: “Chamou muita atenção, nessas propagandas, é que eles falam que vai ter uma piscina por apartamento. No EIV [Estudo de Impacto de Vizinhança] não fala isso. Depois a imobiliária apagou o vídeo que fala das piscinas”.

Ela também manifesta a indignação dos moradores com a invisibilização do manguezal e da mata preservada sobre o morro, com toda a sua fauna e flora nativas. “Pedimos outro estudo ambiental por conta disso. O Ministério Público está cuidado disso”.

Para acessar o abaixo-assinado, clique aqui.

Para mais informações sobre o Movimento Não Mexe no Morro da Guaibura, clique aqui.

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