Empresa não cumpriu condicionantes e pode causar danos ao meio ambiente
Ministério Público Federal em Minas Gerais
O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que faça a revisão da autorização para licenciamento ambiental – ALA concedida à Mineração Serra do Lopes Ltda, responsável pela Mina do Lopes, localizada no município de Santa Bárbara (MG), em razão do descumprimento das condicionantes impostas ao empreendimento, que fica próximo ao Parque Nacional da Serra da Gandarela. O MPF pede ainda que o instituto decida de forma fundamentada, e com respeito à garantia ao contraditório, sobre o cabimento ou não do cancelamento da autorização para licença ambiental concedida e solicita ser informado, no prazo de sessenta dias, sobre o acatamento da recomendação ou as razões para eventual negativa.
A recomendação aponta que a autarquia deve fazer a revisão mediante a aplicação do art. 16 da Instrução Normativa ICMBio nº 10/2020, que regulamenta o procedimento para participação do ICMBio em licenciamentos ambientais, e autoriza a revisão da ALA quando há violação ou inadequação de quaisquer recomendações ou normas legais relacionadas às atividades ou empreendimentos autorizados, bem como omissão ou falsa descrição de informações relevantes que subsidiaram a sua expedição, ou ainda algum fato superveniente ao pedido da própria autorização.
Um relatório feito em março deste ano pela equipe técnica do ICMBio lotada no Parque Nacional da Serra do Gandarela, que analisou 10 das 11 condicionantes que a Mineração Serra do Lopes Ltda tinha que cumprir em razão da obtenção da ALA, demonstrou que nenhuma das analisadas foi cumprida pela empresa, sendo oito classificadas como não atendidas e duas como parcialmente atendidas. Complementando o relatório, foram produzidos vídeos retratando presença de lama em cursos d’água no interior da unidade de conservação, e de um sump (um tipo de filtro ou fossa) colapsado próximo à portaria da Mina do Lopes, que é uma bacia escavada no solo com a função de conter água proveniente de chuvas e do lençol freático.
Denúncias – Em 2024 o MPF recebeu representações que denunciavam danos ao patrimônio histórico e à população de Caeté (MG), além da ocorrência de assoreamento e poluição de cursos de água, com impacto sobre o Parque Nacional da Serra do Gandarela e às comunidades de André do Mato Dentro e Constantino/Cruz dos Peixotos em Santa Bárbara (MG), pelas atividades da Mina do Lopes.
Diante do quadro, o MPF cobrou o ICMBio a respeito das providências tomadas após ter ciência do relatório que apontou o não cumprimento das condicionantes. A autarquia respondeu que, apesar da instrução normativa ICMBio nº 10/2020, não vislumbrou necessidade de adoção de tais ações, tendo em vista que o órgão aguarda a resposta do empreendedor sobre as questões levantadas.
Além disso, afirmou que, apesar do relatório feito pela equipe do parque, esse documento possui natureza preparatória para manifestação posterior do ICMBio, não retratando a visão institucional definitiva a respeito da situação de atendimento das condições específicas da licença.
Dúvidas desde o início – O MPF apura desde 2020, no âmbito de um inquérito civil, eventuais danos ao patrimônio espeleológico (cavernas naturais) e cultural, ao meio ambiente e ao Parque Nacional da Serra do Gandarela, em razão da implantação da Mina do Lopes. O empreendimento foi originalmente implementado pela empresa Mineração Nossa Senhora do Sion Ltda., que, em 2022, foi sucedida pela Mineração Serra do Lopes Ltda.
Em razão de sua proximidade com o Parque Nacional da Serra do Gandarela, a licença ambiental concedida ao empreendimento minerário ficou condicionada à aprovação do ICMBio. Desde sua instalação, o empreendimento gerou questionamentos da sociedade civil organizada sobre a extensão dos danos ambientais que poderia causar.
Em 2021, a unidade do ICMBio responsável pela gestão do parque fez uma análise do pedido de licença ambiental apresentado pela Mineração Nossa Senhora do Sion Ltda e, na época, produziu um parecer pelo indeferimento do empreendimento. A análise indicou subdimensionamento das áreas de influência da mina, o que não permitia adequada interpretação sobre os possíveis impactos ao parque. Também apontou que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) já apontava para impactos aos recursos hídricos e ao patrimônio hidrológico protegido pela unidade de conservação, além das incertezas quanto aos impactos ao patrimônio espeleológico, concluindo tecnicamente pelo indeferimento do licenciamento da atividade.
Mas a conclusão técnica não foi acatada pela Divisão de Manifestação Técnica para Autorização do Licenciamento Ambiental da autarquia que, em setembro de 2021, deu parecer favorável ao licenciamento ambiental com a imposição de 11 condicionantes. Em seguida, o empreendimento recebeu a autorização para o licenciamento ambiental, que foi assinada pelo presidente do ICMBio em setembro de 2021.
O procurador da República Angelo Giardini de Oliveira, responsável pela recomendação, ressalta que a Constituição da República, para assegurar a efetividade do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, estabelece um verdadeiro regime jurídico constitucional dos espaços territoriais especialmente protegidos, que englobam as áreas de preservação permanente, contendo mandamentos explícitos e vinculantes ao Poder Público em todas as suas esferas.
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Imagem: Reprodução do GEDA/UFMG