O Brasil não é Brasil, são Brasís e mesmo nesses Brasís as desigualdades de toda ordem estão estabelecidas. Creio ser altíssima a probabilidade de que em países onde existe hierarquia e diversidade étnico-racial, a raça da classe dominante subalternize as demais. Muitos habitantes, sobretudo, dessa camada de mais alta renda, sentem “vergonha alheia” e alguns chegam talvez até sentir um certo asco em relação da população mais subalternizada, embora o próprio status do qual usufruem dependa, justamente, dessa situação humanamente injusta. Por outro lado, é quase consenso que mudanças climáticas são inerentes ao planeta[1], uma vez que o Universo (ou multiverso), está em eterno movimento, o que inclui choques de meteoros e deslocamentos de galáxias[2].
Entretanto, nesta época em que há percepção de que está ocorrendo uma aceleração das mudanças climáticas – alguns falam “emergência climática” -, grande parte do mundo está voltando o olhar para a Pan-Amazônia [3] , tudo indica, porém, sem lembrar que houve floresta, praticamente, em todo o planeta e que foram derrubadas por força da ganância humana[4] . Esse novo focar na Amazônia não será bom? Talvez sim. Será que lembram que na Amazônia está a maior floresta tropical do mundo? Que a Amazônia não é só floresta? Que floresta não é só um aglomerado de árvores e sim “(…) um ecossistema complexo e interconectado, onde solo, água, plantas, animais e microrganismos interagem formando um sistema vivo e dinâmico (…)” [5] .
Pode ser agregador lembrar, também, que nela corre o maior rio do mundo (em comprimento e volume d’água); que na Amazônia (BR-PA) está o maior aquífero do planeta que é o Sistema Aquífero Grande Amazônia (SAGA); o maior arquipélago de água doce do mundo é o Arquipélago de Anavilhanas (BR-AM); o maior arquipélago fluvial-marítimo do planeta, o Arquipélago do Marajó (BR-PA); e, lembrar, ainda que o ponto mais alto do Brasil é o Pico da Neblina, está na Amazônia? Sim, estamos na Amazônia brasileira, onde quase 70 % da população é negra, ou seja, preta + parda, ou seja, afro-indígena, indígena, ou seja, não-branca, cuja maioria está aglomerada nas periferias urbanas e é fortemente vitimada pelo Racismo Ambiental. Aliás, acredito importante registrar que, em termos macro, é possível sinalizar que a própria região, ou seja, a Amazônia toda, sofre com o Racismo Ambiental, uma vez que a hegemonia econômica-política-ambiental-cultural está no sudeste-sul do país e que essa Amazônia, há muito, vem sendo considerada simples ‘reserva ´ de recursos naturais[6].
Então, ao refletirmos sobre a adaptação climática e o que poderá ser debatido e aprovado na COP 30, prevista para ocorrer na Amazônia, é importante considerar os fatores que agravam os desafios “vitais” envolvidos. Entre eles, destaca-se:
- o governo “Trumpredador” dos EUA, até então, não confirmou a sua participação;
- os conflitos no Médio Oriente estão intensos, com tendência para se alastrarem;
- o Brasil, por sua vez, não descarta a possibilidade de exploração de petróleo na foz do rio Amazonas;
- existem expectativas quanto à ampliação do deletério crédito de carbono.
Por outro lado, é importante lembrar que muitas decisões tomadas em COPs anteriores não têm sido efetivamente implementadas, muitas vezes por confrontarem interesses de países produtores de combustíveis fósseis — os mesmos que frequentemente financiam essas conferências. Ou seja, o que já está mal pode ainda piorar, uma vez que a natureza – inclui nós -, não aguenta crescimento infinito.
Lembremos que as chamadas ‘fontes de energia limpas’ incluem a energia solar e eólica, que não são tão limpas, pois necessitam de extração de minerais não renováveis [7] . No Brasil há forte utilização de energia hidrelétrica e, talvez no futuro, a maior fonte poderá ser o biogás, o que inclui aproveitamento de dejetos humanos, através de biodigestores.
Embora em algumas regiões da Amazônia a paisagem urbana seja marcada por palafitas insalubres — tornando mais pertinente falar de enchentes do que de secas —, pode ser mais realista considerar soluções como canoas, rabetas ou até pedalinhos, em vez de automóveis ou bicicletas, no caso de agravamento da situação climática.
–
*Engenheira Agrônoma; ativista do movimento negro, principalmente do de mulheres negras; uma das fundadoras do CEDENPA-Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará e da Rede Fulanas NAB-Negras da Amazônia Brasileiras. Junho de 2025
[1] Pensar na “era do gelo”
[2] Há quem garanta a inevitabilidade do extermínio de todos os seres vivos (inclui, logicamente, a humanidade), motivado por esses choques.
[3] Áreas amazônicas de Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa (Departamento da França, ou seja, Europa, na Amazônia), Peru, Venezuela e Suriname
[4] “Humanos demasiadamente humanos” (citando-parafraseando Nietzsche
[5] https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=floresta+n%C3%A3o+ %C3%A9+s%C3%
B3+um+aglomedado+de+%C3%A1rvores
[6] E o Nordeste, um forte fornecedor de mão-de-obra
[7] Solar: silício e o alumínio, mas também são importantes o cobre, o índio, o cádmio, o gálio e o telúrio , entre outros; eólica: cobre, ferro, alumínio, zinco e terras raras / neodímio e disprósio; há aumento de procura por lítio, cobalto e níquel para sistemas de armazenamento de energia (https://www.google.com/search?q=energia+e%C3%B3lica+precisa+de+quais+minerais&…)
–
A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo. Foto: Tamara Saré | Agência Pará
