Tania Pacheco
“Com o reconhecimento de que a Justiça tardou, mas para que corresponda à expectativa do dito popular de não falhar, determino que publique-se. Registre-se. Intime-se e Cumpra-se.”
Foi com essas palavras que a juíza Emília Gondim Teixeira, do Tribunal de Justiça da Bahia, encerrou e mandou publicar sua sentença que – esperamos – encerrará décadas de luta da população de Santo Amaro da Purificação contra empresas que a tornaram famosa não por ser a terra natal de Bethânia e Caetano, mas pelos seus habitantes dramaticamente contaminados por chumbo.
Era o dia 4 de novembro de 2025, quase 20 anos após a realização do I Seminário Brasileiro contra o Racismo Ambiental, que aconteceu de 28 a 30 de novembro de 2005 na Universidade Federal Fluminense. Foi ali que Raimundo Konmannanjy, então representante da ONG Acbantu e da Rede Kôdya, da Bahia, denunciou o que se passava na cidade onde durante três décadas, de 1960 a 1990, a escória de chumbo chegou a ser usada pela Prefeitura para tapar buracos nas ruas e pavimentar até parques infantis.
No pequeno texto abaixo, Fernanda Giannasi – sem dúvida a maior lutadora brasileira contra a contaminação por amianto, mas não só – resume para nós alguns pontos da sentença que merecem destaque. E, ao final, apresentamos dois links importantes: o primeiro, para a íntegra da sentença da juíza Emília Gondim Teixeira; o segundo, para o depoimento de Raimundo Konmannanjy, no Campus do Gragoatá, em novembro de 2005.
De acordo com Fernanda Giannasi:
“A sentença reconhece a responsabilidade civil e ambiental das empresas Plumbum Comércio e Representações Ltda., Trevisa Investimentos S.A. e Yara Brasil Fertilizantes S.A. (sucessoras da COBRAC – Companhia Brasileira de Chumbo) pelos danos socioambientais causados no município de Santo Amaro/BA, em razão da contaminação por metais pesados – sobretudo chumbo e cádmio – lançados no ar, no solo e nas águas do Rio Subaé, entre as décadas de 1960 e 1990.
A decisão afirma que houve contaminação ambiental e humana em larga escala, atingindo trabalhadores e moradores do entorno da fábrica, pescadores e marisqueiras, além de comunidades periféricas e vulneráveis de Santo Amaro.
O episódio é qualificado, na decisão, como um caso paradigmático de racismo ambiental, ressaltando que o passivo tóxico e os efeitos à saúde recaíram desproporcionalmente sobre populações negras e pobres, historicamente marginalizadas e desassistidas pelo Estado. O racismo ambiental foi reconhecido como dimensão agravante da injustiça socioambiental, reforçando o dever de reparação integral e a necessidade de medidas de justiça ambiental.
A juíza prolatora da decisão também critica a chamada “irresponsabilidade organizada”, ou seja, o uso de sucessivas alterações societárias e fusões para escapar da responsabilização ambiental. As empresas foram consideradas solidariamente responsáveis, com base na doutrina do poluidor-pagador e no entendimento do STJ sobre a natureza das obrigações ambientais (Tema 1204/STJ e Súmula 623).
A sentença condenou as rés ao pagamento de indenização por danos morais e materiais às vítimas da contaminação, majorada no caso de crianças e pessoas negras. Além disso, determinou a reparação ambiental das áreas afetadas e a criação de um fundo para promoção de medidas de educação e qualificação profissional para as comunidades afetadas.”
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Leia ou baixe a íntegra da sentença 0001334-69.2011.8.05.0228-1762309049186-161338-sentenca“>AQUI.
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Foto: Imagem capturada de vídeo do programa Domingo Espetacular, da Bandeirantes, disponível na íntegra AQUI.
