Governo estadual delegou a consulta prévia, livre e informada do empreendimento à empresa interessada, violando o direito das comunidades
Ministério Público Federal no Estado do Piauí
O Ministério Público Federal (MPF) expediu recomendação à Companhia de Portos, Terminais e Hidrovias do Piauí S.A. (Porto Piauí) e à secretarias estaduais, para que anulem as Portarias Conjuntas nº 1/2025 e 2/2025, que tratam da Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) referente ao Terminal de Uso Privado de Luís Correia (PI). O MPF identificou falhas no processo de consulta, que está sendo conduzido sem a participação ativa das comunidades. Além da empresa, a recomendação foi enviada à Secretaria das Relações Sociais (Seres), à Secretaria de Planejamento (Seplan), à Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh).
A Recomendação nº 19, de 4 de dezembro de 2025, enfatiza que a CPLI é um direito fundamental das comunidades tradicionais e um dever do Estado, e esta obrigação não pode ser delegada a terceiros, sobretudo à empresa interessada na implementação do empreendimento, conforme jurisprudência internacional. O MPF argumenta, ainda, que deve ser assegurado às comunidades tradicionais o direito de decidir de maneira livre e consciente, por meio de processos e de representantes por elas definidos, com base em todos os dados do empreendimento, inclusive por meio de fontes independentes.
O MPF constatou que o Plano de Trabalho da Consulta foi elaborado em conjunto pela Seres, Seplan, Semarh e Porto Piauí, e construído de forma unilateral pelo Estado, sem a participação ativa das comunidades tradicionais. O Plano de Trabalho também enumerou as comunidades tradicionais situadas na área de influência do empreendimento e as instituições que as representam, em violação aos direitos de as comunidades se autodeclararem tradicionais e de decidirem quem as representa.
Conforme apurado pelo MPF, o Grupo de Trabalho (GT) instituído para condução da consulta prévia é composto, predominantemente, por representantes da Porto Piauí, que é a responsável pela implantação do Terminal de Uso Privado, e não conta com representantes das comunidades tradicionais e membros da comunidade científica. O GT possui competência para elaborar o Plano de Trabalho, identificar as comunidades tradicionais e avaliar a compatibilidade das ações com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Recomendação – Diante das falhas, o MPF recomendou ao governo estadual que assegure às comunidades tradicionais o direito à autodeclaração, à autonomia para definir o processo de consulta (incluindo a elaboração do Plano de Trabalho) e o direito de decidir quem as representa. Também foi recomendado o fornecimento às comunidades tradicionais de todos os dados do empreendimento — em especial os riscos e impactos econômicos, sociais, culturais e ambientais — por meio de fontes independentes, integrando, inclusive, membros da comunidade científica (Universidade Federal do Delta do Parnaíba – UFDPar e Universidade Estadual do Piauí – UESPI) ao processo.
A recomendação foi encaminhada ao secretário de Estado das Relações Sociais, ao secretário de Estado do Planejamento, ao secretário de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos e ao Diretor-Presidente da Porto Piauí. Os destinatários têm o prazo de dez dias para informar se acatarão ou não a recomendação.
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Arte: Secom/PGR
