TI Sawré Muybu: “Esse é o primeiro passo de vitória, mas a gente vai continuar nossa luta”

No Cimi

Ontem (19), mais de uma década após o início do processo de demarcação da Terra Indígena (TI) Sawré Muybu – com 178 mil hectares, localizada nos municípios de Itaituba e Trairão, no Pará -, a Funai deu continuidade ao procedimento, com a publicação do “Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação”, que reconhece o território do povo Munduruku.

“Essa vitória é fruto da união de nosso povo, que se fortaleceu para buscar os parceiros que apoiam a nossa luta e que tiveram uma contribuição muito grande. Nessa data especial que é o Dia do Índio, ele [o presidente da Funai] não assinou [o relatório] porque ele quis, mas sim por conta da pressão que há muitos anos a gente vem fazendo. Esse é o primeiro passo de vitória, mas a gente vai continuar nossa luta. Sabemos que depois vem a contestação, e sabemos dos outros projetos que vão impactar nossa vida e nossa cultura, como a hidrelétrica que querem construir no Tapajós. Estamos lutando pelo território e por uma coisa boa para a humanidade. Queremos que as pessoas juntem-se a nós porque estamos lutando por um futuro melhor que é de todos”, afirma Rozeninho Saw Munduruku.

Hidrelétrica

A demarcação da TI Sawré Muybu é uma antiga reivindicação do povo Munduruku, que vive no rio Tapajós há gerações. No entanto, o processo estava paralisado desde 2013, justamente porque a Funai não havia publicado o relatório circunstanciado que, na prática, confirma a ocupação tradicional dos índios neste território. Na época, a então presidente interina da Funai, Maria Augusta Assirati, chegou a declarar que o relatório estava aprovado, mas não tinha sido publicado por envolver outros interesses do governo.

Nos últimos anos, por pressão do setor energético, uma hidrelétrica foi colocada no caminho da demarcação de Sawré Muybu. Desde maio de 2011, São Luiz do Tapajós passou a figurar como obra prioritária do governo. Se construída, ela poderá alagar parte do território indígena, comprometendo a sobrevivência física e cultural do povo Munduruku, devido aos impactos sobre a flora, a fauna e sobre os locais sagrados do povo, e forçando a remoção da população que habita o território de Sawré Muybu. De acordo com o Artigo 231 da Constituição Federal, é vedada a remoção de grupos indígenas de suas terras, salvo em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, e garantindo o retorno imediato logo que cesse o risco.

“A publicação do relatório é realmente um passo importante para que a demarcação prossiga rumo aos momentos finais, sendo considerada uma importante vitória que honra a tradição de luta do povo Munduruku e premia o esforço de articulação realizado pelo povo no sentido garantir seus direitos constitucionais e contra a construção de hidrelétricas no rio Tapajós”, afirma Danicley de Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace.

Autodemarcação

Em 2014 e 2015, os Munduruku realizaram a autodemarcação da TI Sawré Muybu, confirmando os limites da terra de acordo com o que consta no próprio relatório que agora foi publicado. Nesse processo, eles exigiam não só o reconhecimento de sua existência, mas também de seus direitos: “A publicação do Relatório ocorre depois de muita luta e pressão do povo Munduruku, que nunca desistiu de lutar por seus direitos. A demarcação da TI Sawré Muybu é importantíssima não só por garantir a proteção do território e da floresta, mas por assegurar a prevalência dos direitos indígenas em relação aos projetos hidrelétricos nos rios da Amazônia”, completa Aguiar.

Para os Munduruku, Sawré Muybu é muito mais do que um simples pedaço de terra. É lá que eles têm a base de sua cultura e alimentação, e é o rio Tapajós que abriga diversos locais sagrados que poderão ser destruídos caso a construção da hidrelétrica ocorra. A publicação do relatório foi um importante passo no sentido de garantir a proteção do território, mas ainda é preciso lutar para que a demarcação seja finalizada e para que o governo desista dos planos de construir as dezenas de hidrelétricas previstas para a bacia do Tapajós.

“A gente conserva a floresta andando nela, por terra, debaixo dela, e não só de cima, onde muitas vezes não dá para ver nada. A autodemarcação para nós é isso, é cuidar da floresta, impedir que tirem madeira e conservar os frutos e a caça”, afirmou o cacique Juarez Saw Munduruku, em entrevista ao Greenpeace em 2015, explicando que o direito à terra é fundamental para a sobrevivência de seu povo.

Mais terras indígenas rumo à demarcação

Outras três terras indígenas também tiveram seus Relatórios Circunstanciados publicados no Diário Oficial ontem: a TI Ypoi/Triunfo, do povo Guarani Ñandéva, no Mato Grosso do Sul; a TI Sambaqui, do povo Guarani Mbyá, no Paraná; e a TI Jurubaxi-Téa, dos povos Baré, Tukano, Baniwa, Nadöb, Pira-Tapuya, Arapaso, Tariana, Tikuna, Coripaco e Desana, no Amazonas.

Além delas, o Ministério da Justiça publicou ontem também as portarias declaratórias de outras duas terras indígenas, ambas no estado do Mato Grosso (MT): a TI Estação Parecis, do povo Pareci, no município de Diamantino, com 2.170 hectares, cujo relatório havia sido publicado pela Funai no ano de 2010; e a Terra Indígena Kawaiva do Rio Pardo, do povo Kawahiva, no município de Colniza, com área aproximada de 411.844 hectares, quase dez anos depois da publicação do relatório de identificação. Ainda assim, o governo de Dilma Rousseff é um dos que menos demarcou terras indígenas na história do Brasil.

Adaptado de texto do Greenpeace

 

 

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