Primeiro de seu povo a fazer doutorado em Goiás, indígena busca auxílio para concluir curso

Ele precisa se manter em Goiânia para estudar, mas ainda não recebe bolsa. Ercivaldo Damsõkekwa busca intercâmbio entre a forma de aprender de seu povo e das escolas tradicionais

Por Vanessa Martins, G1 GO

O primeiro do povo Xerente a se tornar mestre e cursar doutorado na Universidade Federal de Goiás (UFG), o indígena Ercivaldo Damsõkekwa, de 39 anos, procura ajuda financeira para continuar os estudos. Segundo ele, a pesquisa exige viagens à aldeia onde morava, o que toma boa parte do seu tempo e o impede de conciliar os estudos com trabalho. Ainda sem receber uma bolsa de estudos, ele começou uma campanha na internet para receber ajuda.

O mestre em estudos interculturais é considerado pioneiro na tribo onde nasceu. Não só pela sua atitude diferenciada de buscar conhecimento na universidade, mas pelo seu nome: Damsõkekwa.

“Significa ‘aquele que abre o caminho’ ou quem faz a trilha. Meu avô que me deu esse nome. Acho que ele sabia o que estava fazendo quando me chamou assim, porque essa é a minha missão”, disse.

No doutorado, Ercivaldo estuda maneiras de unir a educação indígena e da escola tradicional. Ele atua como professor na tribo e quer facilitar o acesso aos seus conterrâneos à educação de assuntos além daqueles já aprendidos na cultura xerente.

“Desde os mestrado estou estudando formas de inserir a educação das escolas na educação indígena, porque, atualmente, esse ensino das escolas atropela tudo da forma como aprendemos lá. Como educador indígena, quero conseguir entender os contextos e desenvolver esse relacionamento entre eles”, detalhou.

Alfabetizado na aldeia

O pesquisador contou que foi alfabetizado em português aos 19 anos, ainda na aldeia. Desde então ele se interessou pelo conhecimento além das fronteiras do seu povo. Conseguiu se formar em magistrado e, com acesso à leitura, entrou na faculdade de estudos interculturais. Em seguida, engatou na pesquisa de mestrado e não parou mais.

“Minha vontade é partilhar o que eu venho aprendendo aqui com eles, poder levar isso de forma acessível e contribuir, com a nossa história, para educação nas escolas. Fico muito feliz de poder levar esse conhecimento para o meu povo. É uma responsabilidade muito grande ser protagonista nisso e motivar outras pessoas a fazerem como eu e ingressarem na universidade”, completou.

Além de buscar maneiras de mudar a forma como a escola tradicional chega ao povo Xerente, ele também contou que quer documentar a cultura do seu povo, hoje repassada de forma oral. Ele disse que ainda enfrenta resistência dos anciãos, mas que está empenhado em encontrar uma maneira de expandir o acesso ao conhecimento do seu povo.

Apesar da grande motivação, Damsõkekwa contou que tem dificuldades financeiras de se manter nos estudos. Com aluguel de R$ 650 por mês e as viagens até a tribo Xerente, no Tocantins, custando entre R$ 300 e R$ 500, ele teme não conseguir concluir o curso.

“Qualquer ajuda é bem-vinda. Eu preciso também de um notebook para conseguir estudar e, para a pesquisa, vou precisar filmar entrevistas e gravar imagens para fechar um documentário. Por isso comecei a campanha, para conseguir me manter no doutorado e voltar orgulhoso para a minha casa”, disse.

O coordenador do Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da UFG, Luis Felipe Kojima Hirano, informou que “por conta dos cortes de verba na educação, a turma de doutorado de 2016 e 2017 ficaram sem bolsas do governo federal”. Também, segundo ele, o estudante foi contemplado com uma bolsa que ainda passa por processo de implementação. Por isso, o xerente só deve começar a receber o auxílio no segundo semestre.

“Durante todo o primeiro semestre, Ercivaldo teve que usar suas próprias economias, o auxílio alimentação da reitoria e contar com apoio dos docentes para pagar o aluguel, o material didático e condução com vistas a se manter no curso”, afirmou.

Diversidade na universidade

Orientador da pesquisa de Damsõkekwa, o doutor em antropologia e professor pela UFG Alexandre Herbetta avaliou que manter o xerente nos estudos é importante para toda a comunidade acadêmica. Segundo ele, além de ser um investimento na educação como um todo, é uma forma de assegurar a diversidade na universidade, que demorou a ser conquistada.

“A questão da falta de recurso mostra um pouco o panorama atual, uma ameaça a essas conquistas dos últimos anos de políticas púbicas de acesso e permanência das população indígena. Ao mesmo tempo, é uma possibilidade de ter um doutor indígena, com uma pesquisa fundamental”, afirmou.

Ercivaldo Damsõkekwa é o primeiro indígena a fazer doutorado na UFG (Foto: Vanessa Martins/G1)

Comments (2)

  1. É justo apoiar o sonhos de Ercivaldo, também beneficiando o seu povo.
    Só faltou um pequeno e imprescindível detalhe: nome completo, número de ontz e banco par que possamos ajudá-lo

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