Dono de uma fortuna de R$ 89 milhões, Eunício de Oliveira tinha 24 fazendas em 1997 e, após pressionar camponeses, agora possui 107 propriedades em Goiás
Por Luís Indriunas, em De Olho nos Ruralistas
O presidente do Senado, Eunício de Oliveira (MDB), é o principal representante da bancada ruralista no Ceará. Em 1998, ele registrou 6.948 hectares em 24 fazendas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Este ano, candidato à reeleição, soma pelo menos 14.473 hectares, divididos em 107 propriedades.
O total de hectares delas certamente é maior, pois o senador não informou o tamanho de 4 desses 107 imóveis. Somente um deles, em Corumbá de Goiás, foi declarado por R$ 1,8 milhão. Mais do que todos os bens rurais declarados vinte anos atrás: R$ 1,4 milhão. Hoje, eles somam R$ 19 milhões.
Ao contrário do que costuma ocorrer com políticos, que mantêm o preço defasado de compra nas declarações, o senador tem reajustado periodicamente os valores de suas propriedades.
Todas essas terras estão concentradas nos municípios de Corumbá de Goiás e Alexandria, a cerca de 100 quilômetros de Brasília, num grande complexo fundiário denominado Santa Mônica, que conta até com uma aeroporto próprio.
Como Eunício conseguiu essa expansão fundiária?
‘A LEI NÃO DISCIPLINA ELE’
O documentário Passarim (2003), de Camila Freitas, produzido quando o complexo Santa Mônica tinha “apenas” 46 propriedades, explica a pressão econômica e política que tornou o cearense Eunício um grande fazendeiro em Goiás. A cineasta ouviu seis pequenos proprietários de terra dos municípios. Eles disseram que os aliados do presidente do Senado pressionam com a visita constante de corretores, o fechamento de estradas para inviabilizar a passagem dos pequenos produtores e a “escapada” constante de gado de suas propriedades para comer a produção das áreas vizinhas, entre outros subterfúgios.
“Faz raiva para pessoa vender o terreno para ele”, explica seu Eliseu, um dos entrevistados.
Após conseguir o terreno, os homens começam o trabalho. Nas palavras de seu Eliseu:
– Ele quer boi, então destrói barraca, destrói casa, destrói fruteira, destrói a floresta. Ele não respeita a lei e a lei não disciplina ele.
Quem resiste acaba ficando isolado, como conta a agricultora dona Fiica, que acabou, junto com o marido, cedendo e vendendo sua terra: “Nós fomos os últimos que saíram. Ficou difícil. Nem companheiro para ajudar a movimentar o serviço nós não arranjávamos mais, não. Os que estão lá cuidam sozinho”. Ela trabalhava também como merendeira na escola rural que foi fechada.
A declaração de bens do parlamentar mostra que, das 107 propriedades inseridas na Santa Mônica, 59 são de propriedades com menos de 50 hectares. Em 2015, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupou as fazendas de Eunício, questionando a maneira como essas terras foram adquiridas.
Eunício conta com o apoio declarado do governo goiano, que asfaltou e deu o nome do senador para a estrada que passa pelas suas terras. A placa sumiu posteriormente: homenagear pessoas vivas em obras públicas fere o princípio constitucional da impessoalidade.
SENADOR É O ‘ÍNDIO’ DA ODEBRECHT
O braço econômico do presidente do Senado avança na área da vigilância, crescendo com as benesses do poder público. As empresas da holding Remmo Participações têm contratos com a União que somam R$ 700 milhões. São contatos com a Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Banco Central e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), mesmo que a Constituição proíba esse tipo de contratação.
Eunício transita bem entre vários políticos e consegue rapidamente o que quer. Em plena campanha, o Senado aprovou, em tempo recorde, um empréstimo de R$ 80 milhões para o município de Caucaia, reduto eleitoral do candidato.
Alvo de duas investigações do Ministério Público Federal, o senador se beneficia do foro privilegiado. Com o apelido de “Índio” na lista da Odebrecht, ele é acusado de receber R$ 2 milhões em propinas. Outros R$ 2 milhões teriam ido para a campanha a governador, em 2014, por meio da JBS.
A situação do senador é um pouco mais confortável que de outro ruralista do Ceará, o deputado federal, Aníbal Gomes, seu companheiro de partido, que virou réu no Supremo Tribunal Federal (STF).
ANÍBAL: A FACE MAIS TRUCULENTA DOS GOMES
Deputado desde 1995, Aníbal Gomes foi denunciado por receber, em 2008, R$ 800 mil de uma empresa naval para agilizar pagamentos da Petrobras, segundo delação de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da empresa. Em outro processo, o próprio Aníbal confirma que maquiou sua prestação de contas. No total, ele conta com sete denúncias de desvios de dinheiro.
Enquanto isso, para a Justiça Eleitoral, Aníbal se declara cada vez mais pobre. Em 2010, ele tinha um patrimônio de R$ 6,8 milhões. Este ano, seus bens somam R$ 893,5 mil, segundo a declaração no TSE.
Gomes já foi acusado de mandar a assassinar seu primo, João Jaime Ferreira Gomes. Então prefeito de Aracaú, ele foi executado com um tiro no rosto em Fortaleza. Seis anos antes, o prefeito gravara uma mensagem denunciado os seus primos Aníbal, Amadeu Gomes e Manoel Duca por desvios de recursos públicos e dizia estar sendo ameaçado. O inquérito foi aberto, mas não concluído.
Em 2016, após seu patrão ser chamado de ladrão, o motorista do deputado, Manoel Deodato da Silva, socou um dos que reclamavam contra os desvios do erário público em pleno aeroporto de Fortaleza.
Esse modo rude de ser se reflete na relação com os povos indígenas. Em 2017, o deputado entrou com um decreto legislativo para pedir a sustação da demarcação da Terra Indígena Tapeba, em Caucaia. Enquanto isso, articulava a nomeação de Tanúsia Maria Vieira para administrar a Fundação Nacional do Índio (Funai) do Ceará, o que provocou uma tensa ocupação da sede local.
Irmão de Aníbal, o deputado estadual Manoel Duca, o “Duquinha”, já incentivou a violência. Em 2015, após o assassinato a tiros do radialista Gleydson Carvalho no estúdio de uma rádio em Camocim (CE), Duca foi à tribuna da Assembleia Legislativa, sorrindo, dizer que Gleydson “não valia nada”.
Duquinha foi condenado pela Justiça, em 2018, por desvio de R$ 3,8 milhões que recebeu para sua empresa da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Ele é candidato à reeleição, sempre em dobradinha com Aníbal.
Ambos são primos do candidato à Presidência pelo PDT, Ciro Gomes, que busca manter distância dos familiares. Aníbal apoia o primo.
DEPUTADO GANHA R$ 19 MILHÕES EM 12 ANOS
Apoiador de Eunício de Oliveira, o deputado federal e candidato à reeleição Genecias Noronha (SD) possuía R$ 960 mil em 2008, quando foi candidato à reeleição como prefeito de Parambu. Dez anos depois, ele acaba de declarar R$ 19 milhões. Na campanha de 2006, Genecias não declarou nenhum bem. O deputado, pecuarista e criador de cavalos é dono de 1.598 hectares de terras, a maior em Panambu, seu reduto eleitoral e onde a família domina há anos.
Usar o erário público em benefício próprio é uma das tônicas do parlamentar. Em 2017, ele gastou R$ 96 mil em aluguel de aviões, mesmo tendo o próprio jatinho, segundo a declaração de bens no TSE.
Amante de cavalos, ele é suspeito de comprar uma égua, que ganhou várias competições, mas, pelo que dizem, não pagou.
A lista de deputados ruralistas com suspeitas de corrupção no Ceará continua. Ex-secretário de Relações Internacionais do estado, Balman (PDT) é suspeito de receber propina da JBS. Danilo Forte (PSDB) era presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), quando a Controladoria Geral da União (CGU) identificou desvios de R$ 500 mil. Por fim, seu colega de partido Raimundo Matos é acusado de receber R$ 100 mil em propinas da JBS, segundo delação.
Veja a relação de ruralistas do Ceará.