Defensorias públicas buscam mediar conflito em reintegração de posse promovida pela UFC

A universidade reivindica judicialmente a posse de área ao lado do Campus do Pici, onde vivem cerca de 260 famílias

DPU/CE

Na tarde desta terça-feira (16/10), foi realizada reunião de trabalho, na sede da Defensoria Pública da União no Ceará (DPU/CE), para debater os impactos de uma possível remoção de cerca de 260 famílias que vivem na comunidade Açaí, que fica no bairro Antônio Bezerra, em Fortaleza.

O encontro, de caráter extrajudicial, foi resultado da ação conjunta dos defensores públicos Edilson Santana, no exercício da Defensoria Regional de Direitos Humanos (DRDH) da DPU/CE, e José Lino Fonteles da Silveira, supervisor do Núcleo de Habitação da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPE-CE). Estiveram presentes cerca de quarenta moradores da comunidade, que foram representados por Antônio Evaldo Silva Braga.

Na reunião, as instituições analisaram possíveis soluções e definiram providências a serem adotadas diante do despejo determinado em ação judicial em curso ajuizada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), que reivindica a reintegração de posse da área ocupada. Já há decisão favorável à UFC.

O procurador geral da UFC, Paulo Antônio de Menezes Albuquerque, concordou em dialogar com a Administração Superior da universidade a fim de alargar os prazos para a execução da decisão. A DPU já requereu à Justiça Federal a realização de uma audiência judicial para que futuros entendimentos constem nos autos da ação movida pela universidade.

Nesse prazo, secretarias do Município de Fortaleza e do Estado do Ceará vão ser oficiadas para informar a DPU/CE sobre projetos que possam abranger a área ocupada pela Comunidade Açaí, a exemplo da implementação das Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) em Fortaleza. O compromisso tranquiliza momentaneamente os moradores, que estavam ameaçados por um despejo iminente.

A tratativa teve ainda a participação do Ministério Público do Estado do Ceará (11ª Promotoria de Justiça Cível), da Secretaria das Cidades e da Coordenadoria Especial de Políticas Públicas de Direitos Humanos do Governo do Estado e da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Desenvolvimento Social de Fortaleza.

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No dia 04 de outubro, a Defensoria Pública da União no Ceará (DPU/CE) apresentou requerimento de audiência judicial para que sejam discutidas alternativas para realocação das famílias da comunidade Açaí e para evitar remoção forçada destas até que ocorra a audiência judicial. No ato, o órgão pedia ainda que fosse apresentado um plano de desocupação da área. A medida visa à proteção das famílias que ocupam o terreno, em face da expedição de mandado de reintegração de posse em favor da UFC.

Antes, a Defensoria Pública da União já havia pedido a suspensão do cumprimento do mandado de reintegração de posse até que fosse realizado um plano de desocupação. Porém, a Universidade Federal do Ceará não concordou e exigiu a imediata reintegração de posse do terreno. Em decisão proferida ontem (03/10), o juiz Jorge Luiz Barreto, da 2ª vara federal, acatou o pedido da DPU e suspendeu, em medida cautelar, a reintegração de posse pelo prazo de 10 dias.

Durante esse prazo, o magistrado estabeleceu que cabia à Defensoria Pública da União “estabelecer tratativas de ordem pessoal e/ou institucional com a  Procuradoria Federal especializada e com a Administração Superior da Universidade Federal do Ceará, com vistas a verificar a possibilidade de celebração de alguma solução conciliatória no que diz respeito ao prazo e à forma de cumprimento da ordem judicial de reintegração de posse”. A reunião de trabalho realizada nesta terça (16/10) se deu a partir desse compromisso.

A propriedade questionada, quatro hectares localizados na ala oeste do Campus do Pici, é reivindicada pela Universidade Federal do Ceará (UFC). O intuito da DPU é evitar ocorrência de graves danos em caso de uso da força policial no cumprimento do mandado, uma vez que se trata de uma área já marcada pela violência, e para garantir a segurança dos que habitam no local, que possui presença massiva de mulheres, crianças, adolescentes e idosos. Muitas crianças estudam em escolas próximas à comunidade e seriam imediatamente prejudicadas pela remoção forçada.

A DPU reivindica que, no lugar das medidas coercitivas, sejam traçadas estratégias pacíficas que contemplem a realocação efetiva das famílias assistidas, a exemplo da inscrição no Programa Minha Casa Minha Vida ou do pagamento do aluguel social.

Para tanto, foi requerida a participação, na audiência judicial, de órgãos como Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e do Desenvolvimento Social, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Habitacional, Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente, Instituto de Planejamento de Fortaleza, Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, Secretaria das Cidades e Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social do Estado, Caixa Econômica Federal e Defensoria Pública Estadual.

O Defensor Regional de Direitos Humanos em exercício no Ceará, defensor público federal Edilson Santana Filho, em petição em defesa da comunidade, reivindicou que “a remoção só seja realizada após o remanejamento acordado entre a família para local adequado ou pagamento de aluguel social – uma vez que, no conjunto dos direitos fundamentais consagrados pela Constituição, deve-se observar que tais famílias são vítimas do próprio Estado, que não cumpriu com sua obrigação de prover direitos básicos”.

A comunidade
A comunidade Açaí, no Antônio Bezerra, é formada por cerca de 260 famílias em situação de vulnerabilidade social, a maioria proveniente de áreas de risco de Fortaleza. Entre elas, 117 estão inscritas no Cadastro Único do Governo Federal, 77 são beneficiárias do Programa Bolsa Família e seis estão contempladas com o benefício de prestação continuada, conforme relatório social juntado ao processo.

Entenda o caso

A Universidade Federal do Ceará ajuizou, no dia 22 de julho de 2015, ação de manutenção/reintegração de posse na Justiça Federal contra as famílias que ocupavam área localizada ao lado do Campus do Pici.

Ao longo do processo, a DPU contestou a propriedade do terreno pela UFC e ingressou com recursos para impedir a reintegração de posse. Porém, em decisão proferida em 19 de janeiro de 2016, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região negou o pedido da DPU ao julgar o agravo de instrumento interposto pela Defensoria contra a decisão do Juízo da 2ª Vara Federal no Ceará, que havia deferido a liminar de manutenção ou reintegração de posse em favor da UFC,

No dia 07 de setembro de 2018, A DPU solicitou à Justiça a suspensão de medidas coercitivas durante a reintegração de posse. Em decisão proferida no dia 13 de setembro, o juiz Jorge Luiz Barreto, da 2ª Vara Federal, determinou a expedição de mandado de reintegração de posse em favor da UFC e a intimação da universidade para que se manifestasse sobre a pretensão da Defensoria Pública da União para que fosse realizado um plano de desocupação, impedindo assim a remoção coercitiva dos moradores.

No entanto, em memorando emitido em 21 de setembro, acrescentado ao processo, a Universidade Federal do Ceará negou o pedido da DPU para a realização de um plano de desocupação e exigiu a reintegração de posse imediata do terreno.

Ainda assim, no último dia 03 de outubro, a DPU requereu a audiência judicial para que sejam discutidas alternativas para realocação das famílias da ocupação Açaí. No mesmo dia, o juiz Jorge Luiz Girão Barreto, da 2ª Vara Federal, acatou o pedido da DPU e suspendeu, em medida cautelar, a reintegração de posse pelo prazo de dez dias, que venceu no último dia 15 de outubro.

Fazendas resultantes do processo de colonização expulsaram guaranis de seu território. Foto: Guilherme Santos /Sul21

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