Novo grupo de extrema-direita do MP defende vigilância e punição a pais e professores por “ideologia”

Novo grupo conservador do MP poderia ser mais um Ministério de Bolsonaro

Por André Zanardo, no Justificando

Na vanguarda do atraso, membros do Ministério Público correm atrás do Governo Federal para disputar as narrativas mais autoritárias e conservadoras do Brasil. No final do ano passado, um grupo de 128 integrantes das carreiras dos Ministérios Públicos, essencialmente do MPF, criaram uma associação que traduz o que seria a vertente bolsonarista dentro do parquet. MPPS, Ministério Público Pró-Sociedade é a sigla dos novatos da política de extrema direita no órgão dos promotores de justiça.

Coordenado por Renato Barão Varalda, Promotor de Justiça (MPDFT) e Adriano Alves Marreiros, Promotor de Justiça Militar, a carta de inauguração do grupo tem a relatoria de Ailton Benedito de Souza, Procurador da República.

Do que se pode empreender da carta, o grupo é assumidamente defensor de valores religiosos cristãos, morais e “da família”, críticos do “garantismo penal” e de qualquer ativismo judicial do campo progressista. Estão dispostos a puxar o coro para fazer a voz do MP clamar por “mais justiça”, como se novidade fosse defender aumento de penas, mais prisões e endurecimento penal. São críticos das ideias progressistas e querem travar uma cruzada política e jurídica para aniquilar qualquer ideologia que não sejam a deles próprios.

Apesar de não haver menção qualquer a apoio ao Governo Bolsonaro, o grupo conseguiu, em sua carta de apresentação, levantar as principais bandeiras hasteadas por Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018. Certos de que a guinada à direita terá uma jornada útil de pelo menos mais quatro anos, a conhecida tendência política direitista do MP nacional aglutinou promotores com coragem o suficiente para enterrarem seus nomes juntos com a ideia deste novo governo.

CONTRA IDEOLOGIAS

No manifesto inaugural do grupo há uma extensa tentativa de se explicar uma guerra às ideologias, de forma genérica, como se qualquer forma de ideologia devesse ser exterminada por não seguir qualquer preceito de racionalidade. De forma curiosa, o grupo se diz não ideológico, já demonstrando de antemão que 128 promotores juntos não são capazes de entender o conceito de ideologia.

Em rápida pesquisa no dicionário Aurélio, podemos entender que “ideologia” é: “Conjunto de ideias, convicções e princípios filosóficos, sociais, políticos que caracterizam o pensamento de um indivíduo, grupo, movimento, época, sociedade.” Logo, quando se juntam 128 promotores e promotoras para defender um conjunto de ideias políticas, podemos entender este kit de ideias por ideologia.

Mas se não por estupidez, o que de fato não acredito, então por má-fé, estes afirmam em suas considerações, “conservadorismo não é ideologia, mas expressão da realidade pautada na ordem, na liberdade e na justiça”.

IDEOLOGIA DE GÊNERO

De outra sorte, críticos de que homens e mulheres possam ter identidades de gênero e orientação sexual distintas da heteronormalidade cristã, os promotores anunciam a caçada à comunidade LGBTI+. Em um desses parágrafos introdutórios o grupo diz que “ideologia de gênero é experimento totalitário de engenharia social que destrói a identidade natural do ser humano, usando as escolas como laboratórios e os estudantes (crianças e adolescentes) como cobaias”. Em outro confuso enunciado, o grupo faz críticas à possibilidade de crianças e adolescentes entrarem em contato com qualquer conteúdo dito pornográfico nas escolas, fazendo séria alusão ao mito do “Kit Gay” nas escolas.

ESCOLA SEM PARTIDO

Dentro desse contexto normatizador da vida escolar, os promotores fazem a cama para que ideias autoritárias como o “Escola Sem Partido” prosperem. Defendem a utilização de câmeras nas dependências escolares e, inclusive, querem punir criminalmente professores por praticarem “ideologia” nas salas de aula.

“O Ministério Público deve proteger a dignidade da criança e do adolescente de ‘práticas pedagógicas’ abusivas, entendidas, entre outras condutas, a estimulação sexual, a doutrinação ideológica, política ou partidária, ainda que a pretexto educacional, promovendo a responsabilização administrativa, cível e criminal dos atos abusivos.”

Se não bastasse o absurdo de condenar professores, a extrema-direita do MP abre brechas para que o órgão possa “defender” os pais dos alunos cujos professores que “pratiquem ideologia”.

“O Ministério Público, diante de indícios de alienação parental com participação de professor ou autoridade escolar, deverá tomar as medidas adequadas à proteção dos direitos da criança e do adolescente e ao exercício do poder familiar, guarda ou tutela (art. 2º, caput, parágrafo único da Lei nº 12 .318/2010).”

CENSURA PRÉVIA AS FAKE NEWS

Incomodados com a reorganização da sociedade civil em combate as “fake news”, sejam elas organizadas pela imprensa, órgãos públicos ou grandes empresas de tecnologia como Google e Facebook, os promotores fazem longa defesa ao “direito humano à comunicação”.

Em um aparente lapso de sensatez, os direitos humanos voltam à cena no 18˚ enunciado: “O Ministério Público deve combater toda forma de censura ilícita às liberdades de informação , opinião e expressão nos meios de comunicação social, inclusive na internet.”

COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DAS VÍTIMAS

Absorvidos pelos delírios bolsonaristas, estes promotores e promotoras se comprometem em solicitar ao Conselho Nacional do Ministério Público, ao Conselho Nacional dos Procuradores-gerais de Justiça e aos Ministérios Públicos que instituam, nas suas respectivas estruturas, o que eles dizem ser uma “comissão de defesa dos direitos humanos das vítimas”. Representantes do grupo MPPS já se reuniram com o ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, para quem entregaram um documento solicitando também a criação de uma Secretaria de Direitos Humanos das Vítimas.

CONTRA O ABORTO

Ideologicamente, esses promotores agem como uma espécie de TFP (Tradição, Família e Propriedade) e defendem que o Ministério Público deve proteger especialmente “a família como base da Sociedade”, deve defender a “inviolabilidade dos direitos à vida, desde a concepção, à liberdade, à igualdade, à propriedade”.

É certo que um grupo que contém 128 promotores e promotoras ainda é uma minoria dentro das estruturas dos Ministérios Públicos do país. Infelizmente, é sabido também, que as ideias deste grupo não representam somente o pensamento da minoria da instituição. Gostaria de saber o que acham os outros promotores.

*André Zanardo é ativista pelos Direitos Humanos, advogado e diretor de redação do portal de notícias Justificando.

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