MPF recomenda que Exército pare de discriminar mulheres em processos seletivos para oficiais temporários

Seleções para cargos militares temporários, que são destinados a profissionais de diferentes áreas do conhecimento, contêm dispositivos que beneficiam claramente candidatos do sexo masculino

O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), recomendou ao Comando da 4ª Região Militar do Exército Brasileiro que adéque seus próximos editais e seleções públicas, de forma a evitar práticas e exigências discriminatórias contra candidatas mulheres em benefício de candidatos homens.

Para o MPF, os processos seletivos conduzidos pelo Exército desrespeitam não só a Constituição Federal, como também diversos tratados internacionais de que o Brasil é signatário [Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Convenção Americana sobre os Direitos Humanos-Pacto de São José da Costa Rica e Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres], os quais, de forma unânime, proíbem qualquer forma de discriminação em razão do sexo.

A investigação do MPF teve início em 2018. Em agosto daquele ano, a 4ª Região Militar, que tem sede em Belo Horizonte (MG), publicou aviso público para a seleção de interessados em prestar serviço militar temporário no cargo de Oficial Técnico Temporário, destinado a profissionais com formação superior em diversas áreas, entre elas, Medicina, Odontologia, Direito, Engenharia Ambiental, Engenharia Civil, Nutrição, Magistério, Fisioterapia, Administração e Pedagogia. Pouco tempo após a divulgação do concurso, uma candidata representou ao MPF apontando a desigualdade no tratamento concedido a homens e mulheres.

Uma das disposições do edital previa, por exemplo, pontuação para candidatos egressos dos Centros e/ou Núcleos de Preparação de Oficiais da Reserva, do Estágio de Instrução e Preparação para Oficiais Temporários, do Curso de Formação de Cabos e do Curso de Formação de Soldados, todos eles reservados exclusivamente a pessoas do sexo/gênero masculino.

Questionado, o Exército justificou-se alegando que tais cursos se destinam somente a homens porque inexiste Serviço Militar Obrigatório para mulheres.

Para o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Helder Magno da Silva, “Essa justificativa, de forma alguma, respondeu aos nossos questionamentos, que se basearam no motivo de o edital destinar pontuação relacionada a tais cursos de formação, sabendo o Exército, de antemão, que somente candidatos do sexo masculino seriam beneficiados”.

Condições ginecológicas

Os critérios desfavoráveis às mulheres, no entanto, não se restringiram a tal pontuação.

O Aviso de Seleção nº 03, de 08 de agosto de 2018, também dispôs que, na fase de Inspeção de Saúde, seriam eliminadas as candidatas que apresentassem qualquer uma das condições ginecológicas de uma lista de 14 – uma delas, inclusive, descrita de maneira absolutamente genérica (“outras afecções ginecológicas que determinem perturbações funcionais incompatíveis com o desempenho das atividades militares”), enquadrando-as como “incapacidade física”, contra apenas um único impedimento semelhante para os homens.

“Chama a atenção, por exemplo, que o Exército relacione a neoplasia maligna de mama como impedimento para as candidatas mulheres, mas não a relaciona como impedimento para os candidatos do sexo masculino, esquecendo-se de que homens também estão sujeitos ao câncer de mama. É de se perguntar: qual a razão do discrímen? Porque um câncer ginecológico seria motivo de eliminação e o câncer de próstata sequer é citado?”, questiona Helder Magno.

Em 14 de junho do ano passado, a Diretoria de Saúde do Exército, admitindo a amplitude desproporcional e não razoável de algumas dessas condições, chegou a informar ao MPF que, nos próximos editais de seleção de militares, iria estabelecer para os candidatos do sexo masculino causas de incapacidade física equivalentes às das mulheres.

No entanto, cerca de quatro meses depois, em outubro de 2019, o Comando da 4ª Região Militar divulgou novos editais sem nenhuma modificação: o processo seletivo continuou a relacionar causas de “incapacidade física” para as mulheres sem nenhuma paridade ou correspondência com doenças ou problemas de saúde que também afetam o sexo masculino.

Para o Ministério Público Federal, trata-se de uma escolha discricionária do Exército em conferir tratamento desigual a candidatos homens e candidatas mulheres, violando não só o direito humano fundamental da igualdade entre os sexos, como a própria legislação.

No documento encaminhado ao Comando da 4ª Região Militar, o MPF recomendou que, nos próximos concursos, sejam extintos a pontuação em virtude de participação em cursos disponíveis somente para candidatos do sexo/gênero masculino, como também o rol de condições de saúde ginecológicas genéricas e sem qualquer paridade com semelhantes condições de saúde que afetam os homens.

Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

nineteen + eighteen =