Presidente da Câmara disse que indígenas ‘ficaram usando algum tipo de droga’ em ato na Câmara. Para Talíria Petrone, associar rituais indígenas ao uso de drogas é racismo.
Por Elisa Clavery, G1
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), enviou nesta quarta-feira (23) uma interpelação extrajudicial à deputada Talíria Petrone (RJ), líder do PSOL, em razão de a parlamentar tê-lo acusado de racismo ao se manifestar o confronto entre indígenas e policiais nesta terça-feira, 22.
Lira estabeleceu prazo de cinco dias para a deputada dar explicações para “tamanha ofensa”. Segundo ele, uma recusa em responder à solicitação “poderá ser interpretada, em eventuais ações cível e penal, como deliberação tácita” de ofensa à honra.
Nesta terça-feira, indígenas protestavam em frente à Câmara contra um projeto de lei que, segundo opositores, dificulta a demarcação de terras indígenas e retira direito dos povos. Pelo menos seis pessoas ficaram feridas, três policiais – dois legislativos e um PM – e três indígenas.
Após o episódio, do plenário, o presidente da Casa defendeu a ação da polícia. Disse serem inaceitáveis as tentativas de invasão da Câmara e que é preciso debater a demarcação e a mineração em terras indígenas.
“Para ser fiel, na semana passada, alguns representantes dos índios chegaram aqui e invadiram o Congresso Nacional, subiram ao teto das cúpulas e ficaram usando algum tipo de droga, fumando e dançando aqui em cima. Com muita paciência, nós negociamos, e a Polícia Militar, com a Polícia Legislativa, veio à Casa e recompôs a ordem para aquele momento”, disse Lira na sessão de terça-feira.
Em seguida, Talíria Petrone reagiu à fala do presidente da Casa.
“É lamentável que ele chame os rituais que são parte das culturas indígenas — do alto do seu racismo ele não deve conhecer de uso de drogas — de dança sei-lá-o-quê”, respondeu a deputada na sessão de terça-feira. “Lamentavelmente, ouvimos palavras de cunho racista proferidas na Presidência da Câmara.”
A interpelação
No documento encaminhado à deputada, Lira diz que a acusação é “extremamente grave”, já que racismo é considerado um crime inafiançável e imprescritível.
“Desprovida de qualquer fundamento, a imputação tem a clara intenção de macular minha honra”, escreve.
Após receber a interpelação, Talíria Petrone disse em plenário na sessão desta quarta-feira que a interpelação é “inaceitável” e “absurda”.
“Uma ação como essa de intimidação é um ataque à própria Câmara, é um ataque à nossa possibilidade de falar, de denunciar, de representar os nossos eleitores”, disse a deputada.
“Ao ler a interpelação extrajudicial, o conteúdo dela, está óbvio que o senhor desconhece o que é racismo”, afirmou.
A deputada disse, ainda, que “associar rituais indígenas ao uso de drogas é também racismo”.
Lira respondeu dizendo que não houve, do seu ponto de vista e das assessoras que consultou, “nenhum tom racista”.
“A senhora não vai explicar a mim, vai explicar se cometeu ou não [ofensa à honra]. Como está dizendo que não, nós seguiremos o trâmite processual devido. Só não vamos faltar com respeito no plenário desta Casa. Mas, independente de qualquer coisa, a minha fala não foi falta de respeito a qualquer minoria, nem a qualquer etnia”, disse Lira.
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Arthur Lira, ao centro, festeja sua eleição para presidente da Câmara com festa numa casa no Lago Sul, área nobre de Brasília, para cerca de 300 pessoas. Foto: DIDA SAMPAIO / ESTADÃO CONTEÚDO / El País