Eliane Potiguara: a voz da mulher indígena do Brasil

Doutora honoris causa desde o fim de 2021, a educadora é considerada a primeira escritora indígena a publicar um livro no país

Por Carol Correia, na Conexão UFRJ

A segunda personagem da série Nossas Honoris, em homenagem ao Dia Internacional das Mulheres, é Eliane Potiguara: professora, poeta, empreendedora social, contadora de histórias, mãe, avó. Defensora dos direitos humanos, a escritora é embaixadora da paz pela Organização das Nações Unidas (ONU). Além de fundadora do Grupo Mulher-Educação Indígena (Grumin) e membro do Enlace Continental de Mujeres Indígenas de las Americas (Ecmia), a intelectual é graduada em Letras e licenciada em Educação pela UFRJ.

Eliane foi a primeira mulher indígena a publicar um livro no Brasil, o clássico A terra é a mãe do índio, em 1975Posteriormente publicou mais 5 obras, entre poesias, ficção e um manual de alfabetização para o povo indígena, além de participar de uma série de ontologias poéticas. Seu poema “Identidade indígena” é um marco da literatura brasileira.

Nós, povos indígenas,
Queremos brilhar no cenário da História 
Resgatar nossa memória 
E ver os frutos de nosso país, sendo divididos 
Radicalmente 
Entre milhares de aldeados e “desplazados” 
Como nós

Em 1990, Eliane Potiguara foi a primeira mulher indígena a obter uma petição no 47º Congresso dos Índios Norte-Americanos, no Novo México, para ser apresentada à ONU. Por isso, participou por muitos anos da elaboração da Declaração Universal dos Direitos Indígenas,  em Genebra.

No fim de 1992, a obra A terra é a mãe do índio foi premiada pelo Pen Club da Inglaterra, no mesmo momento em que Eliane e o jornalista Caco Barcellos eram citados na lista dos marcados para morrer, anunciados no Jornal Nacional, da TV Globo, por terem denunciado esquemas duvidosos e violação dos direitos humanos e indígenas. 

Em 1995, na China, no Tribunal das Histórias Não Contadas e Direitos Humanos das Mulheres/Conferência da ONU, Eliane Potiguara narrou a história de sua família, que emigrou das terras paraibanas nos anos 1920 por ação violenta dos colonizadores, e as consequências físicas e morais dessa violência à dignidade histórica de seu bisavô, Chico Solón de Souza, avós e descendentes. Contou, ainda, o terror físico, moral e psicológico pelo qual passou ao buscar a verdade, além de sofrer abuso sexual, violência psicológica e humilhação por ser levada pela Polícia Federal, por estar defendendo os povos indígenas, seus parentes, do racismo e da exploração.

A condecoração da UFRJ é motivada pelo fato de a escritora evocar memórias e experiências como indígena, trazendo sua ancestralidade, sua cultura e seus protestos para a literatura brasileira. Ela é considerada combatente pelos direitos humanos, representante das reivindicações dos povos indígenas em instâncias nacionais e internacionais − lutadora por direitos das mulheres na prática fundadora de um feminismo indígena.

“Pensar a poesia em Eliane Potiguara é reconhecer a construção da diferença, pois se trata de uma poesia em que a identidade literária se constrói à luz das tradições, como quer a voz da enunciação indígena”, afirma Graça Graúna, crítica literária, também potiguara.

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