Fiadores da Agrishow são os mesmos da bancada ruralista

Organizado por associações mantenedoras da Frente Parlamentar da Agropecuária, evento “desconvidou” ministro de Lula para dar palanque a Bolsonaro; os patrocinadores Bradesco, Santander e Sicredi integram cadeia de financiadores do Instituto Pensar Agro

Por Bruno Stankevicius Bassi, em De Olho nos Ruralistas

Em sua 28ª edição, a Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação — mais conhecida como Agrishow — não faz nenhuma questão de esconder sua filiação ao bolsonarismo. Previsto para acontecer entre os dias 1º e 5 de maio, em Ribeirão Preto (SP), o maior evento agropecuário do país ganhou as manchetes nesta semana, após o ministro da Agricultura Carlos Fávaro revelar à CNN Brasil ter sido “desconvidado” da cerimônia de abertura.

Segundo Fávaro, a organização da Agrishow preferiu privilegiar a participação de Jair Bolsonaro (PL), dando ao ex-presidente seu primeiro palanque público após ter retornado ao país, no início de abril. Em troca, foi oferecida ao ministro de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a opção de falar no segundo dia do evento, em uma mesa dividida com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) — a face institucional da bancada ruralista no Congresso.

Fávaro recusou:

— Sem nenhum rancor, compreendo as entidades. Eu fui desconvidado talvez para evitar algum mal-estar. Foi pedido se não seria melhor eu ir no dia 2. Eu entendi o recado, compreendo. Em outra oportunidade, eu visito o Agrishow com muito carinho. Tudo no seu tempo.

Além de organizar a Agrishow, as “entidades” citadas pelo ministro de Lula são também integrantes da cadeia de financiamento do Instituto Pensar Agro (IPA), o braço logístico por trás da FPA. São elas: a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), a Sociedade Rural Brasileira (SRB), a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp) e a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

Conforme revelado pelo dossiê “Os Financiadores da Boiada: como as multinacionais do agronegócio sustentam a bancada ruralista e patrocinam o desmonte socioambiental“, publicado em julho de 2022 pelo De Olho nos Ruralistas, cada uma das 48 associações mantenedoras do IPA contribui com verbas mensais, que são aplicadas na operação da máquina de lobby ruralista.

As associações, por sua vez, são compostas por 1.078 empresas privadas e mais de 69 mil associados individuais — entre sojicultores, pecuaristas, usineiros e algodoeiros, além de multinacionais como as produtoras de agrotóxicos e sementes transgênicas Bayer, Basf e Syngenta, as processadoras de soja Cargill, Bunge, ADM e Louis Dreyfus; os frigoríficos JBS e Marfrig e indústrias do setor alimentício como Nestlé e Danone.

AGRISHOW FEZ CAMPANHA ABERTA PARA BOLSONARO EM 2022

Depois de dois anos sem a realização de eventos presenciais por conta da pandemia, a 27ª edição da Agrishow, realizada entre 25 e 29 de abril de 2022, ficou marcada como primeiro grande ato de campanha de Jair Bolsonaro na disputa pela reeleição. Com apoio explícito do agronegócio, o ex-presidente participou da cerimônia de abertura do evento e fez um discurso atacando o Supremo Tribunal Federal (STF) e os povos indígenas.

Semanas antes, a corte havia colocado em pauta o julgamento sobre a aplicação do “marco temporal” na demarcação da Terra Indígena Guyraroká, no Mato Grosso do Sul. Segundo essa tese, só teriam direito à demarcação as etnias que consigam comprovar a ocupação ininterrupta da área desde 05 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.

Na ocasião, Bolsonaro disse que não cumpriria a decisão do STF caso os ministros não aprovassem o Marco Temporal. “Ou entrego a chave para o Supremo, ou não vou cumprir”, afirmou, sob aplausos de dirigentes de sindicatos rurais e associações do agronegócio. “Se eles [ministros] acham que podem fazer melhor, que se candidatem. Que sejam a chamada terceira via”.

Após as ameaças de Bolsonaro, a votação do Marco Temporal foi adiada. Conforme revelado pelo De Olho nos Ruralistas, o ex-deputado Neri Geller (PP-MT), que chancelou a indicação de Carlos Fávaro ao Ministério da Agricultura, admitiu que o adiamento era fruto do lobby da FPA, que atuava nos bastidores com a expectativa que o Congresso votasse um projeto de lei instituindo o marco temporal antes das eleições. O projeto não foi votado, diante da vitória de Lula, e o julgamento no STF deve ser retomado em 07 de junho.

Entre as associações que organizam a Agrishow, a postura nas eleições variou entre a neutralidade —Abag e Abimaq — e o apoio explícito à reeleição de Bolsonaro, como declarado pela Faesp e SRB.

PATROCINADORES DA AGRISHOW FINANCIAM INSTITUTO PENSAR AGRO

A 28ª edição da Agrishow conta com patrocínio direto do governo federal e do Banco do Brasil. Além do financiamento público, oito empresas privadas compraram cotas de publicidade na feira agropecuária: os bancos Bradesco e Santander, a petroquímica Braskem, as cooperativas de crédito Sicredi, Sicoob e Cresol, o fundo Genial Investimentos e o grupo de tecnologia Solinftec. A Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) também apoia financeiramente o evento.

Destas, cinco são financiadoras do Instituto Pensar Agro. O banco espanhol Santander pertence a duas associações que contribuem mensalmente para a manutenção das atividades parlamentares da bancada ruralista: a Abag e a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg). A primeira tem também em suas fileiras o Banco do Brasil, a Sicredi e a OCB.

A FenSeg conta, entre seus associados, com o Bradesco Seguros, parte do grupo financeiro fundado por Amador Aguiar, cujos herdeiros são donos de fazendas sobrepostas a terras indígenas no Paraná, conforme revelado no relatório “Os Invasores: quem são os empresários brasileiros e estrangeiros com mais sobreposições em terras indígenas”, publicado no dia 19 pelo De Olho nos Ruralistas.

Além de participarem de associações patronais, Sicredi e OCB são membros votantes no IPA. A organização de cooperativas possui um assento na diretoria do think tank ruralista, sendo representada por sua superintendente Tânia Regina Zanella. No Congresso, a OCB é representada diretamente pelo deputado Sergio Souza (MDB-PR), ex-presidente da FPA e diretamente ligado às cooperativas paranaenses que comandam a associação.

Foto principal (Reprodução): Bolsonaro em visita à Agrishow 2022, acompanhado de Ricardo Salles e Tarcísio Freitas

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