Comissão Pastoral da Terra: 48 anos de luta e esperança com o povo da terra, das águas e das florestas

por Carlos Henrique Silva, em CPT

O campo brasileiro é um cenário extenso de belezas, de produção de alimentos e bens naturais e culturais, mas também de muita disputa. Uma disputa que muitas vezes gera violências, martírios e vítimas, na natureza e nos seres humanos que dela são parte. Vítimas que tombam, mas viram sementes e reforçam a luta de quem fica, por um lugar melhor, por uma terra sem males.

Era numa realidade já difícil nos anos 1970, principalmente diante do contexto de ditadura militar, que surgiu a Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 22 de junho de 1975. A instituição nasceu durante o Encontro de Bispos e Prelados da Amazônia, convocado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em Goiânia (GO).

A demanda vinha dos chamados posseiros da Amazônia, trabalhadores e famílias vindas do Nordeste para trabalhar nos projetos desenvolvimentistas da região, e que sofriam com as péssimas condições de trabalho análogo à escravidão, ou eram expulsas de suas terras por conta da grilagem. Povos indígenas e camponeses locais também sofriam com o avanço da criação do gado e do desmatamento, e a denúncia dessas violações era reprimida pelo Estado.

Todo esse clamor atraiu a atenção de religiosos tanto católicos quanto de outras igrejas cristãs, que acompanharam e escolheram ficar do lado do povo, na luta pelos direitos dessas populações mais vulneráveis. Dentre essas lideranças, bispos como Dom Pedro Casaldáliga e Dom Tomás Balduino, além de freiras, padres e leigos dedicaram suas vidas, algumas vezes até perdendo-as de forma violenta, em troca de partilha, fraternidade e comunhão. Ao longo do tempo, o foco principal da CPT continuou sendo o de defender as causas de trabalhadores e trabalhadoras do campo, e de ser um suporte para a sua organização.

O agricultor Célio Carmo Ferreira, do Assentamento Dom Tomas Balduino, no município de Goiás (GO), relembra esta caminhada. “A CPT sempre esteve presente nos nossos momentos bons e também nos difíceis, de perseguição e ameaças de morte. Mas como diz o ditado, ‘ninguém sabe o que o calado quer’, então nunca nos calamos pra lutar pela terra e por nossos direitos no coletivo. Hoje a gente tem grupos de mulheres formados, fortalecimento da comercialização na feira e muitas outras conquistas além da terra”, afirma Célio.

Outras causas, como a dos povos indígenas, famílias atingidas pelas hidrelétricas e sem terra, estimularam a criação de movimentos como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), dentre outros.

Centro de Documentação

Para reforçar a luta pelos direitos, a CPT criou o Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, que este ano completa 40 anos de atuação. O CEDOC, como também é conhecido, registra constantemente os conflitos e a violência no campo, suas causas e as populações atingidas, a partir de informações coletadas nas bases regionais da instituição e outras fontes. Os dados são publicados anualmente no relatório Conflitos no Campo Brasil, que serve como instrumento de análise e reivindicação por justiça e pelo fim da impunidade no campo.

Desafios no rumo dos 50 anos

Caminhando rumo ao seu meio século de existência, a CPT se vê diante de desafios que se renovam a partir das mudanças sociais, políticas e culturais do país e do mundo. De acordo com Isolete Wichinieski, que integra a Coordenação Nacional da CPT, o que permanece é o compromisso da organização em ser instrumento de luta junto aos povos, tanto de denúncia de injustiças quanto de anúncio do Evangelho.

“Ao longo da caminhada, fomos agregando diversas pautas, seja na denúncia da destruição de nascentes, da contaminação pelos agrotóxicos, dos danos causados pelas mineradoras e dos incêndios criminosos provocados pelo agronegócio. Outras articulações foram surgindo, em defesa do Cerrado e da Amazônia, pelo protagonismo das mulheres, da juventude camponesa, pelo respeito às diversidades. Em tudo isso, a CPT reafirma que, mesmo não sendo um movimento social, caminha junto com os movimentos e mantém seu caráter pastoral no protagonismo das comunidades.”

Momento de memória dos mártires na luta pela terra – 17a. Romaria da Terra e das Águas 2023 em Catalão (GO) – Foto: Júlia Barbosa / CPT Nacional

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