Educação antirracista: 20 livros infantis com atividades pedagógicas

Com o apoio das especialistas em literatura infantil Juliana Pádua e Lígia Silva, a curadoria está dividida em 10 grandes temas, com obras acompanhadas de sugestões para a sala de aula

por Ana Luísa D’Maschio, em Porvir

“De que cor é a cor da literatura brasileira para a infância?” A pergunta da professora Eliane Debus, da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), reflete a preocupação com a educação antirracista. A lei 10.639, de 2003, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nos currículos escolares e instituiu 20 de novembro como Dia da Consciência Negra, abriu espaço para publicações infantojuvenis que abordem as relações étnico-raciais fossem introduzidas de forma mais sistemática nos currículos escolares.

“A representação de personagens negras, para além da identificação e colaboração da autoestima da criança negra, deve contribuir para que possamos ver o outro, e não o mesmo de sempre, para que a criança não negra também (re)conheça a cultura africana e afro-brasileira e o seu papel na formação da sociedade brasileira”, escreveu Eliane ao blog do projeto Quindim.

Para ampliar a discussão e o repertório leitor dos educadores e dos estudantes em relação à educação antirracista, o Porvir conversou com as especialistas em literatura infantil Juliana Pádua S. Medeiros e Lígia Silva. Elas selecionaram 20 livros, de autores nacionais e estrangeiros, que apoiam o debate sobre a representatividade negra e a quebra de estereótipos na perspectiva da luta contra o racismo. Dividida em 10 grandes temas, a coletânea é acompanhada de sugestões de atividades práticas para serem aplicadas em sala de aula.

“As obras literárias fomentam os processos de humanização, e, nesta perspectiva, oferecer livros de qualidade, que valorizam identidades negras e dos povos originários, é uma forma de promover a sensibilidade para os modos plurais de ser, pensar e se expressar”, afirma Juliana. Confira a seleção:

1. Reconhecimento identitário a partir de elementos da cultura negra

Sobre os livros “De passinho em passinho, um livro para dançar e sonhar” e “Fevereiro”: Ao explorarem as mais diversas manifestações culturais de origem africana, as obras selecionadas celebram sons, ritmos, batuques e gingados, despertando uma memória corporal, que convida para o reconhecimento identitário.

Sugestão de atividade: Estudantes podem construir instrumentos musicais de matriz africana (berimbau, reco-reco, chocalho, agogô, etc.) e criar performances corporais, experimentando outras linguagens que não apenas palavra e imagem. Uma dica é utilizar essas produções na (re)leitura das obras, incorporando outras camadas de expressão.


Mais indicações para abordar a temática: 
Benedito, de Josias Marinho (Editora Caramelo); Koumba e o tambor de Diambê, de Madu Costa e Rubem Filho (Mazza Edições); O menino coração de tambor, de Nilma Lino Gomes e Mauricio Negro (Panda Books); De arco e flecha ao berimbau, de Rui Rosa e Camilo Martins (Pallas).

2. Ocupação do cenário artístico-cultural

Sobre os livros “A vida não me assusta” e “Amores de Artistas”: Enquanto obras literárias que vêm fortalecer as identidades negras, estes livros apresentam experiências reais e concretas de pessoas consideradas símbolos de lutas antirracistas e resistências no universo artístico-cultural, com destaque para literatura, grafite, pintura, música, circo, dança, contação de histórias, entre outras expressões.

Sugestão de atividade: Promover uma roda de conversa sobre as trajetórias das personalidades mencionadas e criar um álbum de figurinhas com outros artistas relevantes. Para tanto, a turma pode fazer levantamentos biográficos e iconográficos.

Mais indicações para abordar a temática: Meu nome é Raquel Trindade, mas pode me chamar de Rainha Kambinda, de Sonia Rosa e Bárbara Quintino (Pequena Zahar); Menino Benjamim, de Otávio Júnior e Isabela Santos (Yelowfante); Nina, uma história de Nina Simone, de Traci N. Todd e Christian Robinson (Pequena Zahar); Carolina Maria de Jesus, de Adriana de Almeida Navarro e Bill Borges (Ciranda Cultural).

3. Memórias afetivas

Sobre os livros “Os dengos na moringa de voinha” e “Doçura”: Por meio dos diálogos entre palavras e imagens, estes livros apresentam vínculos afetivos carregados de respeito, amorosidade, empatia, cumplicidade, entre outras bonitezas da vida, que fortalecem e constroem memórias, acolhendo os leitores em uma espécie de abraço reconfortante.

Sugestão de atividade: Uma vez que as obras escolhidas retratam situações de resgate e de construção de memórias afetivas, incentive os leitores a criar diários nos quais registram suas próprias lembranças, utilizando diferentes linguagens para se expressar.

Mais indicações para abordar a temática: Tanto, tanto!, de Trish Cooke e Helen Oxenbury (Ática), Um dia feliz, de Patricia Santana e Carol Fernandes (Aletria); O guardador de memórias, de Denise Guilherme e Rebeca Luciani (Moderna).

 4. Escrevivência 

Sobre os livros “Letras de Carvão” e “SonaDos griots (guardiões das histórias orais) aos que escrevem e reescrever a própria história pelos mais diversos meios, a partilha de vivências individuais dialoga com experiências coletivas, possibilitando fortalecer vozes e memórias negras tantas vezes silenciadas, como se observa nos livros indicados. O termo “escrevivência”, criado pela escritora Conceição Evaristo, traz a junção das palavras “escrever e vivência”, a fim de nomear uma escrita que se mescla com a sua vivência, com o relato das suas memórias e das de seu povo.

Sugestão de atividade: Com base na ideia de partilhar histórias, os leitores podem retirar palavras de uma caixa, tais como resistência, confiança, respeito, justiça, entre outras, e elaborar narrativas antirracistas.

Mais indicações para abordar a temática: Os tesouros de Monifa, de Sonia Rosa e Rosinha (Brinque-Book); A carta de Moussa, de Roser Rimbau e Rocío Araya (Brinque-Book), Caderno de rima de João, de Lázaro Ramos e Maurício Negro (Pallas), Quando a escrava Esperança Garcia escreveu uma carta, de Sonia Rosa e Luciana Justiniani Hees (Pallas).

5. Histórias de coragem e de luta contra o racismo estrutural

Sobre os livros “Sulwe” e “Mãe Sereia”: Cada vez mais é necessário o exercício de (re)conhecer e/ou de (re)lembrar histórias de resistência para compreender a luta contra qualquer forma de desigualdade étnico-racial. Os livros indicados, por meio da valorização de uma memória ancestral, problematizam a discriminação, o preconceito, a segregação e demais comportamentos racistas, fortalecendo as identidades negras e suas narrativas de coragem.

Sugestão de atividade: O mito da democracia racial precisa estar frequentemente no centro das conversas. Com o intuito de provocar discussões sobre o assunto, os leitores podem brincar de Aquário, estratégia de facilitação que valoriza os lugares de fala e de escuta. Funciona assim:

  • Faça uma grande roda com as cadeiras. Ao centro, em um círculo menor, coloque outras quatro.
  • Explique aos leitores que o poder da fala está com quem está dentro do aquário (roda menor). Já o dom da escuta fica com aqueles que estão sentados fora do aquário (roda maior).
  • Inicie a conversa com uma questão-problema, como, por exemplo: “Existe igualdade racial?”
  • Ressalte que para expor o ponto de vista – seja acerca das obras lidas ou de fatos reais – é preciso sentar no centro da grande roda, em umas das três cadeiras, pois quem está de fora do aquário não pode comentar nada. Os leitores que desejam compartilhar uma opinião ocupam, no máximo, três das quatro cadeiras, ficando uma sempre vazia.
  • Oriente que a quarta cadeira poderá ser ocupada a qualquer momento, mas há uma condição: quando alguém sentar nela, quem estiver falando é interrompido e precisa voltar para a grande roda, deixando um lugar vazio. Os demais continuam o debate normalmente.
  • Pontue que a o leitor pode voltar para discussão quando desejar, mas, se já houver três debatedores na pequena roda, quem estiver falando, no momento, deixa o aquário. Isso dá ritmo à conversa e estimula a síntese de pensamento, além de minimizar o risco de monopólio do direito à fala.

Mais indicações para abordar a temática: O ônibus de Rosa, de Fabrizio Silei e Maurizio Quarello (SM); Ei, você!: Um livro sobre crescer com orgulho de ser negro, de Dapo Adeola e Stefano Volp (Companhia das Letrinhas); Histórias da preta, de Heloísa Pires Lima e Laurabeatriz (Companhia das Letrinhas); A neta de Anita, de Anderson de Oliveira e Alexandre Rampazo (Mazza Edições).

6. Representatividade negra

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