Povo Xavante denuncia novo ataque de fazendeiros e cobra demarcação na TI Areões 3

Um ancião foi conduzido ilegalmente à delegacia por policiais enquanto pescava, na aldeia Serra Nova (MT); os indígenas temem o acirramento dos conflitos enquanto aguardam a demarcação

POR MARCOS WILLIAN, DO CIMI*

Um ancião do povo Xavante foi surpreendido por fazendeiros e conduzido à delegacia enquanto pescava em área contígua à aldeia Serra Nova, na Terra Indígena (TI) Areões 3, no município de Água Boa, Mato Grosso (MT). O ataque ocorreu na terça-feira (16), como relatado em carta produzida pelas lideranças.

Segundo os indígenas, a comunidade estava se preparando para a Tora de Buriti quando o ancião foi surpreendido por policiais que, seguindo a ordem de um fazendeiro da região, que acusou-o de ter matado um gado da fazenda, e foi levado sob custódia sem mandado judicial. O indígena permaneceu por oito horas na delegacia sem poder se alimentar e beber água, sendo liberado apenas no final da tarde, quando pôde retornar a aldeia.

Após o ocorrido, as lideranças indígenas realizaram uma reunião para denunciar o caso às autoridades. Para isso, reivindicaram a presença da Funai no território, no entanto nenhum representante compareceu. Com isso, o povo Xavante teme novos ataques, tendo em vista a ausência do Governo na defesa dos direitos constitucionais.

“O indígena permaneceu por oito horas na delegacia sem poder se alimentar e beber água, sendo liberado apenas no final da tarde, quando pôde retornar a aldeia”

A TI Areões 3 está localizada em um território ancestral de suma importância para o povo, porém há décadas vem sofrendo com invasões e ameaças dos fazendeiros, que tentam de todo modo ocupar a área e expulsar os indígenas da região.

Na carta, o povo Xavante cobra da Funai e do estado brasileiro a presença na TI, para que seu direito ao território tradicional seja garantido. Em um trecho, relatam a falta de celeridade no processo demarcatório.

“Os estudos [para concluir a demarcação da TI] transcorrem muito lentamente e não temos notícia da instalação de Grupo de Trabalho, ou do processo demarcatório; sem isso continuamos sendo ameaçados, hostilizados, humilhados em nosso território pelos que vieram para tomar a nossa terra”. A região, que há anos vem sendo palco de conflitos, necessita de atuação do governo, mesmo com a demarcação homologada desde 1996.

Conforme os relatos de lideranças da região, as tentativas de invasão são recorrentes. “Sempre passamos pela aldeia e sofremos ameaças dos fazendeiros, que invadiram e instalaram uma fazenda no local e ocuparam o território sem consulta aos indígenas”.

“Sempre passamos pela aldeia e sofremos ameaças dos fazendeiros, que invadiram e instalaram uma fazenda no local e ocuparam o território sem consulta”

O Mato Grosso tem sido palco de conflitos frequentes desde o século passado. Com a expansão do agronegócio e da presença de latifundiários, que utilizam de diferentes meios para expulsar os indígenas, os territórios ancestrais vêm sendo alvos de invasões praticamente diárias. Apenas no ano passado, ocorreram 117 casos de violação contra o patrimônio, segundo relatório “Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2022”, publicação anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Confira a carta de denúncia na íntegra:

Denúncia da Terra Indígena Areões (Povo Xavante)

Nós, lideranças da Terra Indígena Areões, informamos que no dia 16 de janeiro de 2024, por estar pescando em nosso território tradicional, em área contígua à terra demarcada, um ancião da aldeia Serra Nova foi preso por um fazendeiro e levado à delegacia do município de Água Boa/MT. A Terra em questão vinha sendo repetidamente ocupada por grileiros há anos, os xavante os expulsaram muitas vezes. Esta história de ocupação de nossas terras se desenrola há muitas décadas, mas nos anos recentes estes grileiros obtiveram a titulação da terra. No interior da área reivindicada como “fazenda” há o marco legal do SPI, indicando que se trata de terra do povo Xavante.

O processo de demarcação de nossas terras vem sendo negligenciado pelo Estado brasileiro. Os Estudos transcorrem muito lentamente e não temos notícia da instalação de Grupo de Trabalho, ou do processo demarcatório; sem isso continuamos sendo ameaçados, hostilizados, humilhados em nosso território pelos que vieram para tomar a nossa terra. O conflito agora pode se acirrar e a responsabilidade é da morosidade do Estado brasileiro em reconhecer nosso direito a nosso território ancestral.

Pedimos a presença da presidenta da FUNAI em nosso território, e que o processo de demarcação de nossa terra seja acelerado, para que não passemos por estas situações de risco e ameaça a nossos direitos e modo de vida. A TI Areões 2 está sem identificação desde o ano de 2000. A demora na demarcação da Terra Indígena é a responsável por mais este conflito e outros que possam vir. Demandamos a presença da FUNAI no território no sábado dia 20/1/24, para evitar o crescimento desse conflito.

*Estagiário sob supervisão de Tiago Miotto, da Assessoria de Comunicação do Cimi

*Estagiário sob supervisão de Tiago Miotto, da Assessoria de Comunicação do Cimi

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